ISTOÉ
“Saquei R$ 150 mil para Agnelo”
Nos últimos dias, o escândalo dos desvios de verbas de ONGs ligadas ao Ministério do Esporte, detonado pelo policial militar João Dias Ferreira, atingiu em cheio o ministro Orlando Silva e colocou em xeque a administração de nove anos do PCdoB à frente da pasta. Agora, uma nova e importante testemunha do caso pode dar outros contornos à história, ainda repleta de brechas e pontos obscuros. O que se sabia até o momento era que os comunistas, além de terem aparelhado o Ministério do Esporte, montaram um esquema de escoamento de verbas de organizações não governamentais para abastecer o caixa de campanha do partido e de seus principais integrantes.
Em depoimentos ao longo da semana, o PM João Dias acusou Orlando Silva de ser o mentor e principal beneficiário do esquema. A nova testemunha, o auxiliar administrativo Michael Alexandre Vieira da Silva, 35 anos, apresenta uma versão diferente. Em entrevista à ISTOÉ, Michael afirma que o atual governador do Distrito Federal, Agnelo Queiroz, e ex-ministro do Esporte, hoje no PT, mas que passou a maior parte de sua trajetória política no PCdoB, é quem era o verdadeiro “chefe” do esquema de desvio de recursos do Esporte. Até então, Agnelo vinha sendo poupado por João Dias.
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Michael foi a principal testemunha da Operação Shaolin, deflagrada no ano passado pela Polícia Civil do DF e na qual foram presas cinco pessoas, entre elas o próprio soldado João Dias. Seu papel nesse enredo é inquestionável. Michael trabalhou nas ONGs comandadas por João Dias, conheceu as entranhas das fraudes no Ministério do Esportes e, durante um bom tempo, esteve a serviço dos pontas-de-lança do esquema. Sobre esse período, ele fez uma revelação bombástica à ISTOÉ: “Saquei R$ 150 mil para serem entregues a Agnelo (então, ministro)”, disse ele na entrevista.
Em 2008, Michael já havia denunciado todo o esquema das ONGs no Ministério do Esporte e, desde então, passou a colaborar secretamente com os investigadores. Hoje, se mudou de Brasília e vive escondido. Os depoimentos de Michael serão cruciais para o andamento inquérito 761 sobre o envolvimento de Agnelo, que corre no STJ e deverá ser remetido ao STF pelo procurador-geral da União, Roberto Gurgel. Partícipe do esquema, Michael tem uma série de elementos para afirmar categoricamente que era Agnelo “quem chefiava o esquema”.
Durante o tempo em que trabalhou no Instituto Novo Horizonte, o auxiliar administrativo ficou sabendo de entregas de dinheiro e da liberação de convênios, por meio de Luiz Carlos de Medeiros, ongueiro e amigo do governador. “Medeiros falava demais… Sempre comentava que estava cansado de dar dinheiro para Agnelo”, diz. Sobre o ministro Orlando Silva, Michael afirma que ouviu seu nome uma única vez e por meio do delegado Giancarlos Zuliani Júnior, da Deco (Divisão Especial de Repressão ao Crime Organizado). “Contei a Giancarlos sobre a existência de um cofre num depósito de João Dias, em que havia armas e documentos que poderiam incriminar algumas pessoas. Aí ele me perguntou se eu sabia do envolvimento de Orlando Silva e da ONG Cata -Vento”, lembra.
Na entrevista à ISTOÉ, Michael revela ainda que o esquema de fraudes com ONGs de fachada transcende as fronteiras do PCdoB e do Esporte. Atingiria também, segundo ele, o Ministério da Ciência e Tecnologia, então na cota do PSB. Ele conta que chegou a ser convocado pela CPI das ONGs para falar sobre o tema, mas seu nome foi retirado da lista de depoentes na última hora sem qualquer justificativa. Sobre o envolvimento do Ministério de Ciência e Tecnologia, Michael diz que o Instituto Novo Horizonte chegou a assinar convênios com a Secretaria de Inclusão Social, subordinada à pasta, para a instalação de uma biblioteca digital em Natal, no Rio Grande do Norte, no valor de R$ 2 milhões. Esses contratos, segundo Michael Vieira, teriam sido avalizados pelo então secretário, o atual deputado distrital Joe Valle (PSB), amigo de Medeiros e definido no grupo como laranja de João Dias no comando do Instituto Novo Horizonte.
PublicidadePalhaços da política
Tiririca faz escola. O palhaço que nas eleições do ano passado foi escolhido por um em cada 16 eleitores paulistas como seu representante para a Câmara dos Deputados virou caso de marketing, tema de estudos acadêmicos e agora se transforma numa espécie de item programático para partidos de diferentes colorações. Haverá uma legião de candidatos-tiririca disputando vagas nas câmaras de vereadores do País em 2012. Na sexta-feira 7, quando foi encerrado o prazo de filiação partidária para a próxima eleição, as legendas mostraram que têm uma trupe de subcelebridades escalada para buscar um eleitor que está disposto a protestar ou que simplesmente mostra desprezo pela atividade política.
A lista começa pelo PSB. Os socialistas filiaram Tirulipa, o filho do palhaço-deputado, para concorrer a uma cadeira de vereador em Fortaleza (CE). Everton Silva, o Tirulipa, de 26 anos, chegou a ser cortejado pelo PRB e pelo PR, partido do pai, mas acabou optando pelo PSB do governador Cid Gomes. “Nos enxergam só como palhaços, mas por traz da maquiagem existe um homem, um pagador de impostos que tem o direito de se candidatar”, filosofa Tirulipa. O deputado Waldemar Costa Neto, presidente nacional do PR, que idealizou a candidatura de Tiririca, agora aposta no palhaço Bubu, que há 30 anos faz seus números pelas ruas de Mogi das Cruzes (SP), base eleitoral de Waldemar. “Palhaço é um símbolo de protesto e vou me apoiar nisso”, diz Edvaldo Hermenegildo, o Bubu.
