Um grupo de apenas 13 deputados acumula 100 inquéritos e ações penais no Supremo Tribunal Federal (STF). Os campeões em número de acusações criminais na mais alta corte do país colecionam de 5 a 18 pendências judiciais. Eles representam 12 estados (Amapá, Pernambuco, Paraíba, Mato Grosso, Ceará, Paraná, São Paulo, Sergipe, Bahia, Minas Gerais, Rio Grande do Norte e Alagoas) e dez partidos políticos (PDT, PTB, PMDB, PSDB, PSL, PT, PSC, PR, PP e Solidariedade).
Entre eles estão parlamentares que exercem funções de prestígio na Câmara, como o relator da reforma trabalhista, Rogério Marinho (PSDB-RN), da medida provisória que facilita a vida de devedores com a União, Newton Cardoso Jr. (PMDB-MG), o autor do projeto que permite que alimentação e moradia sejam contadas como pagamento a trabalhador rural, Nilson Leitão (PSDB-MT). A bancada suprapartidária também reúne réu na Lava Jato, Aníbal Gomes (PMDB-CE), e líderes partidários, como Arthur Lira (PP-AL) e Alfredo Kaefer (PSL-PR), e presidente de partido, caso de Paulo Pereira da Silva (Solidariedade-SP), e até ex-presidente do Corinthians, Andrés Sanchez (PT-SP).
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Corrupção é o crime atribuído com maior frequência a eles. Mas também há apurações por outros delitos, como formação de quadrilha, lavagem de dinheiro e fraude em licitações. Os dados são de levantamento exclusivo do Congresso em Foco, feito com base em registros oficiais na página do Supremo.
Responder a acusações criminais não implica culpa, mas a repetição das suspeitas sobre um mesmo parlamentar costuma acender o sinal amarelo para o eleitor. Muitas das pendências criminais deles estão atreladas ao exercício de outros mandatos, principalmente de prefeito.
Da Papuda para a prefeitura
A liderança da bancada dos investigados na Câmara é do deputado Roberto Góes (PDT-AP), ex-prefeito de Macapá. Góes acumula 18 acusações criminais: oito inquéritos e réu em dez ações penais. Os crimes atribuídos a ele vão de corrupção, passando por lavagem de dinheiro e formação de quadrilha, até lesão corporal, a mais recente investigação aberta contra ele, no último dia 28.
Em 2010, o então prefeito passou dois meses preso preventivamente no Complexo da Papuda, em Brasília. A Operação Mãos Limpas desarticulou um esquema de desvio de verbas federais operado por servidores públicos e políticos amapaenses, entre eles o então governador, Waldez Góes (PDT), primo de Roberto Góes. Ao voltar para casa, em 12 de fevereiro de 2011, Roberto Góes foi recebido com festa no aeroporto e reassumiu a prefeitura. Em 2014, chegou à Câmara na condição de deputado mais votado do Amapá.
Em maio do ano passado, Góes foi condenado uma ação penal. A 1ª Turma do STF condenou o deputado por peculato no último ano de seu mandato como prefeito de Macapá, em 2012. A pena estabelecida foi de 2 anos e 8 meses de prisão, mas foi convertida em uma hora de trabalho voluntário por dia durante esse período. Também foi fixada uma multa equivalente a 20 salários mínimos em gêneros alimentícios, medicamentos ou material escolar. Ele recorreu da decisão e o processo continua em andamento no Supremo.
O Congresso em Foco procurou o deputado, mas não houve retorno. Ele chegou a atender ao telefone, mas a ligação caiu logo após a reportagem se identificar.
O vice-campeão em problemas na Justiça é o deputado Zeca Cavalcanti (PTB-PE), com 11 inquéritos. Ele não responde a nenhuma ação penal. Sete das investigações envolvem crimes de responsabilidade e se referem à época em que o petebista era prefeito de Arcoverde (PE), entre 2005 e 2012.
Em nota enviada ao Congresso em Foco, a assessoria do deputado afirma que ele está “absolutamente tranquilo” em relação aos inquéritos e que tem colaborado para o esclarecimento dos fatos. A última apuração contra Cavalcanti, por crimes contra a Lei de Licitações, foi aberta no último dia 4 pelo Supremo.
