Rodolfo Torres
Depois de passar seis meses discutindo a aprovação da proposta de emenda à Constituição (PEC) que prorroga por mais quatro anos a cobrança da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF), a base aliada do governo na Câmara pretende analisar mais uma matéria espinhosa até o final deste ano: a reforma tributária.
Segundo o líder do PMDB na Câmara, Henrique Eduardo Alves (RN), o tema será “o foco principal de debates até o final do ano”. Contudo, essa não será uma reforma fácil, uma vez que não há consenso entre os parlamentares, independentemente de partido, em torno da proposta a ser votada.
O próprio líder do governo na Câmara, José Múcio (PTB-PE), admite que a análise da reforma tributária será mais complicada do que foi a CPMF, aprovada semana passada, em segundo turno, pelos deputados. “Alguns estados que se beneficiam com o atual modelo certamente não vão concordar”, afirmou.
Não é de hoje que a reforma tributária é alvo de discussões acaloradas na Casa. No início do primeiro mandato do presidente Lula, a equipe econômica do governo tentou implementar uma minirreforma tributária que unificaria as alíquotas do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), que hoje ficam a critério de cada estado. No entanto, a proposta esbarrou na resistência dos governadores, que usam as diferenças existentes entre os estados para atrair investimentos privados.
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Para o economista Nilton Marques, professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV), ao acenar novamente com a reforma tributária, o governo federal tenta oferecer uma contrapartida a estados e municípios, uma vez que a proposta da CPMF não prevê repartição de receita.
“Se estados e municípios aceitaram a CPMF, eles têm que ter compensação. É dando que se recebe”, afirmou.
Sem obstáculos
Para o vice-líder do DEM na Câmara José Carlos Aleluia (BA), o governo não encontrará obstáculos, por parte da oposição, para submeter a matéria a votação. Apesar disso, ele considera remotas as chances de a reforma tributária seguir para o plenário ainda este ano. Segundo Aleluia, o assunto entrou em discussão apenas para ajudar na aprovação da CPMF no Senado.
“Reforma tributária não é um assunto de um partido. É assunto para o país. O povo não agüenta mais pagar imposto”, afirmou.
Para o líder do Psol na Câmara, Chico Alencar (RJ), o governo não tem reais intenções de aprovar a reforma tributária, quer apenas apaziguar os ânimos exaltados por causa da prorrogação do chamado imposto do cheque. “A inclusão deste item, que ainda não está maduro e que não é apenas do Congresso, cheira a tabelinha para aprovar a CPMF”.
“Vamos ver quais são as razões dos líderes para colocar a reforma tributária em pauta. O assunto requer uma grande discussão entre União, estados e municípios”, diz Chico.
Chuva de pauta
A reunião convocada para hoje (16) pelo presidente da Câmara, Arlindo Chinaglia (PT-SP), com os líderes partidários definirá qual será a pauta de votações da Casa até o final do ano. No encontro, os líderes apresentarão propostas que consideram prioritárias para o debate legislativo até 31 de dezembro.
Ontem Chinaglia e os líderes partidários definiram cinco itens prioritários para esta semana. São eles: a PEC da Defensoria Pública (487/05); a conclusão da reforma política (PL 1210/07); a regulamentação da Emenda Constitucional 29 (Projeto de Lei Complementar 1/03); a PEC dos Vereadores (333/04), e a regulamentação das centrais sindicais (PLs 386/07, 1990/07 e outros).
Antes de examinar essas proposições, no entanto, o Plenário terá de liberar a pauta, trancada pela Medida Provisória 386/07, que concede aumento de subsídio, entre 21% e 28%, para policiais federais. Com a MP, o governo pretende pagar a segunda parcela do aumento concedido ano passado.
Reforma política
Para os líderes da oposição, entre os itens destacados para a pauta desta semana nenhum é mais urgente do que a reforma política. Em julho deste ano, os deputados tentaram, sem sucesso, aprovar uma série de medidas para iniciar a reforma política. Mas apenas o projeto de lei que tratava da fidelidade partidária foi aprovado.
A proposta que estabelece, entre outras medidas, o voto em lista fechada, o financiamento público de campanha, a cláusula de barreira e a proibição de coligação nas eleições proporcionais (para vereador e deputado) ainda aguarda votação. “Antes de começar matéria nova, tem que terminar matéria velha”, avisa o líder do DEM, Onyx Lorenzoni (RS).
Nepotismo e voto aberto
Chico Alencar destacou três propostas que o Psol apresentará como prioritárias. Para o parlamentar fluminense, a PEC do Voto Aberto, que já foi votada em primeiro turno, e que acaba com o voto secreto em todas as esferas do legislativo, deve ser a bola da vez.
Ele também destaca a necessidade de se analisar a PEC do Nepotismo, que proíbe a nomeação de parentes até do terceiro grau de autoridades da administração pública direta e indireta. Considerada prioritária pelos líderes partidários no ano passado, a proposta ainda não foi sequer votada em primeiro turno.
O terceiro ponto que será apresentado pelo Psol diz respeito à proposta que pune de forma mais rigorosa quem utiliza mão-de-obra escrava. O texto da PEC, aprovado em primeiro turno na Câmara em 2004, prevê que as propriedades rurais e urbanas em que forem localizadas culturas ilegais de plantas psicotrópicas ou a exploração de trabalho escravo serão desapropriadas e destinadas à reforma agrária e a programas de habitação popular, sem indenização ao proprietário, após sentença judicial transitada em julgado.
Para o relator da proposta, o deputado petista Tarcísio Zimmermann (RS), o governo abandonou a defesa da PEC por causa da pressão dos ruralistas que integram a base governista (leia mais). “É evidente que não há mais a prioridade dada pelo governo no primeiro mandato do presidente Lula para erradicar o trabalho escravo”, afirmou.
Pacote da segurança
A PEC do Voto aberto também é prioritária para o líder do DEM. Onyx Lorenzoni também considera urgente a análise das propostas do chamado “pacote de segurança”.
Conforme revelou o Congresso em Foco (leia mais), das 35 medidas apontadas como prioritárias por deputados e senadores após os ataques do Primeiro Comando da Capital (PCC) em São Paulo, em maio de 2006, e o brutal assassinato do garoto João Hélio Fernandes, arrastado em um carro por bandidos em fevereiro deste ano, no Rio, só duas foram transformadas em lei. Uma tornou falta disciplinar grave o uso de telefone celular por presos e a outra endureceu os critérios para a progressão de pena nos crimes hediondos.
Entre os projetos que aguardam votação, está o que tipifica o crime de seqüestro-relâmpago, o que prevê a realização de julgamentos por teleconferência, o que cria o Fundo Nacional de Assistência às Vítimas de Crimes Violentos e o que torna mais rígida a progressão de pena para condenados por crimes hediondos, entre outros. Também esperam o aval de deputados e senadores sete propostas da chamada reforma processual penal, cujo objetivo é simplificar e dar agilidade à Justiça no país.
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