Em votação simbólica, que dispensa identificação de votos, o Senado aprovou em plenário nesta terça-feira (26) a criação de um fundo bilionário para financiar campanhas eleitorais, com recursos a serem extraídos dos cofres públicos. A matéria foi aprovada depois de muita polêmica e protestos em plenário, com direito a acusação de quebra de acordo. Superada a controvérsia, o texto será encaminhado à votação na Câmara para a tentativa de conclusão da chamada reforma política.
<< Câmara aprova em segundo turno fim das coligações partidárias em 2020; restam destaques
Agora, caberá aos deputados acelerar a tramitação da matéria, uma vez que se aproxima do fim o prazo para alterações nas leis político-eleitorais a tempo de valer já para 2018. Para que o fundo seja aplicado já no próximo pleito, o Congresso tem que concluir a votação até 7 de outubro.
No texto original, extinguia-se a propaganda partidária e o próprio horário eleitoral gratuito em rádio e TV. A proposição determina que o valor correspondente à compensação fiscal que a União concede às emissoras, em uma espécie de pagamento pela veiculação de tais programas eleitorais, seja reservado à composição do fundo de eleitoral. Este será alimentado, adicionalmente, por ao menos 30% do valor pré-fixado para emendas de bancada na Câmara, considerada a composição de 2018.
Segundo a proposta de Lei Orçamentária Anual (Ploa) de 2018, a previsão de concessão dessas emendas é de R$ 4,4 bilhões. Com base nesse cálculo, seria reservado R$ 1,32 bilhão desse total à composição do fundo. Já a parte relativa à renúncia fiscal é prevista em R$ 450 milhões.
Mas mesmo o montante a ser reservado ao fundo não é consenso entre os senadores. O senador Armando Monteiro (PTB-PE), escolhido relator do projeto, traçou um valor compreendido entre R$ 1,5 bilhão e R$ 1,7 bilhão para o financiamento de campanhas. Por outro lado, o líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR), estimou em R$ 2 bilhões o total a abastecer, em tempos de crise, partidos e candidatos nas disputas eleitorais.
“Em 2014, a soma dos gastos declarados pelos candidatos superou R$ 6 bilhões em valores de hoje. Em nossa proposta, esse montante não alcançará sequer R$ 2 bilhões. Abaixo desse valor, restaria seriamente comprometido o financiamento eleitoral”, defendeu o relator do projeto.
Fundo Especial
A matéria em questão é Projeto de Lei 206/2017, de autoria do senador Ronaldo Caiado (DEM-GO), que cria o Fundo Especial de Financiamento de Campanha. Na última quarta-feira (20), Armando Monteiro apresentou um texto substitutivo para ser votado em plenário. Armando optou por manter a propaganda partidária em rádio e TV veiculada em anos sem eleições – o texto de Caiado extinguiria o benefício –, bem como o horário gratuito para divulgar as candidaturas durante as campanhas em anos eleitorais.
O substitutivo de Armando Monteiro oferece alternativas de fontes de recursos para abastecer o fundo, como a metade do valor das emendas impositivas reservadas às bancadas de deputados e senadores, no âmbito do Orçamento Geral da União, mas apenas em anos eleitorais. De uma forma ou de outra, estima-se que o fundo conte com R$ 3 bilhões já em 2018. O projeto também disciplina a distribuição dos recursos entre partidos e a repartição dos valores no bojo de uma mesma legenda, fixando ainda um limite de gastos para o pleito do próximo ano.
Divergência
Caiado criticou o uso de emendas no financiamento. Para ele, a fonte de custeio não é justa com os destinatários originais das emendas. “Qual é o teto? Qual o limite máximo do fundo de campanha? Olha a gravidade: são emendas de bancada! Estamos punindo 5,5 mil prefeitos no Brasil que não têm como sobreviver sem as emendas de bancada. Saúde, educação, infraestrutura… Todas essas áreas serão penalizadas”, questionou o senador goiano.
Sem consenso entre os senadores, o substitutivo de Armando Monteiro encontrou uma brecha regimental para ser aprovado votação simbólica – a certa altura do encaminhamento da discussão, o PT apresentou um requerimento de votação nominal para que o substituto fosse votado preferencialmente. Como o regimento interno não admitiria mais conferência de votos nas próximas votações, o projeto foi decidido de maneira simbólica. Inusitadamente urdida em uma parceria entre PT e PMDB, a manobra foi duramente atacada em plenário.
Um dos mais enfáticos na crítica ao modelo de financiamento, o senador Renan Calheiros (PMDB-AL) foi à tribuna e classificou como “uma loucura” o conteúdo do projeto. “Acho que tem muita gente ficando doida aqui no Brasil. Num momento em que não há dinheiro para programas sociais – já cortaram R$ 3 milhões de Bolsa Família; se você multiplicar isso por três, são 9 milhões de pessoas diretamente prejudicadas. Não há dinheiro para as faculdades, para a ciência e tecnologia. Os investimentos no Brasil com dinheiro público voltaram a um patamar de dez anos atrás. E o Congresso está brincando de aprovar dinheiro público para financiar campanha eleitoral com isonomia”, vociferou Renan, quase aos gritos, dizendo-se defensor do financiamento privado “com critério, com regra, com teto, com piso”.
Mas, em seu papel de líder do governo, Jucá defendeu a adoção do financiamento público com direito a emendas. “Dos problemas, esse é o menor que teremos para promover a democracia. Não são R$ 2 bilhões que vão afetar o orçamento federal”, argumentou o peemedebista, apoiado pelo colega petista Humberto Costa (PE). “O que querem alguns aqui é a volta do financiamento privado, do caixa dois, das empresas apoiando parlamentares para depois fazerem chantagem contra eles”, discursou o parlamentar pernambucano.
Inconformado com a aprovação do substitutivo, Caiado ainda tentou enxertar na matéria, por meio de destaque de plenário, o fim do horário eleitoral gratuito. Mas, minoria em relação a essa demanda, o parlamentar goiano viu seu requerimento ser rapidamente rejeitado.