Na mira da Operação Lava Jato e de outras investigações, o presidente Michel Temer (MDB) e o senador Aécio Neves (PSDB-MG) pretendem utilizar o indiciamento do ex-procurador Marcelo Muller, pela Polícia Federal, para anular o acordo de delação premiada fechado por Joesley Batista, um dos donos da JBS, e do ex-executivo da empresa Francisco de Assis. Temer e Aécio foram denunciados no ano passado por crimes diversos pelo ex-procurador-geral da República Rodrigo Janot, a quem Muller era subordinado, depois da ação coordenada que culminou na gravação de ambos em conversas suspeitas.
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Nos áudios, entre outras questões comprometedoras, Aécio pede R$ 2 milhões a Joesley, o que seria negociação de dinheiro ilícito com exigência de contrapartida para a JBS – a entrega de parte do dinheiro (R$ 500 mil) foi filmada pela PF e compõe o conjunto probatório contra o tucano. Já Temer, entre outros pontos também suspeitos, é gravado ao pedir que Joesley mantivesse, por meio de repasses de dinheiro, o silêncio de Eduardo Cunha (MDB-RJ), condenado e preso na Lava Jato, com o objetivo de impedir uma eventual delação premiada do ex-deputado.
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Essa e outras estratégias de defesa podem ter sido discutidas na noite de ontem (quinta, 21), na casa do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), em compromisso fora das respectivas agendas oficiais, segundo o blog da jornalista Andréia Sadi. Quem também passou pela residência do deputado foi o ministro Moreira Franco (Minas e Energia), igualmente denunciado pela Procuradoria-Geral da República (PGR) e um dos membros do chamado “quadrilhão do PMDB”, nas palavras da própria PGR.
PublicidadeA investigação debatida na casa de Maia quer saber se Marcelo Miller auxiliou, com interesses não esclarecidos, os executivos JBS. Segundo investigadores, já ficou claro, no entanto, que o ex-procurador não agiu para produzir provas ou com o objetivo de orientar Joesley no que diz respeito, especificamente, à realização de grampos de iniciativa individual do empresário feitos antes da ordem judicial para a execução das ações controladas.
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“A linha [de defesa] deles é a de que o indiciamento reforça a ideia de que Muller fez jogo duplo durante a negociação da delação da JBS. Portanto, querem anular as provas do acordo. Cabe ao ministro Fachin a decisão final sobre a rescisão do acordo”, informa Sadi, referindo-se ao relator da Lava Jato no STF e acrescentando que, hoje (sexta, 22), Temer tinha reservado compromisso em São Paulo com o advogado Antonio Claudio Mariz, que o defende das denúncias da PGR.
A versão oficial é de que o encontro, com direito a jantar, teve como menu exclusivo o atual cenário político. A formação de alianças para o pleito eleitoral de outubro também esteve à Mesa.
Dupla função
A relação do ex-procurador Marcelo Miller com os irmãos Joesley e Wesley Batista o colocaram na condição de suspeito depois que o próprio conteúdo dos áudios de Joesley veio a público. Depois de sair da PGR, Miller passou a atuar no escritório Trench, Rossi & Watanabe Advogados, no Rio de Janeiro, contratado pela JBS para negociar a leniência, acordo na área cível complementar à delação premiada dos Batista.
A decisão de Miller de deixar o Ministério Público Federal e partir para a área privada da advocacia foi tomada às vésperas da conversa entre Joesley e Temer, gravada em 7 de março de 2017 no Palácio do Jaburu, residência oficial da Vice-Presidência da República.
O ex-procurador era um dos principais auxiliares de Rodrigo Janot no grupo de trabalho da Lava Jato. Assim que as delações vieram à tona, a PGR foi obrigada a esclarecer que Marcelo Miller não assessorou Joesley nas negociações do acordo de delação com os antigos colegas, embora tenha atuado nas tratativas do acordo de leniência da JBS.
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