O sonho de “ganhar a vida com a política” também motivou o humorista Charles Henriquepédia, do programa Pânico, a se inscrever no PTdoB, no Rio de Janeiro. Em São Paulo o partido arrastou a dançarina de funk Mulher-Pêra que poderá disputar a prefeitura da capital. Na mesma linha, o DEM baiano apelou para a Mulher-Maravilha, personagem incorporado pela dançarina Ciça Chagas. Ela ganhou alguma notoriedade no carnaval passado com um hit que insinuava sexo entre os super-heróis. Outro investimento dos Democratas é o anão Pepy Safado, personagem da noite baiana que se apresenta como ‘minidançarino’ de uma banda de pagode.
Para o cientista político Antônio Lavareda, especialista em comportamento eleitoral, pelo menos três fatores explicam o abuso na utilização de figuras excêntricas como puxadores de voto: o nível baixo de identificação dos eleitores com os partidos, o desgaste das lideranças políticas tradicionais e o sistema de escolha proporcional. “Isso é uma verdadeira selva para o eleitor se identificar”, avalia Lavareda.
Peixe caro
Na divisão de cargos e verbas entre a base aliada, o Ministério da Pesca e Aquicultura sempre foi da cota do PT catarinense. À exceção do atual ministro Luiz Sérgio, de Angra dos Reis (RJ), os três ministros anteriores saíram de Santa Catarina. O resultado é que o Estado acabou favorecido com recursos. Mas agora se sabe que, em alguns casos, o favorecimento ocorreu ao arrepio das boas práticas da administração pública, beirando a ilegalidade. A suspeita recai especificamente sobre a compra de 28 lanchas de patrulhamento marítimo que custaram aos cofres públicos mais de R$ 30 milhões, no maior negócio realizado pela pasta.
O Tribunal de Contas da União está concluindo um relatório que apura indícios de direcionamento de licitação, superfaturamento e desvio de recursos públicos. O processo, ainda sigiloso, está em fase de instrução na 8ª Secretaria de Controle Externo do TCU. Embora tenha aparentemente percorrido todos os caminhos traçados pela Lei 8.666 – das licitações – chamou a atenção dos auditores o fato de o contrato milionário ter sido entregue ao estaleiro Intech Boating, até então desconhecido do mercado e que foi criado em Santa Catarina apenas um ano antes da abertura do certame – um processo, aliás, praticamente sem concorrência e repleto de falhas, segundo o TCU.
É curioso também que a Intech tenha cobrado inicialmente por cada lancha R$ 1,3 milhão, enquanto pratica no mercado o preço máximo de R$ 850 mil pelo mesmo barco. O processo também contraria a lógica dos negócios com a administração pública. Normalmente, o empresário aumenta o valor porque o governo demora a pagar. Mas não foi o caso. O Ministério da Pesca iniciou a liberação dos pagamentos em março de 2009, menos de três meses após a assinatura do contrato. A primeira lancha foi entregue em julho. Após três anos, o contrato já foi quitado, mas apenas metade da encomenda foi entregue. Numa espécie de retribuição à generosidade oficial, que fez da Intech um raro ‘case’ de sucesso, o estaleiro irrigou as contas do comitê eleitoral do PT na campanha de 2010 com R$ 150 mil.
Responsável pela assinatura do contrato com a Intech, o ex-ministro Altemir Gregolin nega a troca de favores e garante que a contratação do estaleiro foi legal. “O programa das lanchas-patrulha é estratégico e seguiu rigorosamente os requisitos legais”, disse à ISTOÉ. Não é o que pensa o deputado estadual Edison Andrino (PMDB), que encaminhou em setembro um pedido de informação ao Ministério da Pesca. “Estou até agora aguardando uma resposta”, queixa-se. O parlamentar estranha também que o estaleiro tenha como sócios pessoas sem histórico no setor náutico, como o publicitário paulista José Antônio Galízio Neto e o engenheiro químico Pedro Springmann.
As desconfianças dos auditores do TCU sobre o negócio com a Intech permeiam todo o processo licitatório. O primeiro pregão, que previa a construção de um lote de cinco embarcações, aconteceu às 9h da manhã de 26 de dezembro de 2008, um dia depois do Natal. O único concorrente da Intech foi uma empresa de equipamentos industriais, a Cozil, cuja proposta foi “cadastrada de forma equivocada pela Administração”, conforme consta da ata do pregão obtida pela reportagem. Com a desclassificação imediata da Cozil, a Intech foi imediatamente homologada pela Comissão de Licitação. O contrato teve dois aditivos que ultrapassaram R$ 1,36 milhão. Vale notar ainda que o edital previa a construção de lanchas para “operação nos Estados do Pará e Maranhão”. Mas as primeiras unidades foram entregues para a Polícia Militar ambiental de Santa Catarina. A cerimônia pomposa foi devidamente capitalizada politicamente pelas lideranças petistas do Estado.
