Fábio Góis
Depois de um dia inteiro de discussões, o Senado suspendeu a sessão ordinária para concluir a votação do Projeto de Lei Complementar (PLC) 141/09, que disciplina a legislação eleitoral com vigência já para os pleitos de 2010 (leia abaixo os principais pontos da reforma). Para tanto, porém, a matéria deve ser aprovada no Senado até 30 de setembro, com sanção presidencial e publicação no Diário Oficial até 2 de outubro. Com as modificações operadas pelos senadores ao texto aprovado na Câmara, o PLC volta à análise dos deputados. O reinício da apreciação da matéria no plenário do Senado está prevista para as 9h desta quinta-feira (10).
A interrupção dos trabalhos desta quarta-feira foi determinada pela vice-presidente do Senado, Serys Shlessarenko (PT-MT), por volta das 22h30. Momentos antes, o presidente da Casa, José Sarney (PMDB-AP), foi à tribuna contestar uma das dezenas de emendas apresentadas ao texto principal, elaborado pelos senadores-relatores Marco Maciel (DEM-PE) e Eduardo Azeredo (PSDB-MG).
Sarney questionou a obrigatoriedade de nova eleição em caso de cassação de mandato do chefe do Executivo (atualmente, o segundo colocado nas eleições assume o cargo), questão defendida em emenda apresentada pelo tucano Tasso Jereissati (CE).
“Esta emenda, senhores senadores, não pode ser feita numa lei ordinária, porque se trata de um problema constitucional”, disse Sarney, lendo trechos da Constituição e sem querer discutir o mérito da matéria. “Nós não podemos, numa lei ordinária, estabelecer eleição indireta para prefeito. Se nós pudermos criar uma eleição indireta para prefeito por uma lei de ordinária, podemos criar uma eleição indireta para qualquer outro cargo.”
Dirigindo-se ao autor da emenda, Sarney fez menção também ao caso que tem como exemplo a própria filha, Roseana Sarney (PMDB), que assumiu o governo do Maranhão depois da cassação do ex-governador Jackson Lago (PDT), no início deste ano. Roseana foi a segunda colocada nas eleições de 2006. “Vossa excelência disse aqui que, nos primeiros dois anos, para governador, a eleição, se for feita, far-se-á uma nova eleição. Não é isso o que diz realmente a Constituição. Ela diz: quando há vacância dos dois cargos [governador e vice] e não quando houver essa disputa. Nós estamos criando hipóteses que nem a Constituição Federal admite.”
Citando o artigo 14, que dá direito de aparte a quem for citado em pronunciamento, Tasso pediu a palavra. “O intuito do nosso projeto não é estabelecer a eleição indireta. É, ao contrário, respeitar a vontade da população, a eleição direta”, disse Tasso, rejeitando o aviso de Sarney de que o conteúdo da emenda não poderia ser aprovado em lei ordinário, como é o caso da reforma eleitoral em curso. “Aqui tudo pode. Quando há acordo, tudo pode, e isso eu aprendi com vossa excelência.”
Restrições
O texto-base aprovado nesta quarta-feira autoriza a campanha eleitoral, sem restrição de prazo, em blogs e demais ferramentas da internet. A peça também permite que candidatos recebam doações por meio de cartões de crédito e débito, como foi defendido pelo senador Francisco Dornelles (PP-RJ) ainda na deliberação da Comissão de Constituição e Justiça. Outra mudança contida no texto principal estabelece que os debates de propostas na TV podem ser realizados com a participação de dois terços dos candidatos.
Com a suspensão da ordem do dia pela senadora petista, fica para a próxima sessão a principal polêmica em torno da reforma: a liberdade de opinião veículos de cobertura jornalística na internet. No texto principal, os candidatos passam a ter liberdade plena na grande rede, com autorização para livre uso de blogs, sites de interação e demais ferramentas – concessão feita também a candidatos à Presidência da República, que ainda poderão comprar espaço em sites com conteúdo jornalístico.
Mas o relatório aprovado conjuntamente nas Comissões de Constituição e Justiça (CCJ) e Ciência e Tecnologia visa evitar “tratamento privilegiado” para candidatos com mais poder econômico. Mesmo tendo operado alterações no transcorrer da semana, Marco Maciel e Eduardo Azeredo ainda mantiveram restrições a provedores e veículos de comunicação da internet, entre as quais publicar pesquisa, consulta ou qualquer outro tipo de enquete popular sobre candidatos. Ou mesmo favorecer algum dos pleiteantes “sem motivo jornalístico que o justifique”.
O texto não inclui os sites jornalísticos no parágrafo terceiro do artigo 57-D da lei das Eleições (9.504/97), que trata da “livre manifestação do pensamento”. O documento cita apenas blogs, redes sociais, sites de interação, de mensagens instantâneas e em outros meios de comunicação interpessoal. Diante da restrição, o líder do PT, Aloizio Mercadante (SP), apresentou emenda determinando liberdade irrestrita aos veículos on-line. O destaque do senador petista será analisado na retomada das votações.
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Confira os principais pontos da reforma, incluídas as modificações feitas pelos senadores:
• retirada da obrigatoriedade do voto impresso das urnas eletrônicas;
• será possível emitir opiniões na rede mundial de computadores em blogs, sites de relacionamento e mensagens instantâneas; Segundo Azeredo, a liberdade se estende aos sites jornalísticos, desde que respeitem as regras dos jornais impressos;
• propaganda na internet restrita a sites noticiosos e apenas para candidatura a presidente da República;
• retirada do voto em trânsito nas capitais do país para as eleições presidenciais;
• permissão para que as doações às campanhas sejam feitas por telefone;
• manutenção da permissão para que entidades esportivas façam doações de campanha, desde que as instituições não recebam recursos públicos;
• propagandas institucionais e eleitorais em lançamentos de obras e de pedras fundamentais são proibidas no período de seis meses antes das eleições;
• divulgação das prestações de contas parciais das campanhas em três ocasiões, sendo a última em 30 de setembro;
• manutenção da necessidade de os candidatos terem aprovadas suas prestações de contas para registrarem suas candidaturas;
• vetada a criação e ampliação de projetos sociais em ano eleitoral, assim como a mudança nos critérios de distribuição dos recursos aos programas. Entretanto, o governo pode conceder reajuste nos valores reservados para os programas, como o Bolsa Família;
• obrigatoriedade de nova eleição em caso de cassação de mandato do chefe do Executivo. Atualmente, o segundo colocado nas eleições assume o cargo.
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