Herança municipal
Na terceira colocação entre os mais enrolados no STF, o deputado Veneziano Vital do Rêgo (PMDB-PB) responde a dez procedimentos. A única ação penal está suspensa. Dos nove inquéritos, quatro investigam a prática de crimes de responsabilidade. Ele também é investigado por peculato, lavagem de dinheiro e corrupção.
Veneziano afirma que os inquéritos são referentes à época em que ele foi prefeito de Campina Grande (PB), entre 2005 e 2012. “Dos 28 processos abertos no âmbito do STF (desde sua posse na Câmara, em fevereiro de 2015), 19 foram arquivados após extensas investigações realizadas pelas autoridades competentes, sem a comprovação, sequer indiciária, de minha participação na prática de qualquer ato lesivo ou ilícito durante minhas gestões. Tenho plena convicção de que os nove inquéritos remanescentes, serão arquivados pela mesma motivação”, afirmou o peemedebista, irmão do ministro Vital do Rêgo Filho, do Tribunal de Contas da União (TCU).
Empatados em quarto lugar na bancada dos deputados investigados estão Nilson Leitão, Aníbal Gomes, Alfredo Kaefer, Andrés Sanchez e André Moura, com sete inquéritos ou ações penais cada um.
Líderes do governo e dos ruralistas
Líder do governo no Congresso, André Moura é réu em três ações penais. O STF aceitou denúncias de formação de quadrilha, improbidade administrativa e crimes de responsabilidade. Nos outros quatro inquéritos, ele é investigado por tentativa de homicídio, crimes contra a Lei de Licitações, peculato crimes de responsabilidade, formação de quadrilha, corrupção passiva e lavagem de dinheiro. Ele não retornou o contato feito pela reportagem.
Atual presidente da Frente Parlamentar Agropecuária (FPA), também conhecida como bancada ruralista, Nilson Leitão tem contra si cinco inquéritos sobre crimes contra a Lei de Licitações, um sobre corrupção passiva e uma ação penal na qual é réu por crimes de responsabilidade. O tucano ganhou visibilidade nas últimas semanas por causa de um projeto de lei de sua autoria que prevê uma espécie de reforma para o trabalhador rural. Um dos pontos mais polêmicos é o que permite o empregador pagar funcionários com “remuneração de qualquer espécie”, o que pode ser interpretado como apenas alimentação e moradia. Ele também não se manifestou sobre as apurações.
Réu na Lava Jato
Em dezembro do ano passado, o Supremo aceitou denúncia contra Aníbal Gomes com base nas acusações de que recebeu propina para facilitar um negócio entre a Petrobras e um sindicato de práticos, profissionais que transportam navios em portos. O ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa apontou o cearense como intermediário de Renan Calheiros (PMDB-AL) no esquema.
Janot, no entanto, não incluiu Renan na denúncia, alegando falta de provas. Além da ação penal, ele responde a cinco inquéritos por corrupção. O sexto inquérito investiga crimes contra a administração e peculato. “Ele demonstrará de forma cabal que jamais praticou qualquer ato ilegal”, diz a assessoria.
Corinthians
Contra o deputado Andrés Sanchez (PT-SP), os inquéritos investigam, principalmente, questões financeiras. Suplente na comissão especial da reforma tributária, as sete investigações abertas contra o ex-presidente do Corinthians são sobre corrupção passiva, sonegação de contribuição previdenciária, apropriação indébita previdenciária, crimes contra a ordem tributária e crimes eleitorais.
A assessoria do petista enviou nota ao Congresso em Foco e afirma que um dos inquéritos (4276) se refere a uma empresa da qual Sanchez já não era mais proprietário.
Outros três inquéritos (4069, 4070 e 4077), segundo o gabinete dele, estão relacionados à sua passagem pelo Corinthians, clube que ele presidiu entre 2007 e 2011: “Esses processos estão parados porque são dívidas tributárias e o Corinthians já está pagando. Todos eles só estão no STF porque citou o nome do deputado. Como ele tem foro privilegiado, o caso subiu para o STF. São dívidas tributárias e juridicamente estão sendo resolvidas”.