Tráfico de pessoas
Em Brasília, um bar que é ponto de prostituição serve de hotel para meninas à espera de passaportes e documentos para embarcar para o Exterior. O local é conhecido como “Toca das Gatas”. Duas viaturas policiais circulam fazendo a ronda, mas nenhum policial desce do carro. A única abordagem feita na noite em que a reportagem de ISTOÉ visitou o local teve como alvo justamente a equipe de reportagem, considerada intrusa pelos cafetões. Uma das garotas apresentou-se como “Cintia” e confirmou que estava aguardando a chegada de documentos a fim de embarcar para a Europa. Seu destino é Portugal. Mas, para pagar a viagem – documentos, passagens e hospedagens –, ela e outras meninas devem trabalhar pelo menos seis meses como prostitutas e repassar aos “chefes” 60% do que receberem. O esquema que aliciou “Cintia” no interior de Goiás se dissemina por diversos pontos do País e é mais amplo. De acordo com o Ministério Público, conta até com a participação de policiais e servidores. “Isso ocorre por dinheiro ou pela troca de favores com os bandidos. Muitas vezes, o pagamento pela facilitação vem em forma de favores sexuais”, diz a PhD em pesquisa de criminologia, a promotora do MP do Distrito Federal, Andrea Sacco.
Não é novidade que, atraídos pelo discurso do dinheiro fácil, pessoas sejam tiradas das periferias do Brasil e levadas para a Europa e os EUA e lá sejam submetidas à prostituição, trabalho escravo ou até mesmo transformadas em fornecedoras de órgãos para transplantes. Nos últimos meses, porém, o Brasil por meio de instituições como o Ministério Público e a Polícia Federal começou a reagir de forma a tentar desbaratar essas quadrilhas. O primeiro passo para isso foi um amplo levantamento sobre a forma de atuar desses traficantes e as rotas que eles estabelecem. Hoje, sabe-se que as ações dos criminosos estão concentradas em pelo menos 520 municípios brasileiros. Nessas cidades, pessoas são aliciadas e ficam em hotéis, pequenos abrigos ou pontos de prostituição, como ilustra o caso de Brasília, até receber seus passaportes, não raro, falsos, e ser mandadas para sete Estados que servem de escala para o Exterior. São eles os seguintes Estados: Amazonas, Bahia, Goiás, Minas Gerais, Rio de Janeiro, Roraima e São Paulo.
Segundo o MP, além de Portugal, os destinos mais frequentes são Espanha, Itália e Venezuela. No total, o número de pessoas levadas para o Exterior por traficantes já soma 70 mil. De acordo com a PF, as quadrilhas que comandam o tráfico de pessoas só perdem em lucratividade para as de tráfico de drogas e de armas. A ONU estima que a máfia de pessoas movimenta por ano mais de US$ 30 bilhões. Cerca de 10% desse dinheiro passa pelo Brasil. A principal dificuldade do poder público para enfrentar essas quadrilhas é a falta de um órgão dedicado exclusivamente ao tema. Outro problema, até mais grave, é o alto grau de corrupção que envolve essa modalidade de crime. “O tráfico é diretamente dependente da corrupção. No caso do Brasil, esbarramos também na falta de informações oficiais. Um país sem controle e sem números sobre um crime é um país sem ordem”, diz Sacco.
ÉPOCA
O otimismo geral da nação
Que o brasileiro esbanja otimismo sobre o futuro não é novidade. Há exatos 70 anos, o austríaco Stefan Zweig cunhou a famosa expressão “Brasil, país do futuro”, que captava a atmosfera esperançosa do país e acabou virando título de seu livro mais conhecido. Cientificamente isso também já foi comprovado. Em 2009, uma pesquisa mundial feita pelo Gallup World Poll mediu o grau de satisfação com a vida em 144 países. As pessoas precisavam responder quão felizes estavam numa escala de 0 a 10. A média 7 atribuída pelos brasileiros colocou o país na 17a posição no ranking mundial, seis posições à frente da própria colocação no ranking anterior, de 2006. Considerando o PIB per capita, que colocava o Brasil em torno do 50o lugar no mundo, esse desempenho já chamava a atenção. Quando os pesquisadores do Gallup perguntaram sobre a expectativa de felicidade para 2014, o Brasil virou campeão mundial. Com nota 8,7, apareceu em primeiro lugar na lista de 144 países. Agora, dois anos depois, uma ampla pesquisa exclusiva constatou que o otimismo brasileiro está calçado na realidade econômica, reflete a melhoria da vida no presente e – a despeito dos problemas – está em ascensão.
Para celebrar sua edição número 700 – esta que você tem em mãos –, ÉPOCA decidiu refazer a pesquisa sobre satisfação com a vida e expectativa de futuro que foi tema da capa da edição número 1 da revista, em 25 de maio de 1998. No levantamento de 13 anos atrás, ÉPOCA estreou nas bancas mostrando o retrato de uma nação moderadamente otimista, menos ufanista que seus vizinhos latinos, mas algo descrente da legitimidade da democracia. Parecia razoavelmente satisfeita com a vida, mas muito preocupada com o problema do desemprego. Falava-se naquele momento que a autoestima do brasileiro estava “saindo do fundo do poço”. O que mudou nessa sociedade, 700 edições depois, é o mote da atual pesquisa. Ela foi levada a campo pelo Instituto MCI no mês passado, com as mesmas perguntas de 1998, elaboradas então pelo centro chileno Latinobarômetro e aplicadas aqui pelos institutos Mori Brasil e Vox Populi.
Apesar de problemas crônicos como corrupção e violência, o país que emerge da consulta parece viver um momento de intensa satisfação, inédita desde a redemocratização, há pouco mais de 25 anos. Tostão, o ex-craque de futebol, hoje cronista, escreveu, dias atrás, um artigo em que captura essa sensação: “O complexo de vira-lata (que Nelson Rodrigues atribuiu aos brasileiros) continua presente. Porém, existe hoje, bastante forte, o sentimento oposto, o complexo de grandeza (…) Existe hoje uma euforia em parte da sociedade, como se o Brasil estivesse uma maravilha e muitos outros países falidos”.
