Taty Brisolla
As opções gastronômicas se multiplicaram em Brasília e ganharam identidade própria. Com o elevado poder de compra de seus moradores, a cidade passou a servir à mesa uma das culinárias mais sofisticadas e criativas do país, aproximando-se de centros como São Paulo e Rio de Janeiro. Por trás do sucesso – ou melhor, à frente das cozinhas –, estão chefs que misturam a arte no preparo dos alimentos com o talento nos negócios. Que segredos eles guardam? Doses generosas de persistência, estudos, investimentos e criatividade estão entre os ingredientes apontados à Revista Congresso em Foco por alguns dos mais respeitados profissionais da área na capital federal.
Leia também
Dudu Camargo
Não basta ser cozinheiro, tem de empreender, receita o chef Dudu Camargo, que comanda uma rede de restaurantes em Brasília, como as duas pizzarias Fratello Uno, o Dudu Bar, o Da Noi e o Respeitável Burger, além da pizzaria Stravaganzze, no Rio de Janeiro. Filho do também chef Eduardo Camargo, este paulistano começou a trabalhar lavando louças, aos 13 anos, no restaurante da família. De lá, passou por todas as áreas de uma cozinha profissional. “Tive de aprender a ficar longe da família por muitos anos e a lidar com a mão de obra e a língua dos funcionários”, conta. Dudu diz que é na cozinha que sua criatividade, sua personalidade e sua emoção afloram. Só no ano passado, ele e seus estabelecimentos ganharam os prêmios de “Melhor lugar pra paquerar”, “Melhor barman”, “Melhor cozinha contemporânea” e “Melhor chef”. Pratos como o Dudu Chef (filé grelhado com redução de vinho tinto e goiabada cascão, acompanhado de riso al salto de queijo coalho) e o Cerradinho (filé de robalo grelhado com crosta de baru e arroz de caju-passa do cerrado) arrancam suspiros dos clientes. “Sempre me preocupo em servir com muita qualidade e dedicação, o que faz com que a refeição se torne um agradável programa”, explica o chef.
Serviço: Fratello Uno – SCLS 103 e SCLN 109 – Dudu Bar Asa Sul – SCLS 303 – Asa Sul – Dudu Bar Lago – SHIS QI 11, Bloco I, – Lojas 16, 40 e 46 – Lago Sul – Da Noi – Shtn – s/nº Trecho 1, Hotel Tulip – Respeitável Burguer – SCLS 402 – Asa Sul – Dudu San, Your’s e Cantina Italiana Unanimità (somente para eventos)
PublicidadeMara Alcamim
Autenticidade e criatividade são marcas registradas da chef Mara Alcamim, que comanda desde 1997 o restaurante Universal Diner. De lá pra cá, os dois já se reinventaram. Mara tem veia empreendedora e faz questão de imprimir sua personalidade irreverente e intensa em cada prato que assina. “Sempre gostei de comer e de cozinhar. Toda a minha vida está relacionada à comida”, diz. Mas foi em uma viagem a Nova York, para fazer um curso de fotografia, que a paixão pela gastronomia falou mais alto: o hobby virou profissão. Localizado na 210 Sul, o Universal chama a atenção já pela fachada, que ostenta a metade da carcaça de um Fusca. A casa é uma festa: da entrada, passando pelo bar, até o fundo do restaurante, onde há um jardim. “Adoro esse tipo de decoração, que se reinventa a cada dia. Sou uma pessoa apaixonada por música e que acha que ela deve caminhar junto com a culinária. É muito ruim comer em um lugar silencioso”, observa. O estabelecimento já foi premiado diversas vezes – agraciado, inclusive, como o melhor restaurante da cidade. Mara também ganhou o prêmio de chef do ano, em 2014. A Lonely Planet, uma das maiores editoras de guia de viagem do mundo, apontou o Zuu a.Z. d.Z, comandado à época por ela e fechado em 2011, como um dos cinco melhores restaurantes do Brasil. O próximo passo, adianta, é montar um restaurante que só utilize produtos orgânicos.
