A paralisação dos caminhoneiros que assustou o país pela ameaça de desabastecimento – gerando filas gigantescas por alguns litros de combustível e corrida aos supermercados para garantir estoque de alimentos – deve servir também como oportunidade para uma profunda reflexão a respeito de temas estruturais que continuam no limbo de ações necessárias, mas não concretizadas. Uma delas, e talvez a principal, é a reforma tributária.
O Brasil pratica uma das mais altas taxas de tributação do mundo. De acordo com o Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação (IBPT), o brasileiro arca hoje com 63 tributos entre impostos, taxas e contribuições. O que torna essa situação mais cruel, porém, é que a maior parte recai sobre o consumo – cerca de 65%, segundo dados da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), contra pouco mais de 20% de carga tributária sobre a renda, por exemplo. Muito diferente da média mundial, que é de 35% sobre o consumo.
Tributar mais o consumo do que a renda significa, na prática, que quem ganha menos, paga mais, e quem ganha mais, paga menos. Por isso, estão na direção inversa a maioria dos países desenvolvidos, nos quais a carga pesa mais sobre a renda e o patrimônio – seguramente a melhor maneira de um país se aproximar da chamada “justiça tributária”.
Exemplo disso é o sistema adotado pelos Estados Unidos, onde a renda é tributada em mais de 40%. Lá existe apenas um imposto sobre o consumo, chamado TEX. Ou seja, o consumidor estadunidense sabe exatamente quanto está pagando e o imposto resulta em benefícios para a população.
No Brasil, ao contrário, a política tributária não taxa o cidadão de acordo com sua capacidade de contribuir e com os bens que possui. Trata-se de uma política de arrecadação a qualquer custo, que penaliza o lado mais fraco e menos organizado – o consumidor. O que demonstra um claro distanciamento do Estado com o esperado bem-estar social.
A carga tributária por aqui é equivalente a 35,42% do Produto Interno Bruto (PB). O que significa dizer que, de cada R$ 10 produzidos no país, R$ 3,50 vão para os cofres da União e dos governos estaduais e municipais.
Uma saída para esse massacre diário no bolso do cidadão seria adotar a tributação progressiva, em que a alíquota do imposto aumentaria na proporção em que os valores sobre os quais incide são maiores. Como acontece, por exemplo, na tabela do Imposto de Renda Pessoa Física, com alíquotas variando entre 15% e 27,5%, conforme a renda.
A progressividade poderia também ser aplicada na tributação sobre heranças, o Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD), hoje de 3,86% em média, ou no Imposto sobre Propriedade Territorial Rural (ITR).
Para consolidar uma agenda tributária eficaz, seria fundamental reduzir a alta taxação sobre o sistema produtivo, que além de contribuir para a manutenção da gritante desigualdade social, compromete diretamente a competitividade das empresas brasileiras.
Outra necessidade estrutural do país é o equilíbrio das contas públicas. A dívida pública do governo federal atingiu R$ 3,658 trilhões em abril, uma alta de 0,61% em relação ao mês anterior. Trata-se da dívida contraída pelo Tesouro Nacional para financiar o déficit orçamentário, ou seja, é o que acontece quando o governo gasta mais do que arrecada.
Para que a dívida pública brasileira pare de crescer, o país tem que fazer o chamado superávit primário. Só para 2017, esse esforço fiscal chegou a R$ 320 bilhões – o que equivale a 5% do PIB. Os números deixam claro a enorme dificuldade do governo em controlar as contas públicas.
E a saída, qual é? Encarar as mudanças que precisam ser feitas, como a reforma tributária e o pacto federativo, que estão paradas no Congresso Nacional, à espera da vontade política e da pressão do povo para acontecer.