Filipe Leão *
Não há como discutir a melhoria do gasto público brasileiro sem propor a redução do impacto das despesas com juros no orçamento público nacional. Afinal, por que o Congresso Nacional, ao invés de referendar a meta de superávit primário, não estabelece também uma meta de redução dos juros anuais? Por que não constar um superávit social na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO)?
A inversão é simples e de fácil compreensão. Hoje, estabelecer a meta do superávit primário significa comprimir os gastos sociais e liberar recursos para o pagamento dos juros, protegendo a lucratividade dos bancos, multinacionais, corretoras e dos fundos de pensão (nacionais e estrangeiros). Inverter essa lógica impõe priorizar despesas com educação, saúde e demais investimentos e reduzir os gastos com juros.
Os que criticam a mudança são os que se beneficiam do conceito do superávit primário e que vociferam contra a política de redução da taxa de juros brasileira. Fazem parte desse seleto grupo os que colocam a responsabilidade pelos juros altos no “alto risco” de crédito do governo brasileiro.
É até cômico. Qual é o verdadeiro risco que oferece quem paga religiosamente suas obrigações há mais de 20 anos?
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Em 2012, o impacto dos juros líquidos sobre a dívida pública variava em torno de 5% do Produto Interno Bruto (PIB). Quando daremos conta que esse valor é demasiadamente custoso para a nação? Como exemplo, se somássemos as despesas com a educação pública de todos os níveis (federal, estadual e municipal), ou seja, se computássemos todos os salários e encargos dos mais de 2,3 milhões de professores brasileiros que atuam desde as creches até às instituições de educação superior (IES), o consumo de materiais de limpeza, expediente, água, luz, telefone e pequenas reformas das 200 mil escolas públicas estaduais e municipais e das mais de 280 IES, ainda assim, obteríamos o percentual anual de gasto equivalente ao montante de juros sobre a dívida.
Para melhor visualizar o problema, é como se uma família de classe média, com duas crianças em idade escolar gastasse em juros no cartão o equivalente ao somatório das mensalidades, fardamento, alimentação e outros itens educacionais.
Com a redução do impacto da política de pagamentos de juros, veríamos o índice que mede a concentração de renda reduzir-se ainda mais. Afinal, a maior parcela do gasto de 5% do PIB com juros beneficia uma inexpressiva parcela da população brasileira.
É inacreditável que, mesmo sendo uma chaga nacional, o combate a esse desperdício encontre tantas resistências. E impressiona como o tema é abordado na imprensa – os casos de corrupção de milhões (ainda que relevantes) rendem mais que o debate dos bilhões.
Em meados de abril, o governo irá enviar a LDO constando a meta de superávit primário para o exercício de 2014. Os deputados e senadores dariam um ótimo rumo ao país estabelecendo uma meta de redução de gastos com os juros.
* Filipe Leão é bacharel em Ciências Contábeis, diretor do Sindicato Nacional dos Analistas e Técnicos de Finanças e Controle da Secretaria do Tesouro Nacional e da Controladoria-Geral da União (Unacon Sindical) e vice-presidente do Instituto de Fiscalização e Controle (IFC).
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