A pesquisa encomendada por ÉPOCA mostra uma nação contagiada por esse “complexo de grandeza”. Há um sentimento de satisfação vários graus acima daquele constatado no fim dos anos 1990, algo que nem sempre é explicável pelas circunstâncias imediatas ou pelas ainda difíceis condições de vida da maioria. O otimismo parece fazer parte da psicologia brasileira mesmo em momentos de crise. Quando as coisas vão bem para o país, como agora, ele transborda.
Comunismo de resultados
O Brasil sempre foi o país do futebol. Na última década, tornou-se também o país do petróleo e das Olimpíadas. Nas três categorias, reina um partido que saiu da clandestinidade nos anos 1980 para se acomodar no centro do projeto petista de poder. Após a vitória de Luiz Inácio Lula da Silva nas eleições presidenciais de 2002, o PCdoB foi recompensado por ter sido a única legenda, além do PT, a apoiá-lo em todas as suas tentativas de chegar ao Palácio do Planalto. Desde 2003, lideranças comunistas comandam o Ministério do Esporte e a Agência Nacional do Petróleo (ANP), instâncias fortalecidas após a escolha do Brasil para sediar a Copa do Mundo e os Jogos Olímpicos e com a descoberta dos campos da camada pré-sal. Com o poder, veio a responsabilidade, seguida de denúncias de cobrança de propinas e desvio de recursos. Diante das mais graves suspeitas de corrupção de sua história, o PCdoB se defende em bloco e tenta não ser reduzido a um pastiche dos ideais da esquerda que sempre disse defender.
No Partido Comunista do Brasil, a regra é um por todos e todos por um. “O princípio básico da organização do PCdoB é o centralismo democrático (…) para a construção das orientações partidárias sob um único centro dirigente e no qual as decisões tomadas são válidas para todos”, diz a legenda nos documentos em que se define. Na crise que levou Orlando Silva às manchetes dos jornais devido a denúncias de desvio de dinheiro no Ministério do Esporte, seus quadros demonstram seguir à risca essa orientação. Numa mostra notável de disciplina e fidelidade, muitos foram à mídia e aos palanques para fazer a defesa enfática do ministro.
“Acompanho sua trajetória desde os 16 anos de idade, desde quando liderava a nossa juventude. O senhor já abriu seus sigilos, fiscal e telefônico. Não tem mais que falar. Se o réu tem o que dizer, vá à PF, mostre as provas”, disse a deputada Manuela D’Ávila, pré-candidata à prefeitura de Porto Alegre. “O PCdoB está consciente de que é alvo de uma farsa de forças reacionárias e anticomunistas”, afirmou Nádea Campeão, presidente do diretório paulista. “O povo conhece o trabalho do ministro Orlando Silva e respeita as vitórias que ele vem ajudando o Brasil a alcançar”, disse o deputado federal Chico Lopes (CE).
A necessidade de defender um de seus principais quadros é uma realidade nova para um partido que esteve à margem do poder ao longo da maior parte de sua história. Criada em 1962 depois de um racha no antigo Partido Comunista Brasileiro, de 1922, a legenda passou décadas na clandestinidade. Nos anos 1970, patrocinou a Guerrilha do Araguaia, no sul do Pará, onde perdeu 60 militantes. Engrossou a campanha pelas eleições diretas para a Presidência, nos anos 1980, e até hoje ostenta a foice e o martelo. Ao mesmo tempo que faz alianças com ruralistas, kassabistas e sarneyzistas, continua reverenciando Marx e Lênin. Vive, segundo a descrição encontrada em seu site, “uma das fases mais ricas” de sua história.
Aloysio Nunes Ferreira: “Político ladrão é ladrão em qualquer sistema” (trecho de entrevista)
O senador Aloysio Nunes Ferreira (PSDB-SP) é reto e direto em suas declarações. Escolhido na semana passada relator do projeto da Comissão da Verdade, ele afirma que não deve haver limites para apurar violações de direitos humanos cometidas durante o período da ditadura militar (1964-1985). Ex-militante da Ação Libertadora Nacional (ALN), Ferreira diz que a comissão deve tratar abertamente de abusos tanto dos militares como da esquerda. Nesta entrevista a ÉPOCA, Ferreira trata ainda das disputas no PSDB, da fraqueza da oposição, da criação do PSD e ataca a proposta de instituição de financiamento público nas campanhas eleitorais. “Acho hipocrisia dizer que financiamento público é o antídoto contra a corrupção”, afirma.
ÉPOCA – O senador Aécio Neves se declarou candidato à Presidência em 2014. O ex-governador José Serra disse que é cedo falar nisso. Essa disputa vai se manter até lá?
Aloysio – O fato de o senador Aécio dizer que está disposto a enfrentar a eleição é um segredo de polichinelo. Todos nós sabemos disso. E também a inconveniência de lançamento de candidaturas agora é apontada por todas as lideranças que têm um mínimo de responsabilidade com o partido como algo que deve ser evitado. Porque coloca em risco a unidade de que nós precisamos para levar adiante nossa tarefa de oposição. Acho importante começar a discutir, sim, o mecanismo de escolha do candidato. Eu sou favorável a uma prévia ampla, de que participem todos os filiados – e isso implica um trabalho de reorganização.
ÉPOCA – Por que o senhor reclamou, no Twitter, quando a seção paulista do PSDB o excluiu – e ao ex-governador José Serra – do programa de TV?
Aloysio – (Rindo) Veja bem: eu abandonei o centralismo democrático há muitos anos! Exprimi (minha opinião) publicamente porque sou assim: quando fico de saco cheio, eu estrilo (ri). Agora, eu quero dizer que não tenho nenhuma divergência de fundo com o PSDB de São Paulo. E tenho um entendimento harmonioso com o governador Geraldo Alckmin – que nada tem a ver com isso.
