A vida é feita de processos coletivos, mas também de atitudes individuais. Uma notícia chocou o Brasil. O corpo encontrado no shopping em Florianópolis era do reitor da UFSC, Luiz Carlos Cancellier de Olivo. Quatro dias antes, ele parece ter escrito sua carta de despedida. O suicídio do reitor nos interpela fortemente e impõe uma reflexão sobre o Brasil dos nossos sombrios dias.
Disse, em seu artigo n’O Globo, o professor Luiz Carlos Cancellier de Olivo: “A humilhação e o vexame a que fomos submetidos – eu e outros colegas da Universidade Federal de Santa Catarina – há uma semana, não tem precedentes na história da instituição. No mesmo período em que fomos presos, levados ao complexo penitenciário, despidos de nossas vestes e encarcerados, paradoxalmente a universidade que comando desde 2016 foi reconhecida como a sexta melhor instituição federal de ensino superior brasileira…”. “Nos últimos dias tivemos nossas vidas devassadas e nossa honra associada a uma “quadrilha”, acusada a desviar R$ 80 milhões”. “Uma investigação interna que não nos ouviu; um processo baseado em depoimentos que não permitiram o contraditório e ampla defesa; informações seletivas repassadas à PF; sonegação de informações fundamentais; e a atribuição, a uma gestão que recém completou um ano, de denúncias relativas a período anterior”.
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Passados quatros dias desse desabafo público, Cal, como era chamado pelos amigos, qual um “samurai moderno”, ofendido em sua integridade, desrespeitado como cidadão, exposto como se bandido fosse diante de sua comunidade, resolveu tirar a própria vida.
O Brasil está mergulhado na maior crise ética e moral de sua história. A mancha da corrupção contamina partidos, empresas, instituições. A sociedade indignada alimenta uma legítima fome de justiça. Não queremos mais impunidade. Apoiamos a Lava Jato que está passando o Brasil a limpo. Mas queremos tudo isso dentro dos marcos do Estrado Democrático de Direito tão duramente conquistado.
O Estado de Direito nasceu para proteger cidadãos e minorias, da voracidade repressora e dominadora do Estado e de maiorias eventuais. Os direitos individuais são peças basilares da democracia.
Em boa hora, o procurador-geral do Estado de Santa Catarina, João dos Passos Martins Neto, veio a público em sua nota de pesar externar: “A tragédia de sua partida ocorre sob condições revoltantes. As informações disponíveis indicam que Cancellier padeceu sob o abuso de autoridade, ou seja, em relação ao decreto da prisão temporária contra si expedido, seja em relação à imposição de afastamento do exercício do mandato… Que o legado do professor Luiz Carlos Cancellier de Olivo seja (…) também o de ter exposto ao país a perversidade de um sistema de justiça criminal sedento de luz e fama, especializado em antecipar penas e martirizar inocentes, sob o falso pretexto de garantir a eficácia de suas investigações”.
Que essa tragédia nos ensine novos caminhos.
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