O brasileiro acredita que o Presidente da República tem poderes sobrenaturais. A eleição presidencial determina muito, mas não é capaz de ditar totalmente os rumos da política econômica brasileira. A partir do caso da greve dos caminhoneiros desses últimos dias, é importante refletirmos sobre como a composição do Congresso importa (E MUITO) para os rumos econômicos do país.
A política de preços adotada pela Petrobras no governo Temer é uma das principais responsáveis pela explosão de preços que culminou na insatisfação popular vista na última semana. Ao repassar automaticamente os preços internacionais do petróleo ao consumidor, Temer acabou com a previsibilidade e a estabilidade dos preços dos combustíveis, uma vez que a cotação internacional do petróleo é fortemente influenciada pela oferta e demanda desse produto em todo o mundo, que, por sua vez, está sujeita a toda sorte de crises e tensões geopolíticas, além das variações do câmbio.
Para se ter uma ideia, ao longo dos últimos três meses, a soma do aumento do preço do barril de petróleo (o petróleo Brent variou entre US$44,35 e US$80,50 o barril no último ano) com a disparada do dólar (em 20/04 o dólar era cotado a R$3,39, enquanto em 19/05 o dólar fechou a R$3,75) fez com que os valores dos combustíveis explodissem para o consumidor brasileiro.
Mas não é só a política de preços de um governo fraco, incompetente e sem legitimidade a responsável pela crise que estamos vivendo.
A política de preços da Petrobras responde por aproximadamente metade dos custos dos combustíveis na bomba. A outra metade é composta por tributos estaduais e federais, o que tem levado muitas gente a defender o fim dos tributos como o caminho para a redução dos preços do diesel e da gasolina.
Apesar de aparentemente rápida, essa solução não é tão simples quanto parece. Por ser um item extremamente consumido, os impostos e contribuições incidentes sobre combustíveis constituem fonte primordial para a arrecadação do poder público. Por exemplo, o custo estimado das isenções dadas apenas sobre o diesel para tentar encerrar a greve dos caminhoneiros é de aproximadamente R$10 bilhões até o fim de 2018. Isso significa quase 10% de todo o valor destinado no orçamento público federal em 2017 para a educação (R$107,5 bi) e para a saúde (R$125,3 bi).
Diante da crise fiscal que vivemos, qualquer decisão irresponsável sobre a arrecadação pode ter um impacto explosivo sobre as políticas públicas das quais depende diretamente a população mais pobre, o que nos traz de volta à questão sobre como solucionar o problema da alta dos combustíveis.
Sem dúvida alguma, o primeiro caminho seria mudar a política de preços da Petrobras, garantindo aos consumidores algum grau de previsibilidade nas flutuações bruscas de mercado.
Outro caminho seria uma reforma tributária que tribute menos o consumo e mais a renda e o patrimônio. Em outras palavras, devemos buscar uma reforma em que a cobrança de impostos não seja feita de maneira indistinta a todos os brasileiros — como é o caso dos combustíveis, atualmente: a carga tributária na bomba de gasolina é a mesma tanto para o motorista de Uber, que trabalha com seu Fiat Palio parcelado em 120 vezes, quanto para o milionário que usa sua Mercedes para lazer nos fins de semana.
Apesar de essa solução ser evidente e defendida há décadas por dezenas de especialistas, sua execução é extremamente difícil. Todos os últimos presidentes tentaram promover alguma reforma tributária que mudasse a estrutura de arrecadação do Estado brasileiro. Por exemplo, rivais políticos como Fernando Henrique Cardoso e Lula, em seus respectivos governos, tentaram passar sem sucesso emendas constitucionais para nacionalizar o ICMS, que é um tributo estadual extremamente eficiente na arrecadação, mas um dos principais vetores da regressividade do sistema tributário brasileiro, pois incide sobre o consumo de bens e serviços. Da mesma forma, historicamente encontram forte resistência do Congresso Nacional propostas que tentam instituir o imposto sobre grandes fortunas, a cobrança de IPVA sobre iates e jatinhos, a tributação de lucros e dividendos, bem como a criação de faixas de imposto de renda mais altas para aqueles que se situam entre os 1% mais ricos de todo o país.
A mudança da estrutura tributária para focar mais na renda e menos no consumo, além da justiça social, reduziria o preço não apenas dos combustíveis, mas da maioria dos produtos comercializados em nosso país, o que melhoraria o bem-estar da população, incentivaria a atividade econômica e, consequentemente, aumentaria a geração de emprego e renda. Mas nada disso tem sido suficiente para sensibilizar o Congresso Nacional em torno deste tema.
É por isso que a solução da atual crise dos combustíveis, e de diversos outros problemas enfrentados pelo país, passa pela eleição de um Legislativo efetivamente comprometido com a resolução dos grandes problemas nacionais, composto por representantes determinados a darem início a um novo ciclo de crescimento econômico, geração de emprego, distribuição de renda e combate às desigualdades sociais do país.
Nada mais propício do que a realização deste debate agora em 2018, ano em que serão eleitos os ocupantes de dois terços do Senado e das 513 cadeiras da Câmara dos Deputados. É uma excelente oportunidade para promover uma verdadeira virada política no país e restabelecer o foco em políticas públicas para a retomada do crescimento e das políticas sociais interrompidas
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