Marcos Morita*
Tenho acompanhado com curiosidade a entrada de mais uma montadora chinesa, desta vez com algumas diferenças marcantes – a começar pelo estardalhaço. Espaços generosos nas principias mídias, corredores de shoppings centers e locais de grande circulação, além de propagandas em horário nobre. Como estudioso de marketing, tenho pensado de que maneira esta comunicação massiva, assim como a interessante proposição de valor, poderão influenciar os consumidores.
Gostaria de traçar um paralelo com a curva de adoção de tecnologias, a qual classifica os consumidores em cinco grandes grupos: pioneiros, visionários, pragmáticos, conservadores e tradicionais – avaliados conforme seu grau de interesse, aversão ao risco e familiaridade com o tema. Vejamos suas principais diferenças.
Pioneiros: viciados em tecnologia, são capazes de enfrentar horas de fila, só pelo prazer de ter em primeira mão a novidade do momento. Como formadores de opinião, divulgam seus comentários em sites e blogs especializados.
Visionários: apreciam a inovação, avaliando de que maneira determinada tecnologia irão auxiliá-los nas tarefas do dia-a-dia. Convencidos, costumam adotá-la, mesmo que ainda não totalmente testada e comprovada.
Pragmáticos: grupo bastante numeroso em tamanho, preferem soluções e produtos maduros, consagrados e consolidados, não se importando com a questão da exclusividade.
Conservadores: últimos a entrarem no mercado, estudam, analisam, avaliam e muitas vezes relutam em sua adoção. Também avessos ao risco, buscam produtos com ótima relação custo versus benefício.
Tradicionais: são muitas vezes forçados e obrigados a aderirem para não se sentirem excluídos. Caso encontre alguém sem celular ou email, saiba que a este grupo pertence.
Creio que com os veículos chineses esteja ocorrendo processo similar, sobretudo no que tange à aversão ao risco, haja vista o valor intrínseco do bem. Desta maneira, baseei-me em cinco categorias: desconhecimento, desconfiança, avaliação, consumo e recomendação, as quais de algum modo, se interrelacionam com as já apresentadas. Para melhor elucidá-las, trarei exemplos de outras nacionalidades, indústrias e segmentos, atuais e passados.
Desconhecimento: façamos uma volta no túnel do tempo. A posição atual das montadoras chinesas já foi ocupada por coreanos e japoneses, há algumas décadas. Famosas em seus países de origem, porém desconhecidas quando começam a ganhar escala, penetrando outros mercados. A propaganda de massa é uma das maneiras mais rápidas de se apresentarem aos novos consumidores.
Desconfiança: o respeitado Made in Japan já foi sinônimo de produto de má qualidade no pós-guerra. A invasão de quinquilharias eletrônicas de baixo preço e qualidade duvidosa, presentes em ruas de comércio popular e camelôs, denigrem os produtos Made in China, correndo o risco de extrapolar a má fama para outras categorias.
Avaliação: nesta categoria, incluo os veículos coreanos, os quais já deixaram a desconfiança, quando eram sinônimos de cachorro-quente. Não obstante a obsessão por comparativos e testes com marcas tradicionais, o avanço em tecnologia e design é visível. Sua compra pode ainda ser avaliada e contestada por razões como manutenção e revenda.
Consumo: celulares e televisores coreanos, só para citar alguns exemplos, estão hoje na mesma cesta que seus congêneres holandeses, americanos, finlandeses ou japoneses, ao menos no que se refere ao quesito escolha. Com forte apelo em preços, utilizado para conquistar a massa de consumidores conservadores, começam a inovar visando atrair os grupos mais antenados.
Recomendação: apesar dos recentes recalls envolvendo milhões de veículos, é patente a durabilidade dos veículos produzidos no país do sol nascente. Seus proprietários tornam-se em geral fiéis aos modelos e marcas, divulgando e recomendando a familiares, parentes e conhecidos. Consistência, inovação e qualidade são seus pilares.
Olhe ao redor e veja as marcas dos produtos existentes em sua cozinha, escritório e sala. Separe-os pela data de compra, dos mais recentes aos mais antigos. Repita o procedimento em seu círculo de convivência mais próximo: parentes e amigos. Creio que de alguma maneira a teoria se comprovará em maior ou menor grau.
Agora, prever quando os veículos chineses deixarão o horário nobre da telinha para ocupar as garagens é ainda incerto. É bem provável, todavia, que em algum tempo dividam o espaço hoje ocupado por japoneses e coreanos, para os quais até pouco tempo atrás nutríamos os mesmos sentimentos de desconhecimento e desconfiança. É esperar para ver.
*Mestre em Administração de Empresas, professor da Universidade Mackenzie e professor tutor da FGV-RJ. Especialista em estratégias empresariais, é colunista, palestrante e consultor de negócios. Há mais de quinze anos atua como executivo em empresas multinacionais