ÉPOCA – O PSDB é um partido desarticulado?
Aloysio – Nós temos falhas graves do ponto de vista da organização. Em alguns Estados, como Amazonas e Ceará, nossa estrutura foi aniquilada por uma campanha pessoal do Lula. No Nordeste, com exceção de Alagoas, nossa posição é grave. Não é possível que tenhamos chegado ao grau que chegamos de esvaziamento político no Rio de Janeiro. O PSDB em Santa Catarina e no Paraná tem antagonismos graves.
ÉPOCA – Qual é a situação da oposição no Senado?
Aloysio – Nós fazemos o que é possível fazer, com as forças minguadas que temos. Acontece que o Congresso não está em odor de santidade perante a opinião pública. O governo tem uma pauta legislativa paupérrima – com exceção da Comissão da Verdade. Estamos fazendo o possível para atravessar esse deserto. Nós ainda não temos um Moisés para nos guiar, mas temos alguma reserva de água (rindo).
ÉPOCA – A reforma política vai sair?
Aloysio – Não vai acontecer nada de relevante. A única mudança que teria um efeito positivo é o fim da coligação nas eleições proporcionais.
Proposta R$ 20 milhões mais cara ganha licitação do Ministério do Esporte
Desde que foi criado, no início do governo Lula, o Programa Segundo Tempo tem sido a principal fonte de problemas do Ministério do Esporte. Auditorias do Tribunal de Contas da União e da Controladoria Geral da União constataram desvios milionários de recursos repassados a Ongs. Em maio do ano passado, ÉPOCA revelou uma investigação da polícia civil de Brasília sobre entidades que receberam recursos do programa e, segundo o inquérito, usaram parte do dinheiro para pagamento de propinas a autoridades do ministério. ÉPOCA agora teve acesso a um processo de licitação dentro do Programa Segundo Tempo que pode virar um novo escândalo. Na sexta-feira passada (14), o Ministério do Esporte concluiu o pregão eletrônico 24/2011 para a compra de roupas destinadas a instrutores e a crianças e adolescentes assistidos pelo Segundo Tempo.
De acordo com os documentos, o Ministério se dispõe a pagar por camisas, camisetas e bermudas valores bem acima dos praticados na última licitação, realizada em 2009. Além disso, o Ministério privilegiou a segunda proposta mais cara entre 13 ofertas. Empresas que perderam o certame apresentaram recursos ao ministério contra o resultado do pregão. Se a compra for confirmada, o Ministério vai desembolsar R$ 80,8 milhões pelos produtos da empresa paulista Capricórnio S/A. Esse valor é R$ 20,1 milhões mais alto que a oferta mais barata.
Há outros valores que impressionam na concorrência. Pela proposta vitoriosa da empresa Capricórnio, o ministério pagará R$ 10,87 por cada uma das 120 mil camisas pólo para instrutores. Na licitação de 2009, a unidade foi adquirida por R$ 5,79, reajuste de 88%. O preço unitário das 8 milhões de camisetas para as crianças do programa sofreu um reajuste na nova concorrência de 49%. A maior variação de preço, no entanto, é na aquisição das quatro milhões de bermudas. Enquanto em 2009 a unidade custou R$ 4,36, o preço apresentado, agora, é de R$ 8,60 – ou seja, 97% mais caro.
É importante ressaltar que o ministério aumentou a encomenda em relação à licitação anterior. Comprará mais 30 mil camisas pólo, cinco milhões a mais de camisetas e três milhões a mais de bermudas. Pela lógica econômica, uma quantidade maior deveria resultar em preços unitários menores. Mas isso não ocorreu na licitação. ÉPOCA ouviu o Ministério do Esporte. Em nota, o Ministério disse que o certame só se encerra depois do julgamento dos recursos dos concorrentes que não concordaram com a decisão do pregoeiro da comissão de licitação. De acordo com o ministério, até essa decisão final não dá para considerar a empresa Capricórnio S/A como vencedora da concorrência.
O advogado com influência
Funcionário de carreira da Receita Federal por muitos anos, o advogado Marcos Vinicius Neder assumiu, no final de 2009, a Subsecretaria de Fiscalização, uma das mais importantes do órgão. Sua passagem pelo cargo gerou polêmica. Em dezembro daquele ano, Neder editou uma portaria sigilosa, contestada por auditores, que centralizava sob seu comando a fiscalização dos grandes contribuintes – até então pulverizada pelas delegacias do Fisco no país. Tal medida deu mais poder e conhecimento a Neder. Ele passou a ter uma gama maior de detalhes das relações de grandes contribuintes com o Fisco. Neder deixou oficialmente o cargo de subsecretário em 23 de dezembro, mas permaneceu nos quadros da Receita por mais um mês. Sua exoneração foi publicada no Diário Oficial em 27 de janeiro.
Pelo visto, Neder logo sentiu saudades da Receita. No dia 13 do mês passado, ele participou, na sede do Fisco em Brasília, de uma reunião na sala da Coordenação-Geral de Tributação (Cosit), o departamento por onde passam todas as mudanças na legislação promovidas pelo Fisco. Determinada pelo secretário da Receita Federal, Carlos Alberto Barreto, a reunião visava rever as regras de tributação sobre o lucro das subsidiárias de empresas brasileiras no exterior, um tema caro a gigantes da economia nacional. Com base na legislação atual, a Receita tem aplicado multas bilionárias contra grandes empresas. Elas também têm acumulado derrotas na Justiça em suas tentativas de derrubar as normas em vigor. Nada mais objetivo, portanto, que tentar resolver a questão com os conhecimentos acumulados por Neder em seus anos de Receita.
