Com um primeiro processo aberto em 2006 na 3ª Vara Cível de Campinas, a empresa da família Gobbo conseguiu, dois anos depois, que o banco finalmente devolvesse os contratos antes assinados em branco. Por força de uma ordem judicial, a instituição entregou tudo para que a perícia judicial fizesse seu trabalho de auditoria e o juiz determinasse quem está certo e quem está errado nessa história.
Aí entra o depoimento da gerente Denise Artem Ataíde, que, assim como a ex-gerente Marilene Spadaccia, também cuidava da conta da família Gobbo. Ela disse à polícia que, em fevereiro de 2008, depois da determinação da Justiça, chegaram caixas com contratos de vários clientes, incluindo os do grupo campineiro. Cada contrato tinha um “espelho” com o valor e a taxa de juros a ser cobrada. Mas o “preço” cobrado pelo dinheiro emprestado era maior do que o acertado com a clientela a lápis. “As taxas mencionadas no mencionado espelho eram o dobro do tratado com o cliente”, contou Denise.
A ex-gerente disse às autoridades que Marilene determinou que um funcionário separasse a papelada das lojas Bootco. O cuidado com o trabalho recebido fez um empregado fazer piada da situação. “Foi ironizada pelo senhor Cristiano a compra de mais dez canetas de tinta preta e de ponta porosa, específica para preenchimento de contratos fora do período de assinatura”, continuou Denise. Depois, a papelada foi encaminhada ao setor jurídico do Safra.
Leia também
De devedores a credores
Nas mãos da Justiça, os documentos embasaram a perícia determinada pelo juiz Ricardo Hoffman, da 3ª Vara Cível. Ao concluir sua auditoria em duas ocasiões, a economista Marlene Braz Pinto Nogueira analisou a conta corrente, a conta-garantia e os empréstimos de cartões da BGD Calçados, que integra a rede de lojas dos Gobbo. De acordo com ela, a empresa não deve nada ao Banco Safra. Ao contrário, seria credora de até R$ 311 mil utilizando-se índices do Tribunal de Justiça de São Paulo, em valores de abril de 2011. Em duas simulações mais conservadoras, ou a dívida seria zero ou ainda haveria R$ 93 mil a serem pagos aos lojistas.
Os assistentes técnicos contratados pelo Banco Safra contestaram as taxas de juros utilizadas pela perita judicial para recalcular a dívida. Mas ela insistiu em seu trabalho, alegando que utilizou os índices referentes a empresas, que são menores, e não a pessoas físicas, que são mais caros. “A perícia ratifica integralmente o laudo pericial, complementando-o com respostas aos quesitos da parte autora”, disse à Justiça Marlene Nogueira.
PublicidadePara o perito contratado pelo Safra, as conclusões de Marlene são “mero exercício matemático” sem base nos contratos e que não representam as práticas do mercado financeiro. “Ficou evidenciado que o banco cobrou taxas de mercado”, disse o contador João Peres Peres, em parecer datado de 26 de maio de 2011.