Serviço: Universal Diner – SCLS 210 – Asa Sul
Marcelo Petrarca
“Ligado nos 280 volts”, como gosta de dizer, Marcelo Petrarca adora receber amigos em casa. Foi com esse sentimento que o chef abriu as portas de seu outro lar, o restaurante Bloco C, inaugurado há pouco mais de um ano na 211 Sul. O ambiente presta uma homenagem a Brasília com painéis de Athos Bulcão, cimento queimado, linhas retas e cobogós. No cardápio, destaques para o filé de risoto com grana padano e rapadura, o strogonoff de filé e o churros de banana com doce de leite caseiro. Gaúcho, Petrarca morou no Rio antes de fixar residência em Brasília, onde se formou em gastronomia. Na Europa, fez pós-graduação em comida espanhola e trabalhou na Espanha e na Itália. De volta à capital, assinou cardápios de estabelecimentos como o Zuu a.Z d.Z, o Grand Cru e o Gazebo. Petrarca, com 28 anos, aproveita, de maneira despretensiosa e divertida, as redes sociais para explorar o network. “As pessoas veem o chef de cozinha como alguém distante. Eu brinco muito e isso me aproxima delas”. Recentemente, ele lançou dois novos projetos, o “Bloco C em casa”, que leva Buffet completo até a residência do cliente, com direito a serviço de garçom, para recepções com até 100 pessoas. E a “Mesa do chef”, que recebe até quatro pessoas, às terças-feiras, para jantar dentro da própria cozinha, com um menu especial escolhido pela casa. Ele diz não se importar com o prêmio de revelação dado ao seu restaurante no ano passado. “A única lista com que me preocupo é a de espera cheia.”
Serviço: Bloco C – endereço: SCLS 211, BL C – Asa Sul
Marco Espinoza
Se alguém dissesse ao peruano Marco Espinoza, menos de uma década atrás, que ele ganharia o prêmio de chef do ano no Brasil, poderia ouvir uma sonora gargalhada como resposta. Ele não sabia sequer fritar uma batata. Espinoza entrou de improviso em um evento gastronômico, na Argentina, e não saiu mais. Depois de cursar gastronomia em Buenos Aires, abriu em sociedade o Moche Sabores Del Peru, o primeiro restaurante exclusivamente peruano do elegante bairro de Palermo. “Ser chef nunca foi um sonho, foi um trabalho que cruzou o meu caminho”, confessa. No Brasil desde 2010, Espinoza abriu as portas do premiado Taypá Sabores Del Peru, em Brasília. Em 2013 inaugurou o Lima restobar (mistura de restaurante e bar), no Rio, e, em 2015, o Muju restobar, em Porto Alegre. No Taypá, os famosos ceviches, carros-chefes da casa, dividem espaço com o Pescado Al Azafran e as Yuquitas, pratos à base de frutos do mar. Frutos do mar, aliás, bem temperados e apimentados, são marcas registradas desse chef que não esconde seu gosto pelo agridoce. Da terra natal, Marco Espinoza não importa apenas os ingredientes. A equipe do chef é composta, em sua maioria, por peruanos. Apesar da crise econômica, ele não recua e aposta na expansão dos negócios. “Vamos trabalhar para que a culinária peruana esteja nas principais cidades do Brasil”, declara.
