Edson Sardinha
|
O senador Paulo Paim (PT-RS) evita falar sobre a sua possível saída do partido, mas adianta que estará do “outro lado da trincheira” no ano que vem, assim que as reformas trabalhista e sindical chegarem ao Senado. “Aí será guerra”, diz. Na avaliação dele, o governo não dialoga com os parlamentares e tem como principal desafio recuperar a credibilidade com o Congresso, abalado pelo caso da reforma da Previdência. Nessa entrevista ao Congresso em Foco, Paim critica o governo, o PT e prevê uma derrota eleitoral em outubro. As declarações foram dadas antes de o presidente da Câmara, João Paulo Cunha (PT-SP), incluir a reforma da Previdência na pauta do esforço concentrado de votações, o que só aconteceu ontem no final do dia, na véspera do início do recesso parlamentar e seis meses depois do acordo firmado no Senado. Leia também Congresso em Foco – A Câmara não incluiu a chamada PEC paralela da Previdência na pauta de prioridades do “esforço concentrado”. Isso quer dizer que a emenda também não é prioridade do governo? Paulo Paim – Parece-me que não é prioridade e lamento pelo acordo firmado, documentado e acertado para a matéria ser aprovada em janeiro. Estamos em julho e, ao que tudo indica, a PEC não será mais uma vez votada. Isso é ruim para o governo, a Câmara, o Senado e os seis milhões de trabalhadores que estão na expectativa. Pra mim, o grande prejudicado nessa história, além dos trabalhadores, é o governo. Os problemas do governo com o Senado começaram a partir do momento em que ele não cumpriu a palavra empenhada. Dali pra cá, foram problemas atrás de problemas. O governo não está conseguindo medir o prejuízo que está tendo com isso. Ele perdeu a confiança da base aliada e da oposição. Acordo é uma coisa sagrada aqui. Doa a quem doer ele tem de ser cumprido. “Os problemas do governo com o Senado começaram quando ele não cumpriu a palavra empenhada. Ele perdeu O senhor se sente traído pelo governo por causa da PEC paralela? Sinto-me decepcionado, frustrado e magoado. O senhor se arrepende de ter votado a favor da PEC da Previdência? Com certeza. Eu deveria ter votado contra a reforma da Previdência, assim como tantos outros senadores, como Ramez Tebet (PMDB-MS) e Pedro Simon (PMDB-RS). Nós fomos enganados. Se o Planalto não tivesse assumido o compromisso de votar a PEC paralela, teríamos votado contra e o governo teria perdido no primeiro ou no segundo turno. Como disse o senador Simon, deram-nos um passa-moleque. “Nós fomos enganados. Se o Planalto não tivesse Por que os problemas do governo no Senado começaram ali? Ali se demarcou a perda de credibilidade do governo. Esse desconforto que apresentam senadores como Magno Malta (PL-ES), Serys Slhessarenko (PT-MT), Flávio Arns (PT-PR), Antônio Carlos Valadares (PSB-SE) e Marcelo Crivella, só pra citar alguns nomes, começou ali. Caberia aos líderes do governo na Câmara e no Senado exigirem o cumprimento do acordo nas duas Casas. Isso não tem sido feito e tem causado uma indignação muito grande. Há três meses, os senadores reclamavam das mudanças feitas pelos deputados no projeto. Isso atrasou a votação da PEC paralela? As modificações feitas pelos deputados não alteram o eixo da proposta. Tivemos uma reunião com os presidentes do Senado, José Sarney (PMDB-AP), e da Câmara, João Paulo Cunha (PT-SP), e os relatores, o senador Tião Viana (PT-AC) e o deputado José Pimentel (PT-CE), e acordamos tudo, inclusive com algumas alterações. Por que não votar agora então? O que o governo ganha com a não-aprovação dessa PEC? Eu não sei, ninguém sabe. O próprio José Pimentel disse que a proposta não tem grande impacto na Previdência. Apesar disso, não se vota. O senhor não teme que sua posição fique