Otoniel Ajala Dourado*
No Ceará, para quem não sabe, houve também um crime idêntico ao do Araguaia, contudo em piores proporções. Foi o massacre praticado por forças do Exército e da Polícia Militar do Ceará, no ano de 1937, contra a comunidade de camponeses católicos do Sítio da Santa Cruz do Deserto ou Sítio Caldeirão, que tinha como líder religioso o beato José Lourenço, seguidor do padre Cícero Romão Batista.
A ação criminosa deu-se inicialmente através de bombardeio aéreo, e depois, no solo. Os militares usando armas diversas, como fuzis, revólveres, pistolas, facas e facões, assassinaram mulheres, crianças, adolescentes, idosos, doentes e todo o ser vivo que estivesse ao alcance de suas armas, agindo como feras enlouquecidas, como se ao mesmo tempo fossem juízes e algozes.
Como o crime praticado pelo Exército e pela Polícia Militar do Ceará foi de lesa humanidade/genocídio/crime contra a humanidade é considerado imprescritível pela legislação brasileira bem como pelos Acordos e Convenções internacionais, e por isso a SOS-Direitos Humanos, ONG com sede em Fortaleza, ajuizou no ano de 2008 uma ação civil pública na Justiça federal contra a União e o Estado do Ceará, requerendo que sejam obrigados a informar a localização exata da cova coletiva onde esconderam os corpos dos camponeses católicos assassinados na ação militar de 1937.
Vale lembrar que a Universidade Regional do Cariri (Urca) poderia utilizar sua tecnologia avançada e pessoal qualificado, para, através da Pró-Reitoria de Pós Graduação e Pesquisa (PRPGP), do Grupo de Pesquisa Chapada do Araripe (GPCA) e do Laboratório de Pesquisa Paleontológica (LPPU) encontrar a cova coletiva, uma vez que pelas informações populares, ela estaria situada em algum lugar da mata dos cavalos, em cima da Serra do Araripe.
Frisa-se também que a Universidade Federal do Ceará (UFC), no início de 2009, enviou pessoal para auxiliar nas buscas dos restos dos corpos dos guerrilheiros mortos no Araguaia, esquecendo-se de procurar na Chapada do Araripe, interior do Ceará, uma cova com mil camponeses.
Então por que razão as autoridades não procuram a cova coletiva das vítimas do Sítio Caldeirão? Seria descaso ou discriminação por serem “meros nordestinos católicos”?
Diante disto aproveitamos a oportunidade para pedir o apoio nesta luta, a todos os cidadãos de bem, no sentido de divulgar o crime permanente praticado contra os habitantes do Sítio Caldeirão, bem como o direito das vítimas serem encontradas e enterradas com dignidade, para que não fiquem para sempre esquecidas em alguma cova coletiva na Chapada do Araripe.
*Otoniel Ajala Dourado é advogado e presidente da SOS-Direitos Humanos, de Fortaleza.