Telegramas enviados pela Embaixada do Brasil em Porto Príncipe ao Ministério de Relações Exteriores indicam suposto favorecimento das empreiteiras Odebrecht e Andrade Gutierrez em licitações internacionais do Haiti em 2006, quando Lula era presidente. Um dos telegramas mostra que um diplomata enviou documentos relativos a obras do país para representantes das empreiteiras antes mesmo de serem distribuídos a outras empresas brasileiras do setor. As empreiteiras e o governo brasileiro negam o favorecimento.
De acordo com a reportagem do UOL, a eventual atuação do Itamaraty em favor da Odebrecht está inclusa no inquérito que investiga tráfico de influência do ex-presidente petista.
Obtidos por meio da Lei de Acesso à Informação em junho deste ano, outro telegrama revela que o então embaixador brasileiro no Haiti Paulo Cordeiro de Andrade Pinto recebeu um “mapa de planejamento”para obras de construção e recuperação de estradas no Haiti.
Segundo Cordeiro, o mapa foi elaborado pelo governo do país, mas as obras, avaliadas em US$ 215 milhões (valores da época), seriam financiadas por organismos estrangeiros como Banco Mundial, BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento) e União Europeia.
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Ele então diz que antes de remeter o documento para o Brasil, para que o governo informasse quais empresas da construção civil poderiam estar interessadas em participar de futura concorrência, iria ceder o mapa para representantes da Odebrecht e da Andrade Gutierrez na república Dominicana.
“Estou enviando por mala diplomática para a DOC [Divisão de Operações de Promoção Comercial do Itamaraty] o mapa com os projetos rodoviários para este país [Haiti], que foi cedido pelo BID. Esclareço ter conversado sobre o tema com os senhores Rommel Curzio e Ernesto Baiardi, respectivamente gerentes das filiais das construtoras Andrade Gutierrez e Odebrecht na República Dominicana a quem emprestei o original do mapa para que fizessem cópias”, escreve o embaixador.
PublicidadeCeder o mapa com os projetos para as duas empreiteiras antes de o documento chegar ao Brasil é suspeito, de acordo com o doutor e pesquisador do Instituto de Relações Internacionais da USP, Vinícius Rodrigues Vieira. “É normal que o governo brasileiro tente promover empresas brasileiras no exterior. Mas esse tratamento levanta suspeitas em relação a um eventual favorecimento. Se o Brasil tinha outras empresas de construção civil aptas a atuar no exterior, por que o documento foi repassado primeiramente a essas duas empresas? Isso precisa ser investigado”, afirma o pesquisador.
O Itamaraty, no entanto, negou que a Embaixada do Brasil no Haiti tenha favorecido as duas empreiteiras. Em nota enviada à reportagem do UOL, classificou como “correta” a conduta do então embaixador brasileiro.
“Como a informação sobre a licitação já estava sendo divulgada pelo próprio BID junto a potenciais investidores de outros países, concomitantemente ao envio para Brasília, o embaixador informou todas as empresas instaladas na ilha [Hispaniola, onde estão Haiti e República Dominicana]. Como os prazos de licitação são longos e o sistema de comunicação do MRE (Ministério das Relações Exteriores) é instantâneo, não houve diferença significativa entre a transmissão da informação no exterior e a chegada do relato a Brasília”, afirmou o Itamaraty.
Por meio de suas assessorias de imprensa, as empreiteiras Odebrecht e Andrade Gutierrez negaram terem sido favorecidas pelo Itamaraty. As duas empreiteiras afirmam que não executaram as obras citadas no telegrama.
“O teor das mensagens não indica nenhum tipo de ação que fuja à normalidade da prática diplomática internacional, o que inclui, em todo o mundo, o apoio à ação comercial do país e de suas empresas”, disse a Odebrecht.
A Andrade Gutierrez, por sua vez, disse que “a companhia considera que o relacionamento institucional de empresas brasileiras com atuação no exterior e representantes do governo brasileiro nesses países seja uma prática normal e legal”, informou a Andrade Gutierrez.