Heitor Scalambrini Costa *
O Clube de Engenharia de Pernambuco (CE-PE), entidade que completou 94 anos de existência em 1º de junho de 2013, apregoa que um dos seus objetivos é “realizar o estudo de questões técnicas, econômicas e sociais, especialmente, as de interesse público”.
Um dos temas abordados com insistência pelo CE-PE é a questão do desenvolvimento do estado, em suas diversas regiões. À primeira vista, é louvável esta iniciativa. Mas, infelizmente, estas discussões têm se restringido a discussões subalternas a um modelo de sociedade consumista, industrial e capitalista. Nada de novo como exige o século XXI frente a inúmeros problemas e desafios enfrentados. As discussões sobre desenvolvimento caem no lugar-comum, de promover um desenvolvimento econômico entendido como mero aumento da renda per capita; baseado em empreendimentos governamentais, sem consultas prévias à sociedade, aos moradores que serão afetados, e sem a devida discussão da degradação ambiental decorrente (irmã siamesa do chamado desenvolvimento econômico). É presumido pelos governantes, e por aqueles que apóiam esta concepção, assim satisfazer as aspirações da população. Ledo engano.
É neste contexto que o CE-PE promove no dia 8 de agosto próximo, em Recife, um seminário intitulado “Desenvolvimento e Energia Nuclear”, talvez mera coincidência com o título do recente artigo publicado em jornal de grande circulação pelo diretor regional da Eletrobrás “Energia Nuclear e Desenvolvimento”. Com o apoio e a participação entre seus palestrantes exclusivamente de quem defende o uso desta forma de energia na geração elétrica, conforme é verificado no material de divulgação distribuído. Este evento não terá discussão, nem debate, mas será meramente um ato promocional desta tecnologia. O CE-PE capitulou frente a interesses contrários aos interesses públicos, pois como publicado amplamente pela mídia nacional, pesquisa de opinião realizada pela BBC no Brasil (e em vários países do mundo) mostra que mais de ¾ da população brasileira é contraria as instalações nucleares no país.
O exemplo do desastre de Fukushima alertou ao mundo o que representa um acidente nuclear. Mas o Brasil age na contramão dos países que outrora foram exemplos no uso desta tecnologia, como a Alemanha, Bélgica, Áustria, França, Itália, Japão, entre outros, que revisaram os planos para a construção de novas instalações nucleares em seus países. Os governantes que ainda propõem novas instalações nucleares estão distantes das opiniões de seus cidadãos, caso da China e da Índia.
A questão nuclear é pouco discutida em nosso país, e isso tem favorecido o “lobby” nuclear (CE-PE incluído) em avançar nas propostas de novas instalações. No planejamento do setor elétrico, é mencionada a construção de quatro novas usinas nucleares até 2030. Sendo duas no Nordeste brasileiro, possivelmente (somente ainda não oficializado) uma delas em Pernambuco, no município de Itacuruba, próximo de Floresta, na beira do Rio São Francisco. O velho Chico, como é conhecido o rio da integração nacional, banha cinco estados e mais de 500 municípios. Imagine o que seria um desastre nuclear com vazamento de material radioativo naquela região? É óbvio que não desejamos tal desgraça, mas, como em engenharia não existe “risco zero”, devemos prevenir. E para não acontecer o desastre, não devemos instalar tal usina. Parece-me óbvia e sensata esta conclusão.
Pois bem, nos pareceu oportuno tornar público o fato de que este evento não é aceito pacificamente por todos os cidadãos que, além de pagarem impostos, se sentem responsáveis pela elucidação de aspectos de interesse vital para a vida da população pernambucana. Aqui não se trata de mera reação daqueles opositores, mas sim em alertar a sociedade do papel que está cumprindo hoje o CE-PE. Que, a meu ver, deveria ser sim um local onde se pratica realmente o debate democrático, com autonomia, e com elevado interesse público. E não simplesmente que seja o lócus de “lobbying” de interesses distantes da sociedade.
Publicidade* Professor da Universidade Federal de Pernambuco e membro da Articulação Antinuclear Brasileira www.brasilantinuclear.ning.com.