Mário Coelho
O conselho especial do Tribunal de Justiça do Distrito Federal (TJDF) considerou nesta terça-feira (27) o Plano Diretor de Ordenamento Territorial (Pdot) parcialmente inconstitucional. Em sessão realizada na tarde de hoje, os desembargadores encerraram a análise da ação direta de inconstitucionalidade impetrada pelo Ministério Público do DF (MPDF). Ao todo, 60 dispositivos foram considerados inconstitucionais (50 por vício formal e dez por vício material) frente à Lei de Orgânica do Distrito Federal (LODF).
Em voto, o relator da ADI, desembargador Otávio Augusto, analisou ponto por ponto os dispositivos questionados pelo MPDF, a maioria oriundos de emendas parlamentares ao texto original do Pdot, rejeitando o pedido de inconstitucionalidade integral da Lei 803/2009. O julgamento foi iniciado na terça-feira passada (20), quando nove desembargadores votaram de acordo com o relator e um desembargador, João Mariosi, pediu vista do processo.
Uma das principais mudanças com a decisão do TJDF é a anulação do Setor Habitacional Catetinho. aprovado dentro do Pdot em 15 de dezembro de 2008 pela Câmara Legislativa do Distrito Federal. O projeto foi elaborado pelo então governador José Roberto Arruda, que contou com a maioria dos votos dos distritais. O Congresso em Foco mostrou, em novembro de 2008, que as construções na área são condenadas por órgãos ligados ao próprio governo, como a Companhia de Tratamento de Águas e Esgoto (Caesb) e o Instituto Brasília Ambiental. Em pareceres, ambos afirmam que a construção de habitações no local vai comprometer o abastecimento hídrico da capital. Arruda, na época, ignorou os dois relatórios.
O entendimento do relator da ADI é que os deputados distritais não poderiam ter criado o setor. Para ele, os artigos referentes ao setor habitacional contêm vício de origem. Ou seja, para Augusto, somente o Executivo tem o poder de criar um novo empreendimento habitacional. Na próxima terça, o relatório do desembargador pode ser aprovado pelo restante dos membros da corte especial. Além do Catatetinho, o magistrado pediu a anulação também outras áreas de expansão em localidades rurais.
A ADI foi proposta pelo Ministério Público do Distrito Federal (MPDF). Porém, o órgão só se manifestou um ano depois, quando veio à tona o esquema de corrupção e propina envolvendo membros do Executivo e do Legislativo, revelado pela Operação Caixa de Pandora, da Polícia Federal. De acordo com depoimentos do ex-secretário de Relações Institucionais do GDF Durval Barbosa, no inquérito 650DF, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), o governo subornou a base aliada para aprovarem o Pdot. Barbosa afirmou que cada voto custou R$ 420 mil na época.
De acordo com o MPDF, a ação foi elaborada após análise da lei pelas promotorias de Justiça de Defesa do Meio Ambiente e da Ordem Urbanística, apontando vícios de inconstitucionalidade formal e material, que evidenciam o desrespeito a normas da Lei Orgânica do Distrito Federal (LODF) e da Constituição Federal. O órgão também destacou, na ação, depoimento constante dos autos do Inquérito nº 650, em tramitação no STJ, que deu origem à Operação Caixa de Pandora. O depoimento afirma que houve “pagamento dos deputados distritais da base do governo em razão da aprovação do Plano Diretor de Ordenamento Territorial do DF” e que tal pagamento teria sido realizado com dinheiro “arrecadado entre as empresas que se beneficiaram com a aprovação do PDOT”.
