Acaba de ser lançado A crise estrutural do capital de István Mészáros, um dos principais intelectuais marxistas contemporâneos, nascido na Hungria e discípulo de Georg Lukács, vivendo atualmente em Londres. É uma coletânea de artigos que trata das origens e profundidade da crise econômica mundial, fazendo uma crítica devastadora das engrenagens que caracterizam o sistema metabólico do capital.
Para além da fenomenologia da crise atual, vários autores críticos procuraram descortinar os fundamentos estruturais e sistêmicos do derretimento e liquefação do sistema de capital. Robert Kurz, por exemplo, vem alertando desde 1990 que a crise que levou à falência os países do “socialismo real”, com a URSS à frente do Segundo Mundo, a mesma que, dez anos antes, devastara o Terceiro Mundo, era expressão de uma crise do modo de produção de mercadorias que depois migraria em direção ao coração do sistema capitalista. François Chesnais apontou as complexas conexões existentes entre produção, financeirização e mundialização do capital, pois parte da riqueza advinda da “economia real” é canalizada para a esfera financeira e infla o capital fictício.
Mas desde os anos 1960 é Mészáros que vem sistematicamente assinalando a crise que já começava a assolar o sistema global do capital. Para ele, as rebeliões de 1968 – ocorridas no coração dos países centrais –, bem como a queda da taxa de lucro e o início da monumental reestruturação produtiva do capital datado de 1973 já eram expressões da mudança substantiva que se desenhava tanto no sistema capitalista quanto no próprio sistema global do capital. E mais, demonstrava a falência dos dois sistemas estatais de controle e regulação do capital vigentes no século XX: o keynesiano, que vigorou nas sociedades européias marcadas pelo welfare state, e o do tipo soviético. Em ambos os casos, o ente político regulador fora desregulado, ao final do longo período, pelo próprio sistema sóciometabólico do capital.
A análise de Mészáros o leva a constatar que o sistema de capital por não ter limites da sua expansão, acaba por constituir-se num processo incontrolável e profundamente destrutivo. Conformados pelo que se denomina “mediações de segundo grau” – quando tudo passa a ser controlado pela lógica de valorização do capital, sem que se leve em conta os imperativos humano-sociais vitais – a produção e o consumo supérfluos acabam gerando a corrosão do trabalho, com sua conseqüente precarização e o desemprego estrutural, além de impulsionar a destruição da natureza em escala global jamais vista anteriormente.
Ao contrário dos ciclos que conformaram o capitalismo ao longo da história, alternando períodos de expansão e crise, encontramo-nos, desde a década de 70, no que o autor denomina depressed continuum com aspectos de uma crise estrutural. Os mecanismos de “administração de crises” seriam cada vez mais recorrentes e cada vez mais insuficientes, uma vez que a disjunção radical entre produção para as necessidades sociais e auto-reprodução do capital se tornava a tônica do capitalismo contemporâneo, gerando conseqüências devastadoras para a humanidade.
O que será da humanidade quando menos de 5% da população mundial – os norte-americanos – consomem 25% do total dos recursos energéticos disponível, SE os 95% restantes viessem a adotar o mesmo padrão de consumo?
Ou seja, se correr o bicho pega, se ficar o bicho come. A questão não é mais ideológica, e sim vital.