Costumeiramente reservada a discursos, a sessão não deliberativa desta segunda-feira (15) no Plenário do Senado serviu para uma ação suprapartidária incomum na disputa política. Senadores se revezaram na tribuna em uma moção de apoio, organizada por Pedro Simon (PMDB-RS), às iniciativas contra a corrupção implementadas pela presidenta Dilma Rousseff nas últimas semanas, como reação às notícias de fraudes diversas em ministérios ocupados por aliados.
A iniciativa ganhou força depois que diversos veículos de imprensa de repercussão nacional noticiaram as práticas criminosas operadas em ministérios por funcionários de segundo e terceiro escalão. A fonte da crise são as pastas da Agricultura, chefiada pelo peemedebista Wagner Rossi (indicação do vice-presidente Michel Temer), e a dos Transportes, cujo ministro desde a gestão Lula era o senador Alfredo Nascimento (PR-AM), demitido após a descoberta de um esquema de desvio de recursos, superfaturamento e pagamento de propina supostamente operado na pasta pelo seu partido.
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Primeiro a falar, a partir das 14h, Pedro Simon iniciou o discurso dizendo o quão “importante e emocionante” era a sessão de “solidariedade”, e partiu para a crítica à impunidade que reina entre autoridades. “Há muito se fala que o Brasil é o país da impunidade. Razões existem para que o povo tenha uma profunda mágoa da política brasileira. Eis senão quando a atual presidenta da República age de uma maneira diferente da que até agora estávamos acostumados. Despreocupada com prestígio, com credibilidade, com aplauso, com simpatia, a presidenta toma algumas providências”, aplaudiu Simon, lembrando que Dilma demitiu aliados como Antonio Palocci, ex-ministro-chefe da Casa Civil, “homem da sua confiança”.
Simon voltou a mencionar, desta vez indiretamente, reportagem publicada na semana passada pelo Congresso em Foco sobre o “susto” urdido nos bastidores pelo PMDB, maior partido da base aliada. “Os líderes dos partidos estão a dizer que vão iniciar um movimento no sentido de acalmar a dona Dilma. Ou ela para ou vamos votar projetos. E não se discute que devam ser ou não devam ser aprovados, mas não aprovar como chantagem”, emendou o peemedebista, citando projetos dispendiosos que seriam usados como chantagem para que Dilma interrompesse seu ímpeto punitivo nos ministérios.
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Por fim, o senador fez um chamado aos parlamentares para que cheguem a uma “fórmula” que ajudasse Dilma a limpar sua equipe ministerial. “Presidenta, apure o que tem que ser apurado. Continue! Com grandeza, com responsabilidade, com seriedade, com magnitude, com espírito republicano, mas continue!”, incentivou Simon, lembrando que mesmo a Lei da Ficha Limpa (leia tudo sobre a Lei Complementar 135/2010), que considera um avanço democático, ainda precisa de aprimoramento.
PublicidadeNão ter corrupto no governo
Em seguida, o senador Cristovam Buarque (PDT-DF) falou da importância de “investigações profundas” e de mecanismos de precaução que impeçam a prática da corrupção. “Uma coisa importante é por corruptos na cadeia. Mais importante do que isso é não ter corrupto em nenhum governo, e não ter corrupto não é uma questão só de selecionar bem. É uma questão de fazer uma máquina que seja imune à corrupção. É impossível zerar completamente, mas é possível reduzir muito”, declarou o ex-ministro da Educação no governo Lula.
Para Cristovam, Dilma “não pode ficar em somente aproveitar a crise para sairmos da miséria moral” enfrentada pela classe política. “Não podemos deixar o governo ser guiado pelo que sai da mídia antes de haver um mínimo de comprovação, pelos menos um mínimo de robustez na suspeita”, completou Cristovam, cuja fala foi elogiada por Jarbas Vasconcelos – peemedebista “independente” que desempenha papel de oposição ao governo.
“Fico muito feliz, nesse momento incomum aqui no Senado – que tem atravessado um longo e tenebroso período de mediocridade, de subserviência –, de vê-lo, na tribuna da Casa, levantando um tema desta importância”, disse Jarbas, com críticas firmes ao “fisiologismo” instalado nos ministérios e nas bancadas de sustentação ao governo no Congresso.
“A arma dos fisiológicos, tanto na Câmara quanto aqui dentro do Senado, é o toma lá, dá cá. É a ameaça, é a chantagem. A chantagem de parar uma das Casas ou as duas Casas. Isso realmente pode, para um governo de menos de oito meses, incomodar e assustar. A presidente tem que ter a consciência de que a faxina tem que ser completa”, acrescentou o parlamentar pernambucano, lembrando que a “faxina” de Dilma tem de atingir até o seu partido, o PMDB, com membros a chefiar cinco ministérios no atual governo.
“Lixo”
Um dos mais contundentes em sua fala, Pedro Taques (PDT-MT) criticou o “lixo” que são os tecnocratas que rapinam recursos públicos destinados a projetos sociais. Com termos fortes, o senador se pôs à “ao lado” de Dilma no combate às práticas criminosas com a coisa pública, e sugeriu uma iniciativa republicana – um “pacto anticorrupção” que elimine os desmandos na administração pública e a “hipocrisia política”. “Não se trata de irregularidade. O que houve foi roubo, roubo do dinheiro público. Quem rouba dinheiro é lixo, é nojento – daí hediondo. A corrupção rouba o futuro”, bradou o pedetista.
O termo “lixo” fez lembrar o discurso feito no mesmo púlpito do plenário pelo senador Alfredo Nascimento (PR-AM), dias depois de sua queda do Ministério dos Transportes, em pleno recesso parlamentar. Na ocasião, o parlamentar do PR se queixou da falta de apoio de Dilma quando eclodiram as notícias de corrupção em sua pasta, e disse que nem ele nem seu partido são “lixo”.
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Falaram em apoio a Dilma, além dos já mencionados, os senadores Ana Amélia (PP-RS), Ricardo Ferraço (PMDB-ES), Paulo Paim (PT-RS), Randolfe Rodrigues (PSol-AP), Jorge Viana (PT-AC), José Pimentel (PT-CE), Rodrigo Rollemberg (PSB-DF) e Mozarildo Cavalcanti (PTB-RR). De parte da oposição, apenas Ataídes de Oliveira (PSDB-TO) e o líder do PSDB no Senado, Alvaro Dias (PR), fizeram discursos no contexto da sessão, mas reforçando críticas a determinadas posturas do governo – como a não demissão de aliados peemedebistas na Agricultura, ao contrário do aconteceu com o PR nos Transportes.
“Hoje eu quero aplaudir não a presidente Dilma, mas a imprensa brasileira, à Polícia Federal e o Ministério Público”, discursou o líder tucano, para quem não basta o discurso, mas ações práticas. Ele deu como exemplo o fato de que muitos senadores resistem em aderir à criação da CPI dos Transportes, que chegou a ter as 27 assinaturas que garantiriam sua instalação, mas desistências de última hora frustraram os planos oposicionistas. Os senadores que assinaram, disse Alvaro, “não ficaram no discurso”.
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Já o líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR), não quis se somar à iniciativa de Simon. “Vou agradecer [pela sessão de apoio], mas não vou falar, pois não concordo com o pedido de CPI”, justificou o senador, quando questionado pela reportagem, quando chegava ao plenário, se subiria à tribuna para oferecer solidariedade a Dilma. A sessão segue no Senado, e já dura quatro horas entre discursos e apartes.