Veja todos os dispositivos anulados:
Dispositivos decretados inconstitucionais por vício formal:
1. a inconstitucionalidade formal dos incisos II a IV e §§ 1° e 2° do artigo 43; dos incisos V e VII do artigo 53; do inciso VII do artigo 55; do inciso XI do parágrafo único do artigo 70 e, por arrastamento, do § 3° do artigo 135; dos incisos XII, XIV e XV do § 1° do artigo 74; a expressão “uma faixa de terra a oeste da vicinal 467, entre a Zona Urbana de Expansão e Qualificação e a Zona Rural de Uso Controlado; faixa de terra ao sul da DF-001 lindeira à área de Proteção Integral da APA Cabeça de Veado; uma faixa situada entre a Zona Urbana de Uso Controlado II e os polígonos da Área de Proteção de Manancial São Bartolomeu, na bacia do rio São Bartolomeu; e uma área limitada pela DF-003, ribeirão do Torto e Parque Nacional de Brasília” do § 1° do artigo 76; do inciso I do artigo 78; do § 2° do artigo 81; da expressão “e não agrícolas dos setores secundário e terciário da economia” do artigo 87; dos §§ 1° a 5° do artigo 109; do § 3° do artigo 113; da expressão “que inclui, além das áreas definidas em sua poligonal, a Vila do Boa, a Quadra 12 do Morro Azul, a Expansão do Bela Vista, o Morro da Cruz, o Residencial Del Rey, a Vila Vitória, o Condomínio Itaipu e as ruas 12, 12A, 13, 14, 15, 16 e 17 do Bairro Vila Nova” do inciso II do parágrafo único do artigo 127; dos incisos IV, V, VI, VIII e IX do parágrafo único do artigo 127; dos incisos XV, XXVII, XXXI, XXXII, XXXIII, XXXIV, XXXV, XXXVI, XXXVII, XXXVIII, XXXIX, XL do artigo 135; da expressão “que deverá abranger em sua área a região ocupada pela Q. 12 do Morro Azul e a Vila Boa” do inciso XXII do artigo 135; do § 1° do artigo 135, com redução de texto, a fim de retirar do dispositivo as áreas elencadas nos incisos VII, VIII, X, XII, XVI, XVII, XVIII, XXI, XXVI, XXXII, XXXVIII e XXXIX; dos artigos 285, 286, 297, 301, 302, 304, 307, 313, 315, 317, 320, 321, 327; das áreas previstas no Mapa 1A, por arrastamento (para que se exclua do zoneamento do Distrito Federal o Setor Habitacional Catetinho como Zona Urbana de Uso Controlado II, o trecho a noroeste de Santa Maria até o córrego Alagado; DF-180 (trecho a oeste, entre a Rodovia DF-190 e o córrego Samambaia); e o trecho ao longo da BR-060, a oeste de Samambaia como Zona Urbana de Expansão e Qualificação, bem como a região do córrego Ponte de Terra, próxima ao núcleo urbano do Gama; uma faixa de terra a oeste da vicinal 467, entre a Zona Urbana de Expansão e Qualificação e a Zona Rural de Uso Controlado; faixa de terra ao sul da DF-001 lindeira à área de Proteção Integral da APA Cabeça de Veado; uma faixa situada entre a Zona Urbana de Uso Controlado II e os polígonos da Área de Proteção de Manancial São Bartolomeu, na bacia do rio São Bartolomeu; e uma área limitada pela DF-003, ribeirão do Torto e Parque Nacional de Brasília como Zona de Contenção Urbana); da Emenda de Redação Final n. 01/2009, que suprimiu o inciso XLI do artigo 135 para fazer acrescentar a Área de Regularização de Interesse Social no Mapa 2, Tabela 2B do Anexo II, área S – 14 e no Anexo VI – 02 (Áreas fora de Setores Habitacionais); da Emenda de Redação final n. 02/2009, a qual acrescentou ao Mapa 7 da Redação Final a área do Setor Horta Comunitária na Região Administrativa de Planaltina; da Emenda de Redação Final n. 03/2009, a qual corrigiu o Mapa 7 (Áreas onde as glebas com características rurais podem ser objeto de contrato específico) contemplando-se com a área do Núcleo Rural Capoeira do Bálsamo, dando ao artigo 324 nova redação.
Dispositivos julgados inconstitucionais por vício material:
2. a inconstitucionalidade material do § 4° do artigo 40; do inciso VI do artigo 75; dos artigos 200 a 203 e artigo 148, inciso III, alínea “w” e § 4°; do § 5° do artigo 259; e do artigo 269.
Todos da Lei Complementar Distrital n. 803, de 25 de abril de 2009, em face dos artigos 3°, inciso XI; 15, inciso X; 19, caput; 52, 53, 72,inciso I, e 100, inciso X; 280, 289, § 1°; 314, 316, 317, 326, 56 (ADT) e 57 (ADT), todos da Lei Orgânica do Distrito Federal, com efeitos ex tunc e eficácia erga omnes.
Por fim, anota-se que, no caso, não há espaço para se aplicar a modulação dos efeitos prevista no artigo 27 da Lei n. 9.868/99.
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