Edson Sardinha |
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A terra, segundo ele, só deve ser distribuída a quem tem experiência no meio rural. “Não adianta desfavelizar a cidade e favelizar o campo. É trocar seis por meia-dúzia.” Leia também O deputado refuta as críticas dos movimentos sociais de que a concentração de terras é um dos principais problemas do país e diz que é preciso "desideologizar" a discussão sobre a reforma agrária. “Se uma grande propriedade estiver gerando emprego e divisas, preservando o meio ambiente e produzindo para o país, não vejo por que seccioná-la”, afirma. Autor e co-autor de mais de 800 proposições no ano passado, quase todas referentes aos interesses dos produtores rurais, o presidente afirma que a prioridade da Comissão de Agricultura em 2004 é pressionar pela melhoria da infraestrutura do país, para facilitar o escoamento da produção rural. Quais são as prioridades da Comissão de Agricultura, Pecuária, Abastecimento e Desenvolvimento Rural para este ano? A grande prioridade é melhorar a infraestrutura, a logística do Brasil, a questão das estradas, das rodovias e dos portos, a energia elétrica e a armazenagem de grãos. O Brasil dobrou a produção nos últimos cinco anos, mas a infraestrutura é a mesma. É preciso que se faça investimento nessa área, porque não dá para o agricultor brasileiro continuar a ser o mais eficiente do mundo, dentro da propriedade rural, se essa eficiência é perdida nas estradas, ou melhor, pela falta delas. Se não houver mudança na política econômica e mais investimento, vamos asfixiar o agronegócio, que é o segmento que sustenta a economia do país. Se isso acontecer, o país entra em colapso. "Se não houver mudança na política econômica e mais investimento, vamos asfixiar o agronegócio, que é o segmento que sustenta a economia do país" Sob essa ótica de melhorar a infraestrutura, quais os projetos que merecem maio atenção? Projetos relacionados às vias de escoamento de safra, que são as grandes artérias que ligam as regiões produtoras aos centros consumidores, os ramais ferroviários estratégicos para o escoamento de produção e a modernização dos portos, além daqueles que prevêem maior investimento no armazenamento local da produção. Também queremos elevar a discussão sobre o seguro-agrícola, as questões referentes ao crédito agrícola, o desenvolvimento tecnológico, a pesquisa agropecuária, a reforma agrária e o apoio à agricultura familiar. O embate entre ruralistas e ambientalistas que se estendeu nas votações da Câmara durante todo o ano passado continua em 2004? Eu não caracterizaria dessa forma, mesmo porque a discussão não se restringiu aos produtores rurais. Houve um embate entre ambientalistas, movidos por ideologia ou motivações pouco claras, que se opõem a que o Brasil seja soberano e independente do ponto de vista tecnológico, e a maioria esmagadora da comunidade científica brasileira, assim como parlamentares ligados à saúde, entre os quais me incluo. São pessoas sensatas que querem que o Brasil se desenvolva, domine a biotecnologia e possa concorrer em igualdade de condições com outros países que estão investindo bilhões de dólares por ano numa área em que temos cientistas muito bem preparados e um potencial de desenvolvimento fantástico. O que fizemos na Lei de Biossegurança foi defender os interesses nacionais, e não de outras entidades ou outros países cujos interesses na maioria das vezes não coincidem com os nossos. "Houve um embate entre ambientalistas, que se opõem O governo colecionou algumas crises ao intermediar esse conflito na Esplanada dos Ministérios. O Planalto soube dosar os anseios dos Ministérios da Agricultura e do Meio Ambiente? O governo cede a pressões descabidas e a chantagens. Quem perde com isso é o país. Mas quem faz chantagem? Todos viram a chantagem feita pelo Ministério do Meio Ambiente, que alterou, desvirtuou e mutilou o projeto relatado pelo deputado e hoje ministro (Coordenação Política) Aldo Rebelo (PCdoB-SP), que era muito bom por sinal, tanto que o apoiei na íntegra. Mas ele foi desfigurado pelo deputado Renildo Calheiros (PCdoB-PE) sob a pressão do Ministério do Meio Ambiente. É bom lembrar que tivemos recentemente pressão do MST e, horas depois, o governo liberou recursos de R$ 1,7 bilhões para a reforma agrária. Não dá para confiar num governo que trabalha sob pressão. "Todos viram a chantagem feita pelo Ministério Caso os senadores façam mudanças no projeto de biossegurança, ele voltará para a Câmara. Já há alguma articulação em torno disso? Esperamos que o Senado faça as modificações devidas e nós possamos mantê-las aqui. Estamos em contato com alguns senadores, como o Juvêncio da Fonseca (PDT-MS), o Jonas Pinheiro (PFL-MT) e o Osmar Dias (PDT-PR), para tratar dessa questão. Na Câmara, já estamos articulando na Comissão de Agricultura para que possamos manter as modificações que venham a ser feitas no Senado. O MST tem intensificado suas ações este mês, batizado de “abril vermelho”. Qual o grau de preocupação dos ruralistas com esse movimento hoje? O ministro (Desenvolvimento Agrário) Miguel Rosseto está eufórico, anunciando a meta de assentar 116 mil famílias em 2004. No primeiro trimestre deste ano, o ministério assentou 11 mil famílias. Não acredito que os recursos dêem para isso nem que haja pessoal, tempo e condições para se fazer desapropriação de terra para esse tanto de gente. O grande problema é que esse tipo de anúncio gera uma expectativa nas famílias que estão acampadas à beira de estrada e cria uma demanda, porque aumenta a quantidade de acampamentos em todo o país. Depois, o governo não cumpre a meta e cria uma frustração muito grande e um clima extremamente instável no campo, um