O encontro entre os presidentes do Mercosul no Rio de Janeiro terminou sem nenhum resultado prático imediato, considerando que foi deixado para depois a entrada da Bolívia sob a avaliação de um grupo de estudos. Os discursos protocolares e as principais entrevistas dos líderes presentes na reunião apenas acirram a disputa entre os países sobre a questão energética e as diferentes posições sobre a integração econômica.
A união "ideológica" entre Venezuela, Bolívia e Equador acabou atraindo para o Brasil as principais críticas, mesmo considerando o apoio aberto do presidente Lula à entrada da Bolívia no bloco.
Ainda na reunião preliminar de quarta-feira (16) os argentinos mostraram sua insatisfação com a entrada da Bolívia. A diplomacia platina ressalta que por estar dentro da Comunidade Andina, a Bolívia pratica taxas de comércio exterior muito diferentes das do Mercosul, o que lhe daria uma vantagem competitiva em relação aos demais parceiros do bloco econômico.
Mesmo assim, o presidente Lula atacou a posição argentina: “A nossa integração só se dará se houver disposição política de todos e a compreensão de que somos diferentes, cada país é diferente do outro, cada realidade é diferente da outra. Nós temos que aceitar um país como ele é e não aceitar só se ele se moldar como a gente quer”, afirmou o presidente no encontro de prefeitos e governadores do Mercosul, evento anterior à reunião de cúpula.
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E foi justamente em relação a questão energética que o presidente Lula teve que ouvir críticas duras do presidente da Bolívia, Evo Morales, durante o encerramento do evento. Morales disse que não é mais possível "subvencionar o gás para o Brasil". "O companheiro Lula fala de solidariedade, mas ao mesmo tempo a Bolívia vende gás subvencionado para Cuiabá por US$ 1,9 [milhão de BTU]", disse. O presidente boliviano acrescentou que, para Argentina, o insumo é vendido a US$ 5.
Na mesma sintonia, O presidente venezuelano, Hugo Chávez, terminou sua participação com mais retórica contra o capitalismo. Chávez disse que o modelo econômico é "o caminho da perdição do planeta" e que foi imposto "a ponta de canhão, golpe de Estado, invasão da América Latina no século 20".
Segundo o presidente da Venezuela, dentre as 300 empresas que estão dentro do bloco, 40% são transnacionais e outras 36% são dependentes dessas empresas. "Essas multinacionais têm interesse na nossa integração? Estou certo que não. Elas têm interesse na nossa desintegração. Representam o imperialismo", disse.
Antes de entregar a presidência temporária do bloco a seu sucessor, o presidente paraguaio Nicanor Duarte Frutos, Lula também ouviu críticas de outros dois principais parceiros do bloco, Uruguai e Argentina.
O presidente do Uruguai, Tabaré Vasquez, pediu a flexibilização do bloco como forma de ajudar os sócios menores como o seu país e o Paraguai. "O Uruguai pede justiça no tratamento dos países do Mercosul", disse.
Vasquez fez questão de citar o Brasil para ilustrar as disparidades no bloco. Segundo ele, enquanto as vendas de autopeças dos brasileiros ao Uruguai no ano passado totalizaram US$ 150 milhões, as vendas uruguaias para o Brasil no setor ficaram em US$ 5 milhões.
Do outro lado, o presidente argentino, Nestor Kirchner, declarou que a criação de um Banco do Sul e do Gasoduto do Sul são fundamentais para o Mercosul. Mas também fez críticas indiretas ao Brasil ao falar em agendas inconclusas como a criação de uma moeda comum. "Uma parte central do problema do Mercosul está vinculada fundamentalmente à agenda inconclusa do bloco", declarou. (Lúcio Lambranho)
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