insustentável no PT ao cobrar a votação da PEC paralela depois de ter votado contra o salário mínimo defendido pelo governo? O quadro é mesmo complicado, embora essa punição seja para inglês ver. Até agora nem eu, nem os outros dois senadores e onze deputados (que votaram contra o salário mínimo proposto pelo governo) sabemos o que de fato é essa punição. Só fomos informados pela imprensa. Isso está errado. Se há alguma punição, que ela seja explícita. A executiva tinha de chegar e anunciar que tomou tal decisão até pra ver a nossa reação. Até o momento não sei o que significa essa punição, esse “não poder representar politicamente o partido”. Afinal, posso fazer campanha eleitoral ou não? Estou sendo chamado para fazer campanha em todo o Brasil. Será que posso ir lá e defender o governo do PT ou não? “Até o momento não sei o que significa essa punição. Afinal, estou sendo chamado para fazer campanha em todo o Brasil. Será que posso ir lá e defender o governo do PT?” O PT perde eleitoralmente com isso? Com certeza. Nestas eleições o governo pode sair mais ou menos, mas quem sairá mal é o PT. O governo é uma coisa mais ampla, o PT será o grande prejudicado, principalmente nos grandes centros. O senhor já se vê fora do PT no segundo semestre? Isso só Deus sabe. Não temos que ter pressa. Tenho esperança de que o governo ainda mude de rumo. Se não mudar, não abrirei mão de defender os direitos dos trabalhadores, dos aposentados e dos desempregados e o salário mínimo. Sou um dos parlamentares que mais têm propostas no Congresso, e continuarei a defendê-las. O senhor se queixava, no início do ano, da falta de diálogo entre o Palácio do Planalto e o Congresso. Esse o problema persiste? Não falta diálogo, porque não existe diálogo algum entre o governo e o Congresso. Mas de lá pra cá o governo criou a secretaria de Coordenação Política para melhorar essa relação. Não mudou nada até o momento. Querem votar agora todas essas matérias (Lei de Falências, reforma do Judiciário e Lei de Biossegurança). Quando pergunto onde está a PEC paralela, dizem-me que está na pauta. Insisto na pergunta: na pauta, onde? Respondem então que não sabem. A interlocução com o governo não existe. Por isso já não sei se a PEC paralela será votada este ano. Se não o for, não será nunca mais. Enterrarão a proposta de vez. “A interlocução com o governo não existe. O PT poderá contar com o voto do senhor no segundo semestre? Tudo aquilo que for de interesse da Nação nós votaremos sem problema algum. Lamento que provavelmente numa retaliação medíocre e pequena, para quem enxerga no máximo a ponta do nariz, comecem a não deixar nenhum projeto de minha autoria ou de outros senadores com postura semelhante seguir adiante. Isso será uma bobagem. Dias atrás apresentei um projeto simples que dizia o seguinte: o trabalhador, durante o ano, terá direito a um dia, desde que conste em acordo de convenção coletiva, para cuidar de assuntos particulares, como emissão de documentos. Um projeto que até o empresariado aprovou, e o governo pediu vistas. Parte de quem essa retaliação? Parte do líder do governo, porque o que ele orienta a base cumpre. O Estatuto da Igualdade Racial, que envolve 70 milhões de brasileiros, e o Estatuto do Deficiente Físico, que beneficia 25 milhões de brasileiros, não avançam porque são de minha autoria. Não deveria ser por aí. Qual será o grande desafio para o governo no Senado depois do recesso parlamentar? Os grandes debates serão mesmo no ano que vem, quando entrarão em pauta as reformas trabalhista e sindical. Aí será guerra. Provavelmente, mais uma vez, estarei na trincheira contrária à do governo, cujo grande desafio hoje é recuperar a credibilidade. Ele está devendo para o Senado. |