Serviço: Taypá Sabores Del Peru – SHIS QI 17 – Lago Sul
Renata Carvalho
“Faz certo que dá certo.” O provérbio, de autor desconhecido, é usado como máxima na vida profi ssional da chef de cozinha Renata Carvalho. Aos 32 anos, ela comanda dois restaurantes na 306 Sul. Essa certeza a impulsionou a expandir os negócios mesmo em época de crise. Inaugurado no ano passado, o Ancho traz no cardápio a típica comida portenha, em ambiente acolhedor. O agito fica por conta do bar montado ao fundo, do lado de fora do restaurante. O Loca Como Tu Madre é o “filho mais velho”, aberto em 2012. Funciona como um gastro-bar, que une música, bar e restaurante em um único espaço. Nascida em Brasília, Renata estudou gastronomia na Argentina, onde também iniciou os trabalhos na área. “Comecei lavando louça. Este, para mim, é o primeiro estágio que alguém pode ter”, explica. De volta à capital federal, passou por restaurantes como Le Jardin du Golf e Zuu a.Zd.Z, até montar o próprio negócio. Para atrair a clientela em tempos nebulosos, a chef aposta em um cardápio sazonal (primavera-verão, outono-inverno) e investe no happy hour, de terça a quinta-feira, no Loca Como Tu Madre, acompanhado por espetinhos de carnes especiais. “Abrir uma casa, chefi ar uma cozinha, é trabalhar muito, ter carinho e estar presente, conversar com os clientes e cuidar de cada detalhe”, explica.
Serviço: Loca Como Tu Madre e Ancho – SCLS 306 Bloco C – Asa Sul
Rosário Tessier
O sonho de criança era ser eletricista. Mas foi por necessidade que ele acabou entrando no ramo da gastronomia. “É melhor você trabalhar em algum restaurante, lá tem comida”, ouviu do pai. E, assim, aos 15 anos, o napolitano Rosário Tessier começou a construir uma carreira de sucesso. Hoje é dono de uma das principais cozinhas mediterrâneas de Brasília, a Trattoria da Rosário. Logo que começou a trabalhar na cozinha, em 1978, passou por diversos restaurantes em regiões como a Toscana, a Ilha de Capri e Veneza. Formado em administração, foi para a Inglaterra e a Espanha. Em 1993, chegou ao Rio, mas logo fixou residência em Brasília, assinando cardápios de estabelecimentos sofisticados. Em 2003 abriu seu próprio restaurante, a pedido do pai, principal fonte de inspiração. “Gastei o dinheiro de toda a economia que havia feito. Não sobrou nada. Sorte que eu era conhecido dos fornecedores”, lembra. A Trattoria da Rosário começou numa loja pequena, no comércio da QI17 do Lago Sul. A expansão foi gradativa à medida que o sucesso dos pratos se espalhava pela cidade. Da carta, ele destaca o tradicional ravióli, o lombo de cordeiro e a pasta com frutos do mar. Na entrada do restaurante, o chef estampa o certificado de qualidade “Ospitalità Italiana”, concedido pelo Instituto Italiano de Pesquisas Turísticas (Isnart) e pela Câmara Ítalo-Americana de Comércio, Indústria e Agricultura, aos estabelecimentos que carregam os encantos e a tradição da Itália.
Serviço: Trattoria da Rosário – SHIS QI 17 – Lago Sul
Futuro garantido
A goiana Isadora Lima trocou há dois anos o campo pela cozinha. Formada em agronegócio, Isadora não se encontrou na profi ssão. Foi após um trabalho de coaching de carreira que ela descobriu a vocação pela culinária. No último semestre da faculdade de gastronomia pelo Instituto de Educação Superior de Brasília (Iesb), a estudante levanta a bandeira do uso de ingredientes próprios do Cerrado na preparação da comida. “Adoro a área da confeitaria e os ingredientes brasileiros são os que mais me inspiram”, conta, ao mencionar o suspiro de jatobá preparado por ela. Isadora compreende, no entanto, que a profi ssão não tem a sofi sticação nem o status dado pela mídia. “O dia a dia de uma cozinha de verdade é muito mais pesado do que o retratada pela televisão”, completa. Mara Alcamim concorda: trabalhar por 12 horas em pé não tem nada de glamoroso. “As pessoas precisam encarar a cozinha como qualquer outro emprego. Fazer bem feito, com ética e comprometimento”, aconselha a experiente chef.
Esta reportagem foi publicada originalmente na edição 22 da Revista Congresso em Foco
Faça a assinatura digital e acesse todas as edições da Revista Congresso em Foco