Sylvio Costa *
Pelas normas regimentais, cada senador dispõe de 20 minutos para fazer um discurso. O ex-presidente e senador recém-empossado Fernando Collor (PTB-AL) tomou a palavra ontem, na tribuna do Senado, às 17h30 e encerrou seu pronunciamento três horas depois. Só foi interrompido para receber as homenagens de outros parlamentares – 15 no total.
Reencontrando-se com o palco principal da política brasileira, após longo período de ostracismo, Collor discursou exatamente 17 anos depois de ter sido empossado presidente e 14 anos, dois meses e 14 dias após ter sido definitivamente afastado do cargo pelo mesmo Senado que ontem lhe ofereceu espaço para dar sua versão dos acontecimentos.
No longo discurso (veja a íntegra), relatou em detalhes sua visão dos fatos que o levaram a permanecer oito anos sem direitos políticos.
Pontos do discurso
Expôs suas dores: “Não é fácil volver os olhos ao passado e reviver, em toda a sua extensão, a tortura, a angústia e o sofrimento de quem, agredido moralmente, acusado sem provas, e insultado e humilhado durante meses a fio, teve que suportar as agruras de acusações infundadas e a condenação antes mesmo de qualquer julgamento”.
Lembrou que foi absolvido pelo Supremo Tribunal Federal, em dezembro de 1994: “Como evidenciam os pronunciamentos dos ilustres magistrados que me julgaram, não há, nos autos, nos documentos e nos depoimentos das testemunhas ouvidas, comprovação de nenhum ato ilícito que eu tenha, em qualquer momento, praticado como presidente da República. Fui afastado na suposição, e tão-somente na suposição, de que as acusações que me fizeram fossem verdadeiras”.
Enumerou erros jurídicos cometidos durante o processo de impeachment. Comparou-se a figuras histórias apeadas do poder no país, como D. Pedro I, D. Pedro II, Getúlio Vargas, Café Filho e João Goulart. E atribuiu seu afastamento do Palácio do Planalto a uma "grande farsa" articulada por adversários "movidos pelo rancor".
Admitiu, no entanto, que contribuiu para o desfecho da crise que o dragou o fato de não ter sido capaz de se relacionar de forma adequada com o Congresso e os políticos. O ex-presidente ressaltou que seu partido à época, o PRN, possuía apenas 8,4% das cadeiras do Congresso. “Dediquei 80% à administração. E o presidente da República é o líder político, tem que fazer política”, disse, durante os apartes.
E se emocionou muito e, em pelo menos um momento, chorou. Quando, apontado como vítima de injustiça pelo senador Joaquim Roriz (PMDB-DF), lembrou do episódio que viveu no dia em que deixou o Palácio da Alvorada, de helicóptero, em setembro de 1992, após a Câmara dar início ao processo de impeachment. Pediu ao piloto que sobrevoasse a cidade-satélite de Santa Maria e ouviu um não como resposta, sob o pretexto de que não havia combustível para isso.
Apartes
O Senado parou para ouvir Collor. Numa cena rara, em um plenário cheio, senadores e assistentes deixaram de lado as tentadoras conversas ao pé do ouvido para escutarem, atentos, o discurso do senador alagoano.
O líder do PSDB, senador Arthur Virgílio (AM), foi o primeiro a apartear e resumiu o tom de vários apartes seguintes: mesmo que as denúncias feitas no passado contra Collor fossem verdadeiras, o ex-presidente já foi mais do que punido por eventuais erros que tenha cometido. “Vossa Excelência pagou um preço muito alto, num país onde quase ninguém paga preço algum”, afirmou Virgílio.
Saíram do senador Mão Santa (PMDB-PI) algumas das palavras de apoio mais entusiástico a Collor, que, para ele, foi "um presidente da República extraordinário". “O Congresso errou”, arrematou Mão Santa, referindo-se ao impeachment de 92.
Encerrado o discurso, o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), saudou: “Só a democracia proporciona o espetáculo exuberante que vivemos aqui. É forçoso reconhecer que Vossa Excelência é hoje maior do que foi um dia”.
Veja outras manifestações feitas durante o pronunciamento do ex-presidente Collor no Senado:
Aloizio Mercadante (PT-SP)
Afirmou que a eleição de Collor representou a vontade do povo das Alagoas e que ele seria tratado como “qualquer outro senador”. No entanto, o petista, que era oposição ao governo Collor à época em que ele estava na Presidência da República, afirmou que as CPIs que ocorreram no governo Collor estavam de acordo com as “graves denúncias” que surgiram.
“Sou militante de um partido que sofreu denúncias graves. Mas esse sentimento de exigir a verdade é uma virtude democrática”, disse Mercadante. “Acho que Vossa Excelência pagou um preço muito alto. Mas como Vossa Excelência tem orgulho do seu mandato, eu também tenho orgulho de ter participado daquela CPI”, afirmou Mercadante. “Eu fiz o que a minha consciência e o meu mandato ordenaram”, finalizou.
Tasso Jereissati (CE), presidente nacional do PSDB
Disse que não era o momento de colocar em julgamento o mérito das questões que levaram à deposição de Collor e que não queria fazer julgamentos. E ressaltou: “Sem dúvida nenhuma, o comportamento da classe política brasileira, das elites brasileiras, mudou radicalmente daquela época para agora”.
Em uma crítica velada ao governo Lula, falou que à época de Collor, alguns artistas que se declararam apoio ao presidente foram “queimados”, ao passo que hoje em dia, em vista às denúncias de corrupção na política, alguns artistas dizem “que é assim mesmo”. “Vossa excelência pagou muito um preço muito caro”, complementou Jereissati.
Destacou, por fim, que, com sua experiência, Collor poderá ser muito útil ao Senado.
Romeu Tuma (PFL-SP)
Lembrou que foi nomeado por Collor secretário da Receita Federal e diretor da Polícia Federal e que pôde testemunhar a “isenção” e “correção” com que o ex-presidente tratou as duas instituições.
Collor se emocionou, retribuindo o elogio. Disse que senador paulista foi um dos mais corretos e fiéis servidores públicos que a Polícia Federal teve. Collor também afirmou que foi “uma honra” ter tido a companhia de Tuma durante os dois anos do exercício da Presidência da República.
Joaquim Roriz (PMDB-DF)
“Vossa Excelência tinha um destino: de ser o primeiro presidente eleito [em eleições diretas] depois do regime militar [1964-1985], e o