Depois de uma ocupação que durou entre 11h e 19h desta terça-feira (11) na Mesa Diretora do plenário, o Senado aprovou na noite desta terça-feira (11) o Projeto de Lei 38/2017, que promove a reforma trabalhista patrocinada pelo governo Michel Temer, em meio à pior crise de sua gestão, e altera diversos pontos da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). A matéria foi aprovada com a promessa de que Temer, denunciado por corrupção passiva e sob julgamento na Câmara, compromete-se a vetar pontos polêmicos da proposta (veja a lista abaixo). Foram 50 votos a favor e 26 contra, com apenas uma abstenção. Apenas três senadores não participaram da votação: Acir Gurgacz (PDT-RO), Hélio José (PMDB-DF) e Maria do Carmo Alves (DEM-SE).
Leia também
Saiba como cada senador votou na reforma trabalhista aprovada nesta terça-feira
Rejeitados pela maioria governista a postos em plenário, três destaques foram apresentados na tentativa de alterar o PL 38 – de autoria da oposição, os textos alternativos pretendiam excluir do texto as questões do trabalho intermitente, da prevalência do negociado sobre o legislado e das condições de insalubridade para grávidas (leia mais abaixo). A oposição protestou e disse que não se poderia confiar em um presidente que, denunciado por corrupção, não tem condições de governar e, consequentemente, não pode garantir providências sobre o conteúdo do projeto de lei aprovado. A edição de uma medida provisória foi prometida como complemento à matéria.
PublicidadeSaiba mais sobre os relatórios alternativos apresentados pela oposição ao projeto de reforma trabalhista
O presidente do Senado, Eunício Oliveira (PMDB-CE), só conseguiu dar início à sessão de votação por volta das 19h. Durante todo o dia, o clima de tensão foi a regra na Casa, com muito bate-boca, protestos oposicionistas, reação governista e um impasse de sete horas. Superado o imbróglio, Eunício finalmente abriu a rodada de discursos contra e a favor da matéria, quando a maioria dos que subiram à tribuna se revezaram em protestos.
Depois da jornada de votações em três comissões temáticas, que resultou até em agressões físicas entre senadores, a matéria foi aprovada em 28 de junho no último colegiado antes do plenário, a Comissão de Constituição e Justiça, por 16 votos a 9, com uma abstenção. O texto avalizado pela maioria na CCJ foi elaborado pelo líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR), um dos principais fiadores da gestão Temer, depois de votos em separado dos senadores Eduardo Braga (PMDB-AM), Lasier Martins (PSD-RS), Lídice da Mata (PSB-BA), Paulo Paim (PT-RS), Randolfe Rodrigues (Psol-AP) e Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM).
Todos eles queriam promover alterações no projeto que veio da Câmara e foi endossado integralmente pelos senadores governistas – texto relatado pelo senador Ricardo Ferraço (PSDB-ES) que foi aprovado na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) e, numa derrota do governo, rejeitado na Comissão de Assuntos Sociais (CAS). Durante toda a fase de discussão nas comissões, Ferraço foi criticado porque, na condição de relator e legislador, abriu mão de promover mudanças no texto, restringindo-se a avalizar a missão dos vetos por Temer.
A pressa do governo em votar o texto no Senado sem modificações se deve ao fato de que, caso houvesse alteração de conteúdo, a matéria teria que retornar à análise da Câmara, autora do PL 38/2017. Uma das preocupações dos governistas, mesmo não declarada, é a sinalização, ao mercado financeiro, de que o Executivo, mesmo diante da denúncia de Temer por corrupção passiva, é capaz de promover no Congresso as reformas estruturantes e as medidas de ajuste fiscal – embora até os membros da base de sustentação reconheçam que as denúncias de corrupção na gestão peemedebista inviabilizaram a reforma da Previdência, por exemplo.
Discussão
Tão logo Eunício anunciou o início do processo de votação, deu-se a rodada de discursos em plenário, em um panorama de poucas intervenções governistas para defender o projeto. Relator da matéria, Jucá foi uma das vozes da base a se apresentar em público favoravelmente à matéria. “Nós temos alguns compromissos. Primeiro, ressaltar que esse projeto não retira direitos do trabalhador, porque os direitos estão garantidos na Constituição Federal, e isto aqui é uma lei infraconstitucional”, discursou o peemedebista, acrescentando que o governo editará medida provisória como complemento à reforma e proibindo trabalho para gestantes em condição insalubre, por exemplo.
“Essa lei que vamos aprovar hoje é moderna, uma lei que vai gerar empregos, criar oportunidade. Principalmente para os jovens terem a condição do primeiro emprego, porque hoje o desemprego é muito grande, mas quem sofre mais com o desemprego é a juventude brasileira”, concluiu Jucá.
Uma das principais críticas da matéria, Gleisi foi a primeira a subir à tribuna, e o fez de maneira indignada. “Os senhores deveriam ter vergonha de estarem votando a reforma trabalhista aqui! Nós temos que votar a favor do povo, não contra o povo! Vocês estão votando pelos interesses de vocês, olhando o umbigo de vocês, porque é isso que os senhores querem: que o trabalhador ganhe menos, trabalhe mais e que o lucro seja maior na sociedade. E, de preferência, que o orçamento público sirva, apenas e tão somente, para pagar o serviço financeiro da dívida. É a política do mercado! É a política do mais rico!”, esbravejou a senadora petista, apoiada por uma das parceiras na ocupação da Mesa.
