Marcos Magalhães*
Energia renovável já foi conversa de gente alternativa. A elevação da temperatura média do planeta, a instabilidade política de regiões produtoras de gás e petróleo e o desejo de países importantes de reduzir a sua dependência em relação aos combustíveis fósseis têm encorajado cada vez mais gente em todo o mundo a pesquisar novas formas de movimentar a economia. O tema que era quase exclusivo dos verdes agora começa a ganhar espaço na economia e na política mundiais.
Dois fatos importantes dos últimos dias mostram a importância crescente das novas fontes de energia. Nos Estados Unidos, o presidente eleito, Barack Obama, disse que a energia renovável será responsável por boa parte dos 2,5 milhões de empregos que ele pretende gerar em seu país, para combater os efeitos da crise econômica. Em São Paulo, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva participou de um mega-evento destinado a debater a viabilidade dos biocombustíveis, com a presença de participantes de mais de 40 países.
Energia e política externa deverão ser, aliás, as áreas onde mais haverá mudanças nos Estados Unidos, entre as presidências de George Bush e Obama. Bush sempre foi ligado à indústria do petróleo e avesso a medidas que alterassem o perfil energético de seu país, inclusive para reduzir as emissões de gases que provocam o efeito estufa. O presidente eleito parece mais disposto a buscar alternativas, por razões tanto econômicas quanto ambientais e geopolíticas.
O lobby brasileiro em favor dos biocombustíveis buscou, com o evento de São Paulo, demonstrar a sustentabilidade ambiental e social do etanol e estimular a sua produção em vários outros países, especialmente na África e na América Latina. Produtores nacionais procuraram mostrar que as plantações de cana-de-açúcar estão bem distantes da Amazônia e que a emissão de gás carbônico por automóveis movidos a álcool – computado aí o ciclo completo de produção – seria 89% menor do que a emissão de um carro movido a gasolina.
Ao ressaltar as vantagens ambientais do etanol e demonstrar que a produção de álcool a partir de cana não compete com a produção de alimentos no país, o Brasil procura dobrar a resistência oferecida principalmente por europeus aos biocombustíveis. E, ao atrair a atenção de países africanos e latino-americanos, o governo brasileiro pretende espalhar pelo mundo a produção dos biocombustíveis, criando assim um mercado global para o produto.
Brasileiros e norte-americanos sabem que esse mercado tende a crescer, apesar da redução recente dos preços do petróleo. Especialmente porque já existem estudos avançados, no Brasil e nos Estados Unidos, para a chamada segunda geração do etanol, que será baseada na celulose. Em outras palavras, serão ampliadas as possibilidades de produção de energia a partir de matérias-primas como bagaço de cana, capim, cascas de árvores e palha. Os Estados Unidos saíram na frente nessa pesquisa. No Brasil, existe potencial para se dobrar a produção de etanol sem aumento da área cultivada.
A busca por energia alternativa não se resume, naturalmente, aos biocombustíveis. Países de maior tradição no setor, como a Dinamarca, já espalham fazendas de moinhos de vento ao longo da sua costa, como mostrou recentemente o programa Cidades e Soluções, da Globonews. Japão e Alemanha, por outro lado, estão bastante avançados na pesquisa de energia solar. A liderança tecnológica conquistada por esses países levará à conquista de importantes fatias do mercado de produção de energia, ao longo dos próximos anos.
Obama sabe disso. E parece ser o primeiro presidente disposto a reduzir o gap entre os Estados Unidos e os países mais avançados em energias alternativas. A ampliação das pesquisas no setor deverá garantir a ele uma boa vitrine mundial, já em seu primeiro mandato. No Brasil, Lula já está no meio de seu segundo mandato. Mas o país poderá contar, dentro de seis anos, com outra boa vitrine: a realização da Copa do Mundo de 2014. O Brasil estará no centro das atenções da imprensa internacional e poderá divulgar ao mundo uma nova postura social e ambiental.
O transporte público será uma das principais formas de divulgar a opção do país por novas formas de energia. Ônibus movidos a etanol e a biodiesel poderão circular pelas cidades onde se realizarem os jogos da Copa, demonstrando a sua viabilidade. Outros exemplos de tecnologia nacional em transporte limpo poderão ainda ser testados em 2014. Em Porto Alegre, por exemplo, já existem estudos para a conexão do aeroporto à linha de metrô da cidade por meio do aeromóvel, meio de transporte automatizado que circula em via elevada.
No Rio de Janeiro, uma proposta ainda mais ousada começa a tomar forma: a implantação de uma linha de trens magnéticos entre os aeroportos do Galeão e Santos Dumont, passando pela cidade universitária. A primeira parte da linha seria implantada na própria universidade e depois, segundo o projeto, seria ampliada dos dois lados, para interligar os aeroportos.
A tecnologia já foi desenvolvida pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, mas o projeto ainda vai passar por uma fase de testes e de busca de financiamento. Boa parte da energia a ser consumida pelos trens magnéticos, segundo pesquisadores da UFRJ, poderia ser obtida por meio de painéis solares espalhados pela superfície da linha. Talvez não haja tempo para que funcione até a Copa do Mundo. Mas, se pelo menos parte da linha for construída até lá, esta poderá ser – ao lado dos ônibus movidos a biocombustíveis e do aeromóvel gaúcho – mais uma boa vitrine brasileira em 2014.
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