A pressão de parlamentares contra o fim do voto secreto começa a dar resultados. Depois de ato promovido do lado de fora do Congresso, na semana passada, e o início da semana em plenário com críticas às decisões secretas no Parlamento, o presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), não teve alternativa e determinou a inclusão na pauta de todas as proposições sobre o assunto em tramitação na Casa. Depois de acatar a ordem, a Secretaria Geral da Mesa informou que as propostas de emenda à Constituição (PECs) – levadas ao plenário nos termos do artigo 170 do regimento interno – que extinguem ou eliminam o voto fechado nas decisões de Câmara e Senado entrarão em análise na próxima quarta-feira (13).
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Segunda a Secretaria Geral, três propostas de emenda à Constituição sobre o assunto foram pautadas: a PEC 50/2006, de autoria do senador Paulo Paim (PT-RS); a 86/2007, do líder do PSDB no Senado, Alvaro Dias (PR); e a 38/2004, apresentada em 2004 pelo então senador Sérgio Cabral (PMDB-RJ), hoje governador do Rio de Janeiro. As três já foram aprovadas pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) – as duas últimas, que tramitam em conjunto, foram aprovadas na CCJ em 2010, quando o colegiado era presidido, por coincidência, pelo próprio senador Demóstenes Torres (sem partido-GO). Agora, o senador enfrenta processo por quebra de decoro parlamentar no Conselho de Ética do Senado, sob suspeita de participação no esquema criminoso operado pelo contraventor Carlinhos Cachoeira, preso desde 29 de fevereiro pela Polícia Federal.
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A decisão de Sarney foi provocada por seguidas intervenções de diversos parlamentares nos últimos meses, e tem relação direta com o caso do senador Demóstenes Torres. O relator do processo, Humberto Costa (PT-PE), deve apresentar parecer favorável à cassação de Demóstenes no conselho, onde a votação é aberta. Mas o temor de alguns senadores, em rumor que tem ganhado força nos bastidores, é que o representado seja absolvido em plenário, onde o voto é secreto. Além disso, são necessários 41 votos para cassação de um mandato parlamentar, e já há quem tema esvaziamento da sessão plenária mediante alegação de compromissos pessoais.
Diante dos desdobramentos do caso, que veio à tona há pouco mais de três meses (leia mais aqui e aqui), a discussão sobre o voto secreto tem ganhado cada vez mais força, mas o leque de casos que envolvem decisões secretas foi apontado como empecilho para uma aplicação imediata do voto aberto – em votação de vetos presidenciais e composição de Mesa Diretora, por exemplo. Além da polêmica de conteúdo, há também a questão jurídica: como este site adiantou ontem (segunda, 4), a legislação não pode retroagir, por meio de uma PEC aprovada, para definir punição a um processo já ensejado, como é o caso da representação contra Demóstenes.
Assim, o mais provável é que seja priorizada a votação da PEC 86/2007, porque é específica sobre quebra de decoro, evitando a polêmica sobre a pertinência do voto aberto em casos que não sejam cassação de mandato. Além disso, a matéria já teve parecer favorável aprovado em junho de 2010 na CCJ. Como o autor da PEC disse ontem ao Congresso em Foco, basta apenas “vontade política” para que a questão seja resolvida como um primeiro passo, mesmo diante do impasse jurídico.
“A PEC do Voto Aberto está na ordem do dia há vários anos, e já cumpriu o rito regimental das cinco sessões de discussão. Só resta votar, e nós estamos insistindo há algum tempo para que ela seja colocada na ordem do dia e seja votada. Não temos tido sucesso”, disse o senador tucano, membro da comissão de inquérito que investiga as relações de Cachoeira com políticos e empresários – a chamada CPI do Cachoeira. No debate realizado ontem em plenário, Alvaro foi além e sugeriu “reunir lideranças independentes” para que nada no Senado seja votado antes da PEC.
Antes da discussão sobre as PECs, o senador Ricardo Ferraço (PMDB-ES) se antecipou e ajuizou no Supremo Tribunal Federal mandado de segurança para garantir a exposição de seu voto no julgamento de Demóstenes em plenário – previsto para acontecer antes do recesso parlamentar, em 17 de julho. O próprio relator do caso Demóstenes no Conselho de Ética também já alertou para a importância de abrir o voto no Parlamento, diante da pressão crescente da opinião pública. “Sou defensor da ideia de que o voto secreto só deva existir para temas em que a posição do parlamentar possa ser objeto de algum tipo de retaliação, especialmente, do Executivo ou do Judiciário. Um assunto como esse, sobre julgamento de colegas, deveria ter a votação aberta”, disse Humberto Costa.