“Michel Temer disse que esse projeto que foi mudado na Câmara ficou melhor. Ele escreveu. Senador Jucá leu na Comissão [de Constituição e Justiça]. Então, quem vai garantir que ele vai vetar o trabalho da mulher em lugar insalubre, o trabalhador precarizado? Não vamos abrir mão do nosso mandato! Vamos aprovar pelo menos uma emenda!”, lamentou Vanessa Grazziotin, lançando um desafio aos governistas. “Por que ninguém teve a coragem de subir aqui e dizer que esse projeto é maravilhoso?”
Leia também:
Senadores brigam em comissão e interrompem votação de reforma trabalhista; veja o vídeo
Um dos pontos questionados pela oposição, e até por alguns governistas, é a questão do trabalho intermitente, em que a prestação de serviços não é contínua, seja mantida a subordinação empregatícia. O modelo de trabalho permite que sejam alternados períodos laborais e de inatividade, fixados em horas, dias ou meses, independentemente do ramo de atividade. Outra questão polêmica muito criticada por oposicionistas é a possibilidade de que a trabalhadora gestante seja afastada automaticamente, durante toda o período de gestação, apenas de atividades classificadas como insalubres em grau máximo. Em condições insalubres de graus médio ou mínimo, a empregada só será afastada a pedido médico – o que pode provocar situações dúbias, segundo a avaliação dos opositores do projeto.
Agora ex-líder do PMDB, Renan Calheiros (AL) voltou a fustigar o governo Temer e subiu à tribuna para falar contra a matéria. Livremente no papel de oposicionista, ele aproveitou para lembrar que Temer está investigado por corrupção passiva e reiterou sua objeção às reformas do ex-aliado. “Esse governo parece morto, sendo fatiado pelo açougueiro”, atacou o peemedebista, referindo-se a Joesley Batista, um dos donos do Grupo JBS e responsável pela delação que pode transformar Temer em réu. Renan voltou a acusar o governo de retaliar aliados que se manifestaram contra a reforma trabalhistas – caso de Hélio José, que teve ao menos três de suas indicações para cargos no governo exoneradas por ordem de Temer, depois de ter votado contra a matéria na CAS.
Temer demite terceira indicação de senador que chamou governo de “corrupto” e “balcão de negócios”
Os pontos que o governo Temer promete votar:
1 – Gestante e lactante em ambiente insalubre
O texto aprovado pela Câmara dos Deputados prevê que a trabalhadora gestante deverá ser afastada automaticamente, durante toda a gestação, apenas das atividades consideradas insalubres em grau máximo. Para atividades insalubres de graus médio ou mínimo, a trabalhadora só será afastada a pedido médico.
2 – Serviço extraordinário da mulher
O projeto enviado ao Senado pelos deputados federais revoga o art. 384 da CLT. Esse artigo determina que a trabalhadora mulher deve ter 15 minutos de descanso obrigatório antes de iniciar o horário de serviço extraordinário, a chamada hora-extra.
3 – Acordo individual para a jornada 12 por 36
Para o relator na CAE, Temer deveria vetar também a alteração que permite que acordo individual estabeleça a chamada jornada 12 por 36, aquela em que o empregado trabalha 12 horas seguidas e descansa as 36 horas seguintes. Ferraço acredita que o texto aprovado pelos deputados sobre esse assunto “não protege suficientemente o trabalhador, que pode ser compelido a executar jornadas extenuantes que comprometam sua saúde e até sua segurança”.
4 – Trabalho intermitente
O relator recomenda veto aos dispositivos que regulamentam o chamado trabalho intermitente, aquele no qual a prestação de serviços não é contínua, embora com subordinação. Nesse tipo de trabalho, são alternados períodos de prestação de serviços e de inatividade, determinados em horas, dias ou meses, independentemente do tipo de atividade do empregado e do empregador. O melhor, para ele, seria regulamentar por Medida Provisória, estabelecendo os setores em que a modalidade pode ocorrer.
5 – Representantes dos empregados
O relator crê que uma MP poderia regulamentar a criação da comissão de representantes dos empregados nas empresas com mais de 200 funcionários. O PLC 38/2017 prevê que esses representantes não precisam ser sindicalizados e terão o objetivo de ampliar o diálogo entre empresa e empregados, mas não têm estabilidade do emprego.
6 – Negociação do intervalo intrajornada
O texto aprovado pelos deputados permite que trabalhador e empregador acordem, por meio de convenção coletiva ou acordo coletivo, “intervalo intrajornada, respeitado o limite mínimo de 30 minutos para jornadas superiores a seis horas”. Para o relator a mudança precisa ser melhor analisada para não gerar “precarização das condições de trabalho, com consequências sobre a saúde e a segurança do trabalhador”.
Leia mais:
Câmara aprova reforma trabalhista e altera quase cem pontos da CLT. Veja as principais mudanças
Parlamentares-patrões conduziram mudanças trabalhistas
A “modernização” da legislação trabalhista é o renascimento da Idade Moderna (1453-1789)