Como no volume 1, cujo argumento central dá relevância às atitudes latinoamericanas – Latitudes – que lideram mundialmente a resistência política ao neoliberalismo globalizado a partir do início do século XXI – prossigo citando o texto do Emir Sader¹: “Na década de 60, quando o longo ciclo expansivo se esgotou e se chocou com os direitos conquistados em toda a América Latina, as ditaduras militares substituíram as democracias liberais existentes. Dois processos combinados produziram a mais radical e concentrada transformação regressiva das correlações de força entre as classes: as ditaduras militares e a implantação dos modelos neoliberais – ambos estreitamente vinculados entre si. Até porque sem quebrar a capacidade de defesa dos interesses do movimento popular, de forma repressiva, seria impensável a implantação dos sinistros processos de privatização – com a transferência brutal de renda e de patrimônio público correspondente – sendo o Chile, o Uruguai e a Argentina os exemplos mais extremos”.
Esses três países tinham os mais avançados sistemas de proteção social, estados com capacidade reguladora, processos de expansão do mercado interno, de fomento ao desenvolvimento econômico, de garantias dos direitos sociais. A mais brutal repressão de suas histórias abriu campo para os modelos neoliberais – implantados pelos garotos de Chicago – os quais produziram modalidades de Estados mínimos, privatizando praticamente todo o patrimônio público, no caso argentino, e abolindo direitos sociais conquistados ao longo de muitas décadas de luta. Três dos mais avançados Estados do continente foram desarticulados, “quebrados” – literalmente.
Para um detalhamento preciso das “desarticulações” ocorridas no Cone Sul, com nomes, datas, estatísticas, relações de causa e efeito, a inequívoca vinculação entre prisões e tortura de cidadãos e a implantação de choques econômicos, cujos pacotes incluíam desregulação dos mercados, arrocho salarial, corte de gastos sociais, privatização do patrimônio público e reservas naturais , abolição de direitos trabalhistas; a fortíssima intervenção norte-americana através de suas agências, corporações multinacionais, programas de ajuda militar e estratégico-ideológica no continente, bem como suas alianças com as elites locais, ver
Para manter o espólio de populações inteiras durante gerações são necessários níveis quase absolutos de violência física e psicológica. E, sem hesitação, eles foram aplicados
No entanto, o modelo neoliberal, por suas próprias peculiaridades canalhas – que outro nome atribuir a tal modelo? – não cria, por motivos óbvios, bases sociais de sua reprodução e legitimação. A desregulação, que destrava todos os obstáculos à livre circulação do capital, levou – como hoje se sabe claramente – à canalização de imensos recursos, não para o setor produtivo, mas para o financeiro, onde o capital obtém lucros mais elevados, maior liquidez sem pagar impostos. Unido à abertura acelerada das economias, produziu não só um intenso processo de concentração de renda, de exclusão de direitos formais dos trabalhadores e de desemprego, como também de desindustrialização das economias do continente. Passado o efeito – a um custo altíssimo – do controle inflacionário, aliás, criminosamente imposto pelos próprios norte-americanos via FMI, os governos neoliberais também fraturaram radicalmente as classes médias – cooptando um setor específico para os processos de modernização da economia – mas empurraram para o empobrecimento o contingente majoritário delas e, ao mesmo tempo, neutralizaram relativamente as reações de massa, graças ao desemprego, à fragmentação e à informalização do mundo do trabalho. Dessa forma, o modelo passou rapidamente da euforia à depressão, relegando ao isolamento os governos que o mantiveram.
À guisa de contraprova, as três maior