Os primeiros sinais de um eventual governo Michel Temer, caso se confirme o processo de impeachment, dão conta de que a agenda “Ponte para o Futuro”, elaborada pela fundação Ulisses Guimarães, parece ser mesmo a base do “Programa de Governo” do PMDB para o país nos próximos dois anos.
Nessa perspectiva, os partidos liberais da futura base e os principais conselheiros do vice-presidente Michel Temer têm dado entrevistas com frequência reiterando o compromisso com uma agenda liberalizante, desestatizante, fiscalista e dedicada à chamada melhoria do ambiente de negócios.
Na dimensão liberalizante, já há compromisso com a ideia de flexibilização das relações de trabalho, implantando a prevalência do negociado sobre o legislado, e a eliminação da exigência de conteúdo nacional, que desobriga a Administração Direta e Indireta da obrigatoriedade de adquirirem pelo menos 50% dos bens e serviços de empresas nacionais.
No aspecto da desestatização, as notícias são de que haverá venda de ativos de empresas públicas e sociedade de economia mista, privatização de empresas estatais nas áreas de energia elétrica, petróleo e gás, entre outras, além da substituição do sistema de partilha pelo de concessão na exploração de petróleo e também a eliminação da obrigatoriedade da participação da Petrobras em pelo menos 30% do pré-sal. Haverá intensificação de concessões de serviços públicos e uso de parcerias público-privado, ampliando a participação do setor privado em todos os setores de infraestrutura.
No quesito fiscalista, os sinais são de que entre a decisão de cortar despesas e a de criar ou majorar tributos a prioridade será sempre pela primeira opção. Além do corte de despesa, dentro da lógica do ajuste fiscal, está também no horizonte a desvinculação de percentuais da receita para determinadas despesas, como as de saúde, educação e ciência e tecnologia, entre outras.
As três principais despesas do governo são juros, previdência e pessoal. A julgar pela declaração dos conselheiros do vice-presidente, a prioridade será cortar nos dois últimos para garantir o primeiro. Ou seja, a meta de superávit primário será sagrada, porque na opinião deles é a forma de dar segurança ao mercado.
Assim, pode-se esperar, como aliás já foi anunciada, uma reforma da Previdência com o fim da aposentadoria por tempo de contribuição e instituição da idade mínima (especula-se que seja de 65 anos) para o Regime Geral de Previdência e ampliação dessa idade para o Regime Próprio dos Servidores, bem como mudanças nas regras de elegibilidade de benefícios, com ampliação de carências e outros requisitos. Está também no rol de medidas a desvinculação do valor dos benefícios assistenciais do salário mínimo, com garantia apenas reposição da inflação.
PublicidadeNão será surpresa, também, embora isso possa significar um tiro no pé, se o eventual governo Temer, além da adoção de programa de demissão voluntária e a instituição da dispensa por insuficiência de desempenho, também determine a suspensão dos reajustes negociados no governo Dilma, até mesmo com a retirada dos projetos de lei já enviados ao Congresso, e que ainda aguardam votação. Sinalização nesse sentido é a resistência dos líderes que apoiam o “futuro” governo em aprovar os reajustes do Poder Judiciário, da Câmara e do Senado, cuja urgência já estava negociada.
A eventual suspensão ou mesmo adiamento do cumprimento desses acordos salariais, que têm natureza alimentar e que foram pactuados em percentuais inferiores à inflação, será uma violência para com os servidores, de quem o “novo” governo irá necessitar para formular e implementar políticas públicas no país. Seria a primeira vez, desde a redemocratização, que um governo retiraria do Congresso projeto de reajuste salarial para utilizar os recursos a ele destinado para formar superávit primário, ou seja, para assegurar o pagamento dos juros e do principal da dívida, ou mesmo para cobrir outras despesas com maior apoio na sociedade, como reajuste dos benefícios do Bolsa Família.
Por fim, ainda no receituário neoliberal, voltaria para a pauta a ideia de independência do Banco Central, com os diretores e presidentes do banco com mandato fixo e plena autonomia em relação à política monetária e cambial, retirando do presidente da República, eleito pelo voto popular, qualquer ingerência sobre esses dois pilares da política econômica do país.
Essas, em linhas gerais, são as propostas defendidas pelos partidos e conselheiros do vice-presidente Michel Temer. Essa seria a quarta tentativa de agressão aos interesses nacionais e aos direitos sociais. A primeira foi patrocinada pelo “Centrão” na Constituinte. A segunda ocorreu na tentativa de revisão constitucional. A terceira, nas reformas de FHC. E a quarta seria num eventual governo Temer.
Os trabalhadores e suas entidades de classe, caso se confirme o processo de impeachment e o programa que lhe dá sustentação, devem se contrapor a esse receituário em bases neoliberais e reorganizar a sua atuação, com o apoio dos partidos e parlamentares progressistas, para que possam resistir ao provável rolo compressor que já está se articulando para aprovar tais medidas a toque de caixa.