Ou seja, não haveria a possibilidade de o substituto hierárquico na Mesa – o 1º vice-presidente da Casa, Marconi Perillo (PSDB-GO) – chegar a tempo para prorrogar a sessão e, assim, ler o requerimento (os tucanos haviam informado que Perillo, que já estava em Goiânia, tomaria um avião de volta só para ler em plenário o pedido de abertura da CPI).
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Foi o que bastou para que o líder do PSDB no Senado, Arthur Virgílio (AM), sem alternativas, subisse à Mesa, ocupasse a cadeira da presidência e, aos gritos e batendo na mesa, anunciasse: “Quero ver quem vai me tirar daqui!”, disse Virgílio, emendando uma exortação ao colega. “Com a palavra, o senador Tasso Jereissati [PSDB-CE].” Tasso tomou o microfone do plenário, protestou por alguns segundos e, por causa do primeiro-secretário, Heráclito Fortes (DEM-PI), não mais se fez ouvir em plenário – por determinação de Heráclito, os microfones foram todos desligados.
“O senhor não é mais senador do que ninguém aqui!”, vociferou Tasso, dirigindo-se ao colega piauiense. “Sou o primeiro-secretário”, respondeu Heráclito.
Em seguida, e novamente sem ter o que fazer, Virgílio deixou o plenário e anunciou à imprensa algo também inédito: que pediria “a cabeça” da secretária-geral da Mesa, Claudia Lyra.
“Essa senadora [Serys] demonstrou que se presta a qualquer papel, e encerrou uma sessão depois de eu ter pedido a palavra como líder, amparada numa viúva do senhor Agaciel Maia – viúva entre aspas, funcional, daquele esquema de roubalheira que estava montado aqui no Senado –, a senhora Claudia Lyra, que não vai continuar como secretária-geral”, bradou o tucano, acrescentando que pedirá ao presidente da Casa, José Sarney (PMDB-AP), a demissão da servidora. Do contrário, disse Virgílio, “a vida dele se tornará um inferno aqui nesta Casa”.
PublicidadeDesordem do dia
A assessoria de imprensa de Marconi Perillo disse à reportagem que, no momento em que o embate era travado em plenário, o senador estava “batalhando voo” de volta para Brasília no aeroporto de Goiânia. Segundo a assessoria, depois de saber do desfecho da sessão Marconi decidiu permanecer na cidade e retornar só amanhã, às 9h. Como garante o regimento, o senador poderá fazer a leitura do requerimento da CPI, em caso de ausência de Sarney.
Já a senadora Serys Slhessarenko ponderou que a reação oposicionista é normal. A petista repetiu diversas vezes que “não havia inscritos” para que a sessão se mantivesse aberta – o que, como podem demonstrar notas taquigráficas, justificaria a orientação regimental de Claudia Lyra.
“De qualquer forma, a sessão estava acabando”, concluiu a petista, reiterando que, como Heráclito havia ressaltado seguidas vezes em plenário, a reunião de líderes que definiu o depoimento do presidente da Petrobras, Sérgio Gabrielli, antecederia uma eventual leitura de requerimento. À reportagem, a assessoria de Serys garantiu que a senadora já estava no caminho de volta para casa quando, dentro do carro, ouviu a transmissão da sessão plenária pela rádio Senado – e, valendo-se de sua posição na hierarquia, foi ao plenário determinar o encerramento da sessão plenária.
O ineditismo da situação foi tal que regimentalistas do Senado afirmam não existir no regimento norma definindo se um líder de bancada, julgando-se desrespeitado em suas prerrogativas parlamentares, poderia tomar o comando da sessão com o objetivo de prorrogá-la. O ato, ainda mais da forma como foi praticado, custaria caro a Arthur Virgílio, que poderia enfrentar um processo por quebra de decoro. Mas também isso não tem normatização na Casa, segundo os mesmos regimentalistas.
Minutos depois da confusão, cerca de 20 policiais legislativos ocupavam a tribuna da imprensa de um plenário vazio. Em tom de brincadeira, um deles disse ao Congresso em Foco que “nada é inédito ao Senado”, mas que de fato aquilo nunca havia ocorrido. Para o agente, os tucanos poderiam fazer até reunião de bancada, madrugada adentro, em plenário, desde que com as portas fechadas, sem microfones, iluminação ou transmissão da TV Senado: a sessão estava formalmente encerrada.
Próximos passos
O embate desta quinta-feira enfraquece a união dos principais partidos de oposição em torno da razoabilidade da CPI da Petrobras. Ao alegar fidelidade “à praxe” de acordo entre líderes, a despeito de imposições regimentais, Heráclito afrontou três dos principais líderes do PSDB – além de Virgílio, o presidente e o ex-presidente nacional da legenda, respectivamente Sérgio Guerra (PE) e Tasso Jereissati (CE).
Na já mencionada reunião de líderes, o PSDB teria autorizado o líder do DEM, José Agripino (RN), a representar os tucanos na discussão sobre o depoimento de Gabrielli e a instalação da CPI. Em reunião a portas fechadas da Mesa Diretora, os líderes decidiram ouvir o presidente da Petrobras antes da leitura do requerimento da CPI. Foi o que Heráclito alegou para não ler o documento, assinado por 32 senadores (o número regimental mínimo é 27).
Caso tenha seu funcionamento autorizado, a CPI investigará as suspeitas de fraudes em licitações nas empresas e os supostos desvios de royalties de petróleo – entenda-se por royalty o valor pago ao detentor de marca ou patente quando seu produto, registrado (patenteado) para fins comerciais, é explorado por terceiros.
Os supostos crimes foram apontados pela Operação Águas Profundas, da Polícia Federal, que desbaratou esquema de fraudes em licitações para a reforma de plataformas de petróleo da Petrobas, maior estatal do país e uma das maiores petrolíferas do mundo. Alvaro Dias lembra que, além da PF, Ministério Público Federal (MPF) e Tribunal de Contas da União (TCU) detectaram indícios de práticas ilícitas – a ANP está incluída no pedido de investigação porque o MPF constatou irregularidades no pagamento da agência a usineiros.
Para que a CPI seja instalada, o protocolo de requerimento deve ser lido em plenário pelo presidente do Senado, José Sarney (PMDB-RN), ou pelo sucessor hierárquico imediato. Como determina o regimento interno da Casa, vale o número de assinaturas registradas até a meia-noite do dia em que for feita a leitura – horário-limite para a retirada ou inclusão de adesões.
Tragicômico
Antes de Heráclito Fortes chegar ao plenário, quem presidia a sessão era o peemedebista Mão Santa (PMDB-PI), que já estava há cerca de meia hora a dissuadir os tucanos. “Graças a Deus está chegando Heráclito Fortes”, aliviou-se Mão Santa, ao ver o colega adentrar o local.
Virgílio, Jereissati e Sérgio Guerra tentavam de todas as maneiras induzir Mão Santa à leitura do documento, sem resultado: visivelmente constrangido e titubeando nas respostas, o peemedebista mencionava o acordo firmado na reunião de líderes. Além disso, dizia o senador, “só Deus baixando retira meu nome”.