Lizete Sebben*
A composição do Tribunal Superior Eleitoral, órgão máximo da Justiça Eleitoral, prevista na Constituição Federal, é de ministros do Supremo Tribunal Federal, do Superior Tribunal de Justiça e de juristas, indicados pelo Supremo Tribunal Federal e nomeados pelo Presidente da República.
Por disposição constitucional, os magistrados brasileiros, e, por evidente, os desembargadores e ministros dos Tribunais Superiores, têm vedações no que concerne ao exercício de outro cargo ou função, exceto uma de magistério; de receber, a qualquer título, custas ou participação em processo, auxílios ou contribuições, ressalvadas as exceções previstas em lei; de se dedicar à atividade político-partidária e, ainda, de exercer a advocacia em juízo ou tribunal do qual se afastou, antes de decorridos três anos do afastamento do cargo.
Relativamente aos juristas, a Lei 4.737/65, em seu parágrafo 2º do artigo 16, introduzido pela Lei 7.191/84, veda a nomeação de cidadão que ocupe cargo público de que seja demissível ad nutum; que seja diretor, proprietário ou sócio de empresa beneficiada com subvenção, privilégio, isenção ou favor em virtude de contrato com a administração pública, ou que exerça mandato de caráter político, federal, estadual ou municipal.
Os Tribunais Regionais Eleitorais, igualmente órgãos do Poder Judiciário (CF, art. 92, V), são constituídos de desembargadores do Tribunal de Justiça Estadual, juizes de direito escolhidos pelo respectivo Tribunal de Justiça, juiz do Tribunal Regional Federal com sede na capital do estado ou no Distrito Federal ou, não havendo, juiz federal, escolhido pelo Tribunal Regional Federal respectivo e de advogados indicados pelo Tribunal de Justiça e nomeados pelo Presidente da República.
Idêntica incompatibilidade daquela prevista aos componentes do Tribunal Superior foi estendida aos juristas que compõem a corte estadual, conforme prevê o artigo 25, § 7º do Código Eleitoral.
Sob a ótica eleitoral, evidencia-se que tais vedações, constitucionais e legais, têm como objetivo, como não poderia deixar de ser, a necessária imparcialidade, isenção e inexistência de qualquer interesse político, inclusive político-partidário, por parte das autoridades judiciárias eleitorais na solução do conflito submetido à apreciação dessa justiça especializada.
De sua vez, por delegação constitucional (art. 121), o Código Eleitoral (Lei 4.737/65, art. 23, inciso XII) estabeleceu que compete, privativamente, ao Tribunal Superior Eleitoral responder consultas, sobre matéria eleitoral, feitas em tese por autoridade com jurisdição federal ou órgão nacional de partido político. As cortes estaduais tem competência para idênticas consultas, desta feita apresentadas por autoridade pública ou partido político (art. 30, VIII).
O novo Código Eleitoral, que visa sistematizar as leis eleitorais, atualmente esparsas, em fase de análise e elaboração do anteprojeto pela Comissão de Juristas nomeada, com audiências públicas promovidas pelo Senado Federal, prevê alteração também no tópico das consultas eleitorais.
O tema analisado sob a rubrica de Administração e Organização das Eleições, tendo como sub-relator o dr. Carlos Eduardo Caputo Bastos, foi primeiramente sugerido como de restrição ou extinção do processo administrativo da consulta em tese. Natureza da resposta – vinculante ou não. Exclusividade do processo perante o Tribunal Superior Eleitoral.
A proposição apresentada pelo sub-relator é de que, ausente o efeito vinculante, não há justificativa para que essa competência seja concedida à Justiça Eleitoral, sugerindo que a tarefa seja atribuída ao Poder Legislativo, órgão natural e apropriado para realizar a interpretação autêntica da norma, e, ainda, a quem cabe com exclusividade legislar sobre Direito Eleitoral.
O sub-relator, após algumas sugestões, com muita propriedade, atitude que deve ser enaltecida por sua cautela, importância e consequências, sugeriu manter a proposição para o debate com a sociedade.
Assim, é importante a realização da mais ampla discussão, por meio de incansáveis questionamentos, em audiências públicas, simpósios ou encontros jurídicos, com a presença de representantes da sociedade e operadores do direito, onde se poderá, com clareza, explicitar e visualizar os reflexos da abstração da análise das consultas pelo Poder Judiciário Eleitoral, composto, como dito, na forma da Lei, por membros isentos, imparciais e sem qualquer interesse político, com transferência de competência para o Poder Legislativo.
Nesse particular, não é demasia referir a célebre tripartição dos poderes, onde, com prioridade, cabe ao Legislativo elaborar as leis, ao Executivo o cumprimento dessas e, ao Judiciário, a tarefa de interpretá-las, dizendo o direito a ser aplicado. Transferindo-se, como sugerido, essa tarefa explicitatória das normas eleitorais ao Poder Legislativo, o mesmo órgão criador fará a sua interpretação, ente esse constituído de diversos agentes públicos – representantes da sociedade e de diferentes partidos políticos, nem sempre coincidentes com àqueles presentes quando da criação da Lei. À evidência, o tema merece muita, muita reflexão!!
*Advogada e ex-Juiza do TRE/RS
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