Fábio Góis
Quando o Senado ratificou em menos de cinco minutos a decisão da Câmara em reajustar os vencimentos dos parlamentares em mais de 60%, os senadores Cristovam Buarque (PDT-DF) e Pedro Simon (PMDB-RS) não estavam em plenário para contestar a votação. Nessa quinta-feira (16), eles decidiram protestar contra o aumento de maneira inusitada: protocolaram um projeto de lei que, caso vingue, estenderá o percentual de reajuste (61,78%) dos congressistas para o piso salarial dos professores do ensino básico público.
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Na hipótese de que seja aprovada, a taxa de reajuste definida na proposição garantirá a elevação do piso salarial dos profissionais da educação de R$ 1.024,00 para R$ 1.656,62. “Ainda é uma desigualdade substancial [entre a remuneração de parlamentares e professores], talvez a maior em todo o mundo, com consequências desastrosas para o futuro do Brasil”, diz a justificativa do projeto. O salário de deputados e senadores passará dos atuais R$ 16,5 mil para R$ 26,7 mil a partir de 1º de fevereiro de 2011.
“Se não for aprovado, vai ser uma vergonha. Se somos capazes de dar salário para nós próprios, não é possível não aumentar o piso salarial do professor brasileiro, que é infinitamente menor”, disse Cristovam ao Congresso em Foco, manifestando sua rejeição ao reajuste parlamentar. “Esse aumento já é uma vergonha. Se não aprovarmos esse projeto, a vergonha será ainda maior.”
A proposição é de autoria do senador pedetista, com assinatura de Simon. Segundo Cristovam, que foi reeleito para os próximos oito anos, a tramitação do projeto “vai ser uma prioridade não só em nome da educação, mas também pela credibilidade do Congresso”. Ex-ministro da Educação, Cristovam adiantou à reportagem que, nos mesmos moldes de sua proposição, assinou um projeto elaborado por Simon determinando que o aumento dos congressistas seja compensado na verba indenizatória, que é de R$ 15 mil mensais por senador.
“A verba indenizatória ficaria em R$ 5 mil”, defendeu Cristovam explicando que o projeto de Simon já encontrou um entrave burocrático: para efeito de legislação regimental, ainda precisa citar o número do decreto legislativo que formalizou o reajuste parlamentar. Segundo o senador, um servidor precisou se deslocar na noite dessa quinta-feira até a casa do presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), para despachos formais que definirão o numero de registro do decreto. Assim, o protocolo só estará disponível, na melhor das hipóteses, a partir desta sexta-feira.
Justiça
A ementa diz que o projeto “altera o parágrafo único do artigo 5º da Lei 11.738, de 16 de julho de 2008, que institui o Piso Salarial Profissional Nacional para os profissionais do magistério público da educação básica, para introduzir critério de reajuste anual de seu valor”. A atualização de que fala o texto do projeto será baseada no mesmo percentual de crescimento do valor mínimo por aluno referente aos anos iniciais do ensino fundamental urbano, definido nacionalmente (Lei 11.494/2007), “garantindo-se, em qualquer hipótese, índice de reajuste igual ao concedido aos senadores da República para o mesmo exercício”.
Segundo o projeto de lei do Senado, ainda sem número de protocolo, o alto índice do reajuste concedido anteontem reforça a desigualdade salarial e “é perigosa para a democracia, que depende da credibilidade do Parlamento”. Além disso, diz o texto, o reajuste foi feito em um momento em que discussões sobre diretrizes orçamentárias situam o aumento do salário mínimo em apenas R$ 40 por mês, “255,27 vezes inferior ao que nos outorgamos a nós próprios”.
“É justíssimo e necessário para o futuro do país que sejam garantidas aos professores e professoras […] remunerações condignas e compatíveis com suas funções e com os aumentos salariais dos paramentares que eles mesmos elegeram. A forma jurídica para este desiderato, em razão do desenho federativo de nossa República, é a de usar o instrumento do piso salarial profissional nacional como base para esses reajustes. Efeito da aprovação deste projeto de lei será o aumento imediato no Distrito Federal, nos estados e nos municípios dos vencimentos iniciais das respectivas carreiras do magistério”, registra o trecho conclusivo da justificativa, que apela à “solidariedade” dos senadores para que “a mesma celeridade processual” dada ao reajuste parlamentar seja conferida ao projeto.
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