Prof. J. Vasconcelos *
“Não sei o que faz um deputado federal. Depois eu lhe conto. Vou dar nomes a bois, sobrenomes a vacas e apelidos a bezerros. Para deputado, vote no abestado. Vote em Tiririca, pior do que tá não fica. Essa véia ainda dá um caldo.”
Assim tem se expressado ao público em sua campanha eleitoral o senhor Francisco Everardo Oliveira Silva, candidato a uma vaga no Congresso Nacional. Segundo as últimas pesquisas, tem grandes chances de ser eleito com cerca de 1 milhão de votos.
Os analistas vêm realizando vários comentários a respeito. Julgam se tratar de um voto de protesto. Mas não definem bem que tipo de protesto estaria sendo feito.
Esse tipo de conduta surge em quase todas as eleições brasileiras. Na legislatura federal passada foi eleito ao Congresso, com larga margem de votos, um indivíduo que aparecia gritando: “Meu nome é Enéas”.
Diria que o protesto não é tão simples. Não é apenas um protesto contra os escândalos dos parlamentares. É mais do que isso.
Muitos cidadãos sabem que eleição se traduz num processo em que são forçados a assinar um cheque em branco para os políticos usarem com o valor que acrescentam a bel-prazer e no que mais lhes interessar fazer.
Essa concepção de eleição, neste regime de democracia representativa, é extensiva também aos paises de primeiro mundo. Os europeus se ressentem da primitividade de uma eleição como a nossa. Lá, os candidatos a cargos no Parlamento são impostos aos eleitores pelos políticos profissionais através de listas pré-fabricadas, talvez por meia dúzia de políticos em cada partido.
Os europeus demonstram repulsa por essa situação por meio da abstenção, que chega em certos casos a mais de 50%. Mas uma coisa é certa: rejeitam esse tipo de enganação política sobre os cidadãos. Porém, esse tipo de protesto é logo abafado pela volumosa propaganda do regime, encetada pelos partidos, e, terminada a eleição, tudo morre e não se fala mais nisso.
Mas, agora, é o momento para uma reflexão. O sistema de eleições baseado na representação política é arcaico e antidemocrático. O povo vai às urnas simplesmente para escolher os que já estão escolhidos. Apenas sacramentam uma decisão tomada pelos marechais dos partidos políticos. Se alguns dos escolhidos não obtiverem votos suficientes para classificá-los como encaixados nas vagas, isto é um simples problema aritmético.
No Brasil, indivíduos que geralmente são listados nas legendas partidárias não o foram por apresentarem qualidades nobres em defesa da sociedade. São designados pelos partidos atendendo a outros requisitos, tais como notoriedade pública e posse de recursos econômicos. Em consequência, os indivíduos listados são aqueles que por sua fama ou recursos econômicos podem trazer votos aos respectivos partidos. Por consequência, são contemplados os comediantes, cantores, jogadores de futebol, apresentadores de TV e gente com recursos disponíveis para essas finalidades.
Ficam excluídos os cidadãos comuns que não dispõem desses requisitos, os quais podem ser professores, jornalistas, publicitários, médicos, advogados, engenheiros, operários, prestadores de serviço e assim por diante, não obstante muitos desses sejam personagens exemplares em estudos, pesquisas, humanitarismo, ideias e projetos.
A doutrina da democracia pura rejeita, portanto, a eleição por considerá-la dessa forma um processo primitivo e que não é democrático. Montesquieu já alertara que a eleição é um processo aristocrático. Hoje, com a televisão e rádio, passou a ser visceralmente oligárquico e de nível criticável.
Com certeza, a sociedade tem de resolver esse assunto no sentido de trazer aos cidadãos realmente processos democráticos abolindo com esses falsos dispositivos de manipulação e exploração de que se servem todos esses regimes denominados de “democracia representativa”.
* Prof J. Vasconcelos é advogado, filósofo e autor do livro Democracia Pura.