Desde o começo do ano, Neder é sócio do escritório de advocacia Trench, Rossi e Watanabe – e ele compareceu à reunião como advogado de empresas que, meses antes, fiscalizava: Vale, Odebrecht, Petrobras, BR Foods, Banco do Brasil, entre outras. Também foram à reunião representantes desses clientes. Eles – e Neder – declararam seu propósito sem constrangimento: queriam derrubar as normas tributárias sobre o lucro das subsidiárias. Participaram do encontro sete auditores da Receita, entre eles Márcio Angelim Ovídio Silva, Maria Olívia Queiroz Nery e Henrique Maluf, que embarcaram naquela manhã do aeroporto de Congonhas, em São Paulo. Os auditores não acreditavam naquilo que estava diante de seus olhos: o lobby – ou seria tráfico de influência? – institucionalizado, com a chancela do próprio secretário Barreto.
A reunião fora organizada pela coordenadora de Tributos, a também auditora da Receita Cláudia Lúcia Pimentel da Silva, a número dois na hierarquia da Cosit. Detalhe: Cláudia Lúcia é cunhada de Neder. Procurada por ÉPOCA, a Receita Federal informou que o grupo de trabalho foi criado para “desafogar” o gabinete do secretário Barreto e dar transparência no atendimento dos pleitos da iniciativa privada. Segundo a assessoria da Receita, um grupo de empresas com atividades no exterior, denominado pela sigla Giex, solicitou neste ano uma audiência com Barreto para tratar da tributação sobre o lucro das subsidiárias.
VEJA
Assessores de Orlando Silva ajudaram PM a burlar fiscalização
Depois de relatar, na semana passada, denúncias do policial João Dias Ferreira contra o ministro Orlando Silva e seus comandados, VEJA teve acesso a novas provas da maneira como a máquina do Esporte se corrompeu. São gravações de uma conversa de abril de 2008 entre João Dias e dois assessores próximos de Orlando Silva: Fábio Hansen, então chefe de gabinete da Secretaria de Esporte Educacional, que cuida do programa Segundo tempo, e Charles Rocha, então chefe de gabinete da secretaria executiva do ministério.
Foi o próprio João Dias quem registrou a conversa. Militante do PCdoB e dirigente de uma ONG, ele havia sido pego de surpresa por um ofício do Ministério do Esporte, enviado à polícia militar, responsabilizando-o por irregularidades e desvios de dinheiro num convênio de sua entidade com o programa esportivo federal Segundo Tempo. Em sua visita aos assessores de Orlando Silva, ele cobrava uma solução para o problema. E a pressão surtiu efeito imediato.
A gravação demonstra que Hansen e Rocha se esmeraram para arquitetar uma fraude que livrasse João Dias da investigação. “A gente pode mandar lá um ofício desconsiderando o que a gente mandou”, propôs Charles Rocha. E Hansen completou: “Você faz três linhas pedindo prorrogação de prazo.” Ele ainda explicou que esses pedido de prorrogação deveria ter data falsa.
Nos dias seguintes, a operação foi realizada exatamente como programado. Os dois ofícios enviados à PM – o original e o que pede que a investigação seja esquecida – foram reproduzidos pelo site de VEJA. Alvejado pelas denúncias de João Dias, o ministro Orlando Silva passou a semana se explicando. Tentou desqualificar o acusador, qualificando-o de “bandido”. A gravação obtida por VEJA mostra que figuras graúdas do ministério não pouparam esforços para beneficiar o “bandido” com uma fraude.
Em depoimento no Congresso, Orlando Silva chegou a mencionar o vai-e-vem de ofícios entre o Esporte e a polícia militar, qualificando-o como procedimento administrativo regular. Também não é isso o que transpira das gravações. Sim, é verdade que um terceiro documento, informando sobre a abertura de uma auditoria nos convênios do policial, foi enviado à PM pelo ministério. Só que um ano e meio depois da inacreditável – e reveladora – reunião entre João Dias, Hansen e Rocha.
Orlando Silva fica no Esporte. Pelo menos por enquanto
O ministro do Esporte, Orlando SIlva, permanecerá no comando da pasta. Pelo menos por enquanto. Após reunião com a presidente Dilma Rousseff, na noite desta sexta-feira, no Palácio do Planalto, o ministro comunicou à imprensa que não deixará o posto. “É inaceitável para mim conviver com qualquer tipo de suspeição. Manifestei para a presidente minha indignação, minha revolta diante desses fatos e ela me sugeriu serenidade e muita paciência, mas afirmou a confiança que tem no nosso trabalho”, disse o ministro. “Ela fez recomendações para que nós continuássemos a trabalhar, continuássemos cumprindo os compromissos e a agenda do ministério”, completou.
A reunião durou cerca de uma hora e meia. Questionado se continuaria à frente do cargo, o ministro disse que não sabia “o porquê da pergunta”, já que as acusações são somente “especulações” em sua opinião. “A presidente se mostrou absolutamente tranquila, confiante e atenta às explicações que fiz”, declarou o ministro. “Continuo confiante e seguro”.
O ministro admitiu, no entanto, que pode haver falhas nos programas comandados pelo Ministério do Esporte. “Na gestão pública aqui e acolá pode haver problemas e o papel do gestor público é corrigir todo e qualquer erro que venha a identificar”. Ele chamou o policial militar João Dias Ferreira, que o acusou de participar de um esquema de corrupção na pasta, de “caluniador”. E repetiu que não há provas contra ele. “Os caluniadores que me atacam o fazem por que combatemos os males praticados por eles”.