Contra a ordem tributária
Titular na Comissão de Finanças e Tributação e da comissão especial que trata da reforma tributária, Alfredo Kaefer é investigado, principalmente, por crimes relacionados a questões financeiras. Os sete procedimentos abertos contra ele apuram crimes contra o sistema financeiro, formação de quadrilha, crimes contra a ordem tributária, crimes contra o patrimônio, crimes falimentares, extinção do crédito tributário e crimes praticados por particular contra a administração em geral. O paranaense não retornou o contato da reportagem.
Em quinto lugar entre os mais investigados, João Carlos Bacelar (PR-BA) acumula seis inquéritos. Os crimes apontados nas denúncias são eleitorais, contra a fé pública eleitoral, falsidade ideológica, corrupção passiva, corrupção ativa, lavagem de dinheiro, violação de sigilo funcional e peculato. Bacelar não se manifestou sobre as acusações.
Outros quatro deputados têm cinco procedimentos correndo no âmbito do Supremo. Newton Cardoso Jr. (PMDB-MG), Rogério Marinho (PSDB-RN), Arthur Lira (PP-AL) e Paulo Pereira da Silva (SD-SP) completam a relação dos 13 deputados que mais respondem a procedimentos no Supremo.
Dívidas com a União
Relator da medida provisória (MP 766/17) que permite o pagamento de débitos de natureza tributária ou não tributária, de pessoas físicas e jurídicas, vencidos até 30 de novembro de 2016, Newton Cardoso Jr. é réu em dois processos, por falsidade ideológica e crimes contra o meio ambiente e o patrimônio genético; e por crimes contra a ordem tributária. Filho do ex-governador Newton Cardoso, o deputado aparece numa lista divulgada recentemente pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional com uma dívida de R$ 67 milhões com a União.
Mesmo assim, em seu relatório da MP, aprovado por comissão mista, Newton Cardoso alterou o texto do governo para conceder benefícios de até 99% em multas, juros e encargos da dívida ativa da União.
“Em relação aos inquéritos e ações citados, o deputado federal Newton Cardoso Jr. informa que se trata de assuntos relacionados à iniciativa privada, sem qualquer relação com sua atividade parlamentar. Todas as defesas já foram apresentadas”, informou a assessoria do deputado.
Denunciado por Janot
Líder do bloco formado por PP, PTN e PTdoB, Arthur Lira também responde a cinco inquéritos, quatro deles envolvendo corrupção passiva. O deputado já foi denunciado pela Procuradoria-Geral da República, acusado de ter recebido recursos desviados da Petrobras. Os ministros, porém, ainda não examinaram a denúncia, que também alcança o pai dele, o senador Benedito de Lira (PP-AL).
Em nota enviada ao Congresso em Foco, a assessoria do deputado afirma que “os inquéritos no Supremo Tribunal Federal (STF) não têm elementos que corroborem os fatos. Trata-se de narrativas infundadas de delatores com inimizade patente com o parlamentar. Arthur Lira está à disposição da Justiça para esclarecer o que for necessário”.
Reforma trabalhista
Já Rogério Marinho, que relatou a reforma trabalhista na Câmara, é investigado por lavagem de dinheiro, peculato, falsidade ideológica e crimes contra a ordem tributária. A última investigação, por crimes contra a administração pública e peculato, foi aberta no dia em que o Plenário aprovou o seu substitutivo que altera radicalmente a legislação trabalhista, em 27 de abril. Marinho não se manifestou sobre as suspeitas.
Presidente da Força Sindical e um dos principais opositores da reforma trabalhista, o deputado Paulo Pereira da Silva (SD-SP) responde a quatro inquéritos e uma ação penal. Corrupção é o motivo de três investigações contra o deputado. O fundador do Solidariedade é réu em processo que apura desvio de recursos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), desvendado pela Polícia Federal na Operação Santa Tereza.
PMDB, de Renan, e PSDB, de Aécio, lideram a bancada dos senadores investigados no STF