A denúncia do Ministério Público Federal (MPF) das 40 pessoas acusadas de envolvimento com o mensalão, encaminhada ao Supremo Tribunal Federal (STF) pelo procurador-geral da República, Antonio Fernando de Souza, deu margem a coberturas e interpretações bastante distinas nas revistas semanais que começaram a circular neste final de semana. As versões mais contrastantes entre si estão nas revistas Veja e Carta Capital.
Com a manchete “O bando dos 40”, a revista Veja mantém o mesmo tom crítico que tem usado em relacão ao governo Lula desde o início da crise política. A imagem do presidente aparece estampada na capa, composta na forma de um quebra-cabeças com fotos dos 40 denunciados (entre os quais, os ex-ministros José Dirceu e Luiz Gushiken e vários parlamentares do PT).
Veja interpreta a denúncia do procurador-geral como a demonstração de que foi montada uma “organização criminosa” para garantir o projeto de poder do PT. E diz que Lula foi o “sujeito oculto” de todo o esquema: “O nome de Luiz Inácio Lula da Silva não aparece no texto da devastadora denúncia do procurador-geral da República, mas ela mostra o presidente cercado por assaltantes dos cofres públicos. Depois dessa arrasadora denúncia, só restam a Lula o chapéu de patrono do crime ou de inepto. Qual deles lhe serve?”.
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A edição é farta em elogios à peça acusatória: “Ali estão descritos em detalhes e com precisão jurídica os mecanismos de funcionamento do que talvez seja – com exceção da nomenklatura soviética – a maior quadrilha jamais montada com o objetivo de garantir a continuidade no poder de um mesmo grupo político, o PT de Lula”.
E continua: “A hierarquia da quadrilha descrita pelo promotor tem como chefe José Dirceu, deputado cassado por corrupção que foi ministro-chefe da Casa Civil de Lula. Abaixo dele estão quase todos os ‘companheiros de luta’ de Lula, gente com quem ele conviveu intimamente por quase três décadas. O procurador-geral deixou vago no organograma da quadrilha o posto logo acima de José Dirceu. Mas o quebra-cabeça não é de difícil solução. Basta montar as peças e aparece o mais provável ocupante daquele posto. É isso que aponta a lógica mais comezinha. É isso que aponta o bom senso. Basta tentar montar com as peças do quebra-cabeça uma outra imagem que não a de Lula. Não encaixa”.
Já Carta Capital, em matéria assinada por Sérgio Lirio, diz que Antonio Fernando de Souza “acabou por cair na esparrela que ele dizia pretender evitar. A peça acusatória, que aponta a existência de uma ‘sofisticada organização criminosa’ comandada pelo ex-ministro José Dirceu, é contundente, mas em boa medida acabou contaminada ‘pelo caráter político reinante na CPI dos Correios’, para usar palavras do próprio Souza”. O título da reportagem, “MP vai na onda”, já aponta a linha de interpretação desenvolvida.
Para a revista, a denúncia, em relação ao relatório final da CPI dos Correios, “descreve de forma um pouco mais coerente o consórcio formado entre integrantes do PT e o publicitário Marcos Valério Fernandes de Souza e as origens do chamado valerioduto”. Mostra que “o esquema foi inaugurado em 1998, na campanha para reeleição ao governo de Minas Gerais do hoje senador tucano Eduardo Azeredo”. Mas encampa a tese do mensalão sem acrescentar “provas cabais necessárias para qualificar a crise dessa maneira”.
De acordo com a Carta Capital, “mantém-se de pé a distanciada, e talvez mais precisa, definição do escândalo, publicada pela The Economist. Segundo a revista britânica, a tese do mensalão é formada por ‘ilhas de fatos cercadas por um mar de suposições'”.
“Por enquanto”, prossegue a revista, “algumas perguntas permanecem sem resposta: por que petistas precisariam receber dinheiro para votar projetos de interesse da administração Lula? Como era possível manipular as votações no Congresso pagando a tão poucos? Ou o MP descobre mais beneficiários ou será difícil sustentar a tese do mensalão. Detalhe: João Borba (PMDB-PR), que recebeu cerca de 2 milhões de reais e misteriosamente havia sido excluído do texto do conterrâneo e colega de partido Osmar Serraglio, aparece entre os denunciados na ação do MP”.
A matéria conclui: “O fator tempo pode ser saudável. Talvez daqui a um ano, seja quem for o presidente da República, os juízes possam analisar o caso livres da pressão político-eleitoral que exacerba os ânimos e, com freqüência, obscurece a racionalidade.”
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