A situação de Orlando Silva ficou complicada depois que VEJA revelou, no sábado, que o ministro era o mentor de irregularidades na pasta e que recebeu propina na garagem do próprio ministério. Ele passou a semana negando as acusações e chamando o delator do esquema de “bandido” sem credibilidade. Foi à Câmara e ao Senado prestar depoimento. “Querem tirar ministro no grito”, reclamou na quinta-feira.
A sobrevida do comunista no comando do Ministério do Esporte pode não durar muito. A relação entre Dilma e Orlando Silva, mais um ministro herdado por ela de Luiz Inácio Lula da Silva, não é das mais tranquilas. Dilma demonstra insatisfação com o trabalho do comunista e tentava tirar dele o comando da organização da Copa do Mundo de 2014. Na visão da presidente, o ministro era próximo demais da Confederação Brasileira de Futebol (CBF).
Oposição: Dilma tem provas para demitir ministro
Depois de mais uma revelação de VEJA sobre o escândalo no Ministério dos Transportes, a oposição intensificou o coro pela saída do ministro Orlando Silva. O líder do DEM na Câmara, ACM Neto (BA), acredita que, se a presidente Dilma não exonerar o subordinado, deixará claro que é conivente com a corrupção. “Se isso não for prova, Dilma legalizará a corrupção no País. Ou toma atitudes, ou ela chancela a corrupção em seu governo. Orlando tem que sair”, opina o parlamentar.
Para Duarte Nogueira (SP), líder tucano na Câmara, a demissão do ministro já devia ter ocorrido na semana passada. E, agora, a situação se torna ainda mais grave: “A própria presidente, num ato de apoio ao PCdoB, fez ontem a manifestação de que precisava de provas. Se precisava, as provas estão aí”, afirma.
A situação do ministro pode gerar um impasse: como fez nos casos anteriores, Dilma espera que o ministro peça demissão. Mas o PCdoB não aceita. “Até agora ela não demitiu ninguém. Se o PCdoB e o Orlando Silva insistirem, não vai restar alternativa senão exonerá-lo”, afirma o líder tucano.
A oposição, que já pediu investigação sobre o ministro à Procuradorai Geral da República e cobrou satisfações de Orlando Silva quando ele esteve no Congresso, agora se prepara para a oitiva de João Dias, o policial militar que delatou o esquema. Ele vai comparecer à Comissão de Fiscalização Financeira da Câmara na semana que vem.
Deputado João Bacelar faz fortuna com emendas ao Orçamento
A tarefa de emendar o Orçamento da União transformou-se, há tempos, num meio para os parlamentares corruptos embolsarem dinheiro público. VEJA revela mais um desses casos – protagonizado pelo deputado federal João Bacelar, que cumpre o seu segundo mandato pelo PR baiano. O esquema é de uma simplicidade assustadora. Entre 2007 e 2010, João Bacelar – filho de ex-deputado federal, e típico representante do baixo clero da Câmara – teve direito a 43,5 milhões de reais em emendas. Quase metade disso foi destinado a prefeituras do semiárido baiano, onde estão seus redutos eleitorais. As prefeituras contratavam a Empresa Brasileira de Terraplanagem e Construções Ltda. (Embratec), administrada por Bacelar desde 2006. E o dinheiro ia parar no bolso do deputado.
Até novembro de 2009, a tramóia foi facilitada pela amizade com o servidor petista Marcos de Castro Lima, que ocupava a Subchefia de Assuntos Parlamentares da Secretaria de Relações Institucionais da Presidência da República. Era ele quem recebia os pedidos de deputados e senadores e estabelecia a ordem de liberação das emendas. No último empenho em favor de Bacelar, antes de deixar o cargo, Lima liberou 2,2 milhões de reais ao amigo.
Quarenta dias depois de liberar essa bolada, e vinte dias depois de deixar o governo, o “homem das emendas” – como Lima era conhecido – ganhou de Bacelar um apartamento de 143 metros quadrados, num bairro nobre de Salvador. O custo foi de 680.000 reais – e documentos obtidos por VEJA mostram que os pagamentos ficaram a cargo da Embratec.
Além do ataque ao Orçamento, Bacelar lança mão de outros expedientes para lesar os cofres públicos, como o nepotismo cruzado – emprega em seu gabinete parentes de colegas que, por sua vez, contratam os parentes dele em agradecimento -, e a contratação de funcionárias pessoais, que sequer trabalham em Brasília, como se fossem assessoras de seu gabinete. Uma dessas funcionárias é laranja do deputado em uma emissora de rádio na Bahia, como demonstra gravação a que a revista teve acesso.
Bacelar declara ter um patrimônio de 1,2 milhões de reais. É pouco para quem tem carros importados e barco, e faz uso de avião particular. Nenhuma menção à Embratec foi feita em sua declaração de bens à Justiça eleitoral. Procurado por VEJA, João Bacelar negou tudo. Em 2012, poderá dispor de mais 13 milhões de reais em emendas ao Orçamento – se o Conselho de Ética da Câmara não se mover para impedir a sangria.
Vereador e príncipe: “Levo a política como um sacerdócio”
Pela primeira vez no Nordeste, o paulista de Taubaté Rodson Lima (PP), de 48 anos, não conteve a empolgação. “Hotel cinco estrelas, com uma big de uma piscina e de frente para o mar”, publicou no facebook. Nada demais não fosse ele um vereador no exercício do quarto mandato viajando a trabalho com despesas pagas pelo povo. Fato, aliás, que ele próprio destacou: “Tudo pago com o dinheiro público! O povo me dá vida de príncipe.”