foco de tensão social altíssimo. Já avisei o ministro e o alertarei quantas vezes forem necessárias a respeito desse risco. "Esse tipo de anúncio (de que 116 mil famílias Qual caminho o governo deveria tomar? Anunciar metas realistas. Ele está estabelecendo metas inexeqüíveis. No ano passado, o governo prometeu assentar 60 mil famílias. Assentou 30 mil. Na minha opinião, as metas deveriam ser realistas e factíveis. Particularmente, o senhor é favorável à reforma agrária? Sou favorável à reforma agrária desde que ela seja feita dentro da lei, seja acompanhada de assistência técnica e inspeção das organizações dos agricultores familiares, por meio de associações, cooperativas e sindicatos que tenham a estrutura necessária, e que absorva somente as pessoas aptas para o campo. Não adianta trazer um indivíduo absolutamente desqualificado da periferia de um grande centro e colocá-lo no campo, porque ele não vai produzir nada. Portanto, o primeiro passo é fazer uma fiscalização rigorosa dos ocupantes e, em seguida, manter todo um acompanhamento. Não adianta desfavelizar a cidade e favelizar o campo. É trocar seis por meia-dúzia. Cada família assentada custa à sociedade R$ 40 mil por ano. Desse jeito, é melhor pegar o dinheiro e dar ao longo de um ou dez anos para uma família se manter na cidade. "Não adianta trazer um indivíduo absolutamente desqualificado da periferia de um grande centro e Mas o senhor reconhece que ainda há uma forte concentração de terra no Brasil? Eu não considero isso um problema. Pelo contrário, a moderna agricultura é de escala. É como se exigíssemos que as grandes indústrias fossem repartidas em pequenas. Não tem sentido econômico. A lógica econômica não é essa. Somos um país capitalista, incluído num mundo globalizado em que a eficiência econômica é que manda. Não tenho nenhum prurido ideológico de que a reforma agrária é a panacéia de todos os males. Acho que ela pode ajudar sim a resolver parte das questões sociais. Se uma grande propriedade estiver gerando emprego e divisas, preservando o meio ambiente e produzindo para o país, não vejo por que seccioná-la. Passamos do tempo de encarar a reforma agrária como uma questão ideológica. Nós temos de encará-la dentro de um projeto de desenvolvimento econômico e social. "Se uma grande propriedade estiver gerando emprego e divisas, preservando o meio ambiente e produzindo para O senhor teme pela reação dos seus colegas produtores rurais às investidas do MST este mês? O agricultor se retrai, pára de investir e muda de ramo. Quem está segurando a economia brasileira é o agronegócio. Se ele entrar em declínio, a economia do país desembesta de vez e o Brasil mergulha numa recessão profunda. O que vai acontecer se não houver o superávit de US$ 25 bilhões que a agropecuária dá ao país? Se não houver mais o crescimento de 5% do setor que contrabalançou a queda do setor de serviços, comércio e indústria para garantir um PIB de menos 0,2%. O que vai acontecer com o desemprego que grassa? Uma situação de conflito no campo pode levar a uma situação dessa. O ministro da Agricultura, Roberto Rodrigues, parece agradar mais aos ruralistas do que aos petistas. Por que isso? O ministro Roberto Rodrigues é o melhor do governo Lula. Ele conhece o setor, tem um papel fundamental no bom desempenho do setor agropecuário e está tomando medidas acertadas. Causa-me espécie ver o Ministério do Meio Ambiente ser contra as medidas do ministro Rodrigues, que são de interesse do país. Causa-me espécie ver a área econômica do governo federal não liberar os recursos necessários para a agricultura, em que pese a ação incisiva do ministro da Agricultura. "O ministro Roberto Rodrigues (da Agricultura) é o melhor do governo Lula. Se não fosse ele, a situação econômica do país estaria muito pior" A gestão dele é melhor do que a dos ministros da Agricultura do governo Fernando Henrique? Acho que ele é do nível do Francisco Turra e do Pratini de Moraes, que são meus colegas de partido (PP). Ele é muitas vezes melhor do que outros ministros do governo Lula, que não mostraram a que vieram. São 36 ministros. Tem ministro que não sabe o que está fazendo na Esplanada. O Roberto Rodrigues tem feito as coisas acontecerem. Se não fosse ele, a situação econômica do país estaria muito pior. Em que medidas ele tem acertado? Em vários pontos. O seguro-agrícola foi uma medida corretíssima. Só falta o governo entrar com a contrapartida financeira para que principalmente os pequenos agricultores sejam beneficiados. A postura do ministro em relação à biossegurança foi absolutamente correta. Ele apresentou o melhor plano-safra para o Brasil, mas a área econômica não libera o dinheiro. Foram prometidos R$ 32,5 bilhões – eu estava no Palácio do Planalto quando o presidente Lula, ao lado de Rodrigues e Rosseto, prometeu esse valor -, mas até o momento liberaram apenas R$ 21 bilhões. Olha que estamos terminando a safra. O que não dá é o ministro fazer um excelente plano-safra e os recursos serem cortados e boicotados pela equipe econômica. O senhor se referiu a ministros que não disseram a que vieram. Na sua opinião, os ministros Miguel Rosseto e José Fritsch (Secretaria Nacional da Pesca) mostraram a que vieram? Tenho visto ações extremamente tímidas e pífias, sem resultados concretos. Não compreendo o porquê da criação do Ministério da Pesca, já que o setor pesqueiro poderia continuar nas mãos do Ministério da Agricultura. Entendo a sua criação mais como uma manobra política para empregar um candidato derrotado nas eleições em Santa Catarina do que uma iniciativa para estimular o setor. Por causa disso e da falta de sensibilidade da equipe econômica prevejo um cenário muito pessimista para o país. |