Fábio Góis
O líder do PSDB no Senado, Arthur Virgílio (AM), anunciou há pouco em plenário uma apresentação de denúncia contra o presidente da Casa, José Sarney (PMDB-AP), sobre as supostas irregularidades praticadas por um de seus netos, o economista José Adriano Cordeiro Sarney, no agenciamento irregular de operações de empréstimo consignado para servidores da instituição. A denúncia foi protocolada na Mesa Diretora e será encaminhada ao presidente do Conselho de Ética, que ainda será definido pela Casa. A iniciativa pode resultar em processo de quebra de decoro parlamentar no colegiado.
“Torna-se imprescindível a investigação, por este Conselho de Ética, pela prática de de facilitação na operação dos empréstimos consignados junto aos servidores, por parte do Sr. José Sarney, tendo em vista a privilegiada situação de seu neto nas autorizações junto ao Senado Federal”, diz Virgílio, trecho do documento protocolado hoje (segunda, 29).
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Mas o caso do neto é apenas um dos motivos da ação. Depois de ler diversos casos de desmandos administrativos supostamente cometidos nas três gestões de Sarney na presidência, Virgílio disse que o peemedebista “não tem a mínima condição moral” de continuar à frente da Mesa Diretora. Ele fez menção a contratações de familiares, emissão de atos secretos que teriam criado cargos, e demais concessões de benefícios a parlamentares e servidores aliados.
No requerimento, Virgílio lista diversos casos de contratação de familiares e aliados; aponta empréstimo de apartamento funcional ao ex-senador e aliado Bello Parga; usufruto de auxílio-moradia, mesmo sendo Sarney dono de imóvel em Brasília; e utilização de servidores da área de segurança para fins particulares no Maranhão. Recorrendo a uma resolução da Mesa formalizada em 2003, o tucano pede ainda a escolha de relator para a denúncia e oitiva de Sarney em um prazo de cinco dias úteis, a partir de hoje.
O Conselho de Ética e Decoro Parlamentar do Senado é composto por 15 integrantes, mas desde março deste ano está desativado e sem componentes. Cabe aos partidos indicar, com base no critério de proporcionalidade, seus nomes para o colegiado – que deverão estar em dia junto à Receita Federal e serão submetidos à aprovação em plenário. O primeiro-secretário da Casa, Heráclito Fortes (DEM-PI), acredita que Sarney deve cobras as indicações dos partidos e, ainda nesta semana, o colegiado volta à atividade.
Resposta
Antes de ler o ofício de denúncia, Virgílio foi à tribuna do plenário para, entre outros assuntos, reforçar a pressão pelo afastamento do presidente da Casa, José Sarney (PMDB-AP), e fazer duras críticas à revista IstoÉ – que, em matéria publicada neste fim de semana, diz que o tucano recebeu, em 2003, empréstimo de US$ 10 mil do ex-diretor-geral Agaciel Maia, um dos protagonistas da crise que abala a instituição há meses. Segundo a revista, o favor foi articulado em pleno domingo por Carlos Homero Vieira Nina, amigo e funcionário de Virgílio, que estava de férias na França com a família.
“A revista IstoÉ, que é uma central de chantagens, de achaques montada neste país, pertence, ficticiamente ou não, ao senhor Domingos Alzugaray, ex-ator de fotonovelas que, de repente, se travestiu de jornalista”, vociferou Virgílio, com uma cópia da reportagem em mãos do “órgão [de comunicação] fictício, montado para fazer dinheiro fácil”. “Estou à disposição de quem queira me investigar. Estão falando com alguém que preza por sua biografia, com 30 anos de vida pública”, completou o senador, acrescentando que goza de “saúde cívica” para combater aqueles que se prestariam a macular sua imagem.
A revista faz menção ao discurso feito na semana passada por Virgílio, quando ele chama Agaciel de “chefe de camarilha” e sugere o rompimento de Sarney com membros da alta direção do Senado no período em que foram emitidos os atos administrativos secretos, novo escândalo instalado na Casa. Na ocasião, o tucano relatou a suposta chantagem que servidores da alta cúpula – como Agaciel e o ex-diretor de Recursos Humanos João Carlos Zoghbi – estariam fazendo a senadores que teriam sido beneficiados ou avalizados atos sigilosos.
“Há quem diga que a súbita fúria de Virgílio contra Agaciel estaria relacionada a outro fato que ele preferiu não contar em público: a exoneração do Instituto Legislativo Brasileiro (ILB) de Vânia Maione, esposa de Homero. Ela foi substituída por Carlos Roberto Stuckert, a mando de Agaciel”, diz trecho da reportagem. Trata-se de uma “bobagem”, segundo Arthur Virgílio. Ele diz que Vânia, ao saber que Agaciel era lotado no ILB, resolveu deixar o cargo. “Ela sentiu, com seu pressentimento feminino, que aqui não ia dar certo.”
Benefícios
Quantos aos documentos sigilosos – que há décadas eram formalizados sem a devida publicidade, como determina a Constituição, e beneficiaram parlamentares, servidores e aliados com contratações, aumentos e extensão de prerrogativas parlamentares, entre outros propósitos –, Virgílio diz acreditar que os ex-diretores não agiram deliberadamente. “Jaboti quando sobe em árvore é enchente ou mão de gente”, metaforizou o líder tucano, pedindo a demissão definitiva de Agaciel e Zoghbi. “Tem senador, sim, que apadrinhou esses corruptos.”
Além dos ex-diretores, Virgílio pôs em cheque o diretor-adjunto de Agaciel à época da emissão dos atos, Alexandre Gazineo, desligado do comando da diretoria-geral na semana passada (ele havia ocupado o posto em março, quando Agaciel foi afastado por Sarney depois das denúncias de ocultação de bens à Receita Federal). “Quanto a esse fantoche [Gazineo], não sei se merece permanecer nos quadros do Senado Federal”, bradou Virgílio, que diz que pedirá ainda hoje (segunda, 29) “investigação dura sobre todos os primeiros-secretários que trabalharam com o bandido Agaciel Maia”.
Segundo Virgílio, o contexto e as implicações de senadores com a cúpula administrativa do Senado promoveram uma situação insustentável para Sarney. “Não vejo mais condições de isso permanecer. Sarney não tem mais a mínima condição de moral de exercer a presidência desta Casa”, arrematou, sugerindo um inventário em todos os gabinetes.
Ao fim do discurso, Virgílio leu algumas sugestões de providências moralizadoras, entre as quais a devolução de servidores do Senado cedidos para outros órgãos, e anunciou a denúncia contra Sarney. “É o que eu posso fazer individualmente, como parlamentar.”
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