A reação foi imediata e veio na forma de uma enxurrada de xingamentos. Os internautas condenaram o exibicionismo do político. “Em momento nenhum eu quis fazer escárnio”, tentou explicar o vereador em entrevista ao site de VEJA. “O problema é que cai na besteira de falar abertamente sobre algo que todos os políticos fazem. A própria presidente Dilma acaba de voltar da África e tudo foi pago com dinheiro público.”
Rodson jura sequer ter colocado os pés na “big piscina” do hotel. Ele foi a Aracaju para participar do Encontro da Associação Brasileira das Escolas do Legislativo e de Contas. Segundo o vereador, a Câmara de Taubaté tem boas experiências na área e ele foi até lá apresenta-las. A viagem de quatro dias da comitiva de sete pessoas custará à Casa Legislativa cerca de 9 000 reais. A diária no Hotel Mercure, onde Rodson está hospedado, na Praia de Atalaia, uma das mais belas de Aracaju, não sai por menos de 158 reais. “Tenho assessor, celular, motorista, carro e escritório com ar condicionado. A política é um outro mundo, viu?”
Questionado se não acha exagero tanta regalia paga com dinheiro público enquanto falta educação e saúde para a população, Rodson filosofou: “Eu levo a política como um sacerdócio. Para pessoas como eu não é exagero ter toda essa estrutura.” O salário de um vereador em Taubaté é de 5 744,06 reais. O vereador diz ter como patrimônio nada mais que uma van, uma Zafira 2005 e uma moto. “Eu não sou rico. Moro no sítio do meu sogro. Gasto muito com advogado, sabe? Já chegue a desembolsar 25 000 reais em um só processo.”
Explique-se: Rodson foi condenado em dois processos por improbidade administrativa. Isso porque ele usou o carro da Câmara Municipal para levar pacientes de Taubaté para hospitais de São Paulo e comprou em parceria com sua secretária uma van para fazer o mesmo tipo de transporte. “Alguém precisa por a mão na massa e ajudar o povo”, justificou. Ele responde a quatorze processos na Justiça Eleitoral e está inelegível para a próxima eleição.
CARTACAPITAL
A máfia no poder (trecho de editorial – Mino Carta)
Quando adolescente, já perguntava aos meus imberbes botões por que o Brasil, país de imigração campana, calabresa e siciliana, entre outras, não conhecia o fenômeno mafioso. Desde logo, formulei uma tese sem qualquer pretensão científica, mas convincente na opinião dos botões. Não temos uma Cosa Nostra no Brasil porque eméritos mafiosos estiveram e estão no poder, líderes em atividades diversas – teoricamente legais, em condições de agir às claras e a salvo dos riscos corridos, e sofridos, por Al Capone ou Totò Riina.
Capone e Riina, e muitos outros do mesmo porte, acabaram na cadeia, aqui os equivalentes viveram e vivem à larga, ou estão soltos, quando não são nome de ruas e praças. Não faltam exemplos -recentes nas -áreas mais diversas, a começar pela política, a qual, a rigor, está em todas porque por trás de tudo. Algo espantoso se deu por ocasião do Panamericano do Rio. Previu-se um orçamento de 400 milhões, gastaram-se dez vezes mais para realizar obras hoje inúteis e entregues ao descaso. Serviços de todo gênero foram encomendados aos familiares e amigos dos organizadores da tertúlia monumental, a despeito dos nítidos conflitos de interesse. Que aconteceu com os responsáveis por tanto descalabro?
É do conhecimento do mundo mineral que quem mandou no Panamericano mandará nas Olimpíadas de 2016. Também é, quanto ao futebol, que a Fifa é um antro mafioso desde os tempos de João Havelange e que Joseph Blatter e Ricardo Teixeira são seus profetas. Desde a posse de Dilma- Rousseff na Presidência da República-, -CartaCapital permite-se chamar a atenção do governo para as péssimas consequências de um Mundial de Futebol desastrado, exposto ao risco do desmando, e várias vezes voltamos à carga no mesmo sentido.
Não nos precipitamos a endossar agora as suspeitas levantadas em relação ao ministro do Esporte, Orlando Silva, mesmo porque apressadamente veiculadas por Veja. CartaCapital jamais deixou de defender o princípio in dubio pro reo e enxerga na reportagem da semanal da Editora Abril insinuações e conjecturas em lugar de provas. Para variar. Certo é, contudo, que um ministro do Esporte chamado a lidar com Ricardo Teixeira e Joseph Blatter deve necessariamente situar-se acima de qualquer suspeita.
A presidenta, tão determinada no combate à corrupção, obviamente – sabe disso e saberá precaver-se, a bem do – País e do seu governo. CartaCapital insiste, de todo modo, em suas preocupações diante da clara presença no gramado e fora dele da máfia do futebol mundial.
O esporte não é para amadores (trecho de artigo de Matheus Pichonelli)
Primeiro foi um policial. Militar. Agora, um pastor. Ambos tentam alvejar o ministro do Esporte, Orlando Silva, ao detalharem um exemplo de “toma lá, dá cá” que a apresentadora Patrícia Poeta não soube citar em sua já histórica entrevista com a presidenta Dilma Rousseff. O desenho é simples: com a benção do governo petista, que transformou o Ministério do Esporte em feudo do PCdoB, lideranças do partido comunista usam a pasta para liberar recursos a supostos projetos sociais de entidades que, em troca, pagam pedágio para supostamente financiar a legenda. O ciclo se fecha, como tantos outros recentemente expostos.
À frente das negociações entre governo e a Fifa, entidade máxima do futebol, para os projetos da Copa do Mundo, Orlando Silva jura inocência, mas sabe que sai enfraquecido do episódio. Publicamente