Esta notícia nada tem de "última". Foi publicada no dia 7 pelo site No Mínimo. O texto, sobre o Gabeira que saiu das urnas como deputado mais votado do Rio, é assinado por uma das mais felizes e inteligentes expressões do que o jornalismo carioca tem de melhor: o colunista Tutty Vasques, codinome do diretor de redação do No Mínimo, o jornalista Alfredo Ribeiro.
Melhor não tentar contar na terceira pessoa o que Tutty Vasques escreve. Esperamos que o autor e o site não se aborreçam com a transcrição. Aí vai a íntegra do artigo… (Sylvio Costa)
"Que Gabeira é esse?!
[Por Tutty Vasques]
07.10.2006 | As urnas deram um recado curto e grosso a Fernando Gabeira: o povo quer vê-lo como uma espécie de exterminador de severinos, super-herói da ética. Confesso que ando assustado com tal perspectiva. Tive noite dessas pesadelos com o deputado federal mais votado do Rio de Janeiro vestido de macacão vermelho e botas amarelas, óculos de aviador ao volante de um furgão equipado com sirene e a logomarca dos Caça-Corruptos. Acordo em sobressaltos! Não foi esse o cara que seus eleitores de sempre fizeram crescer na política, muitas vezes pagando o mico de darem-se as mãos para abraçar a Lagoa Rodrigo de Freitas, por exemplo.
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Numa boa:
Quem será o Gabeira catapultado a fenômeno das urnas pelo voto indignado da classe média carioca? Como é que ele vai discutir questões como a liberdade sexual ou o tênis de cânhamo com 293.057 eleitores, sabendo que pelo menos 200 mil desses votos dão por superada aquela viadagem de querer ser paladino de causas minoritárias, aí incluídas a legalização da maconha, a regulamentação das prostitutas, a união civil homossexual, a prática do nudismo, os direitos dos presidiários, a inclusão digital e a preservação das plantinhas? O deputado está com a cabeça branca de saber que essas coisas não dão voto, e ninguém duvida que ele tenha prestado um belo serviço à Nação quando resolveu bancar o homem em Brasília. Depois que saiu do PT e o Elio Gaspari escreveu "bendito o país que tem Gabeiras, gente que sabe dizer quando vai embora", qualquer um no lugar dele derrubaria o presidente da Câmara dos Deputados com um único rugido – foi o que bastou.
Desde então, tem me irritado profundamente ouvir elogios ao seu desempenho em mesas que, francamente, tratavam-no até outro dia como um terrorista meio abichalhado, meio maconheiro… Na semana em que Gabeira foi capa da "Veja", meu pai – o adorável reacionário de quem falava Nelson Rodrigues – já havia dado o braço a torcer. Gabeira era o cara, me dizia o velho, virou o cara de todo mundo. Agora me digam, como é que, soberano no cargo de queridão do Brasil, Gabeira vai sustentar o que dizia em 2003 sobre a falência da atividade parlamentar: "O dínamo da mudança do país está em outra parte, está na sociedade". Defendia, então "redes anárquicas e autônomas que se unem horizontalmente para a troca de informações sem essa caretice de partido". Na época, a Internet e as novas tecnologias lhe abriam a cabeça. Sabe quantos votos ele ganharia com isso?
Longe de mim querer botar água no chope do deputado. Ele sabe disso. Que saiba, também, que tem um bando de eleitores de primeira hora apreensivos com os rumos de sua performance parlamentar. Como é que se faz para não jogar 200 mil votos novos pela janela para ficar com 93.057 da vida toda ou vice-versa? – eis a questão. Como fazer conviver no mesmo parlamentar o revolucionário com o agente da ordem, o casaco de couro com a gravata na altura do pinto, o legalize com o legalista?
O que será o Gabeira na próxima legislatura? A mim não interessa a mínima esse discurso ético dos caça-corruptos. Dos 65 anos do nobre deputado, cobro a juventude de sempre: fala tu, dá uma idéia, sai dessa de dizer o que todo mundo quer ouvir. Ou vai acabar presidente da República que nem Fernando Henrique e Lula, para citar dois caras bacanas que a política estragou. Fique com a gente, deputado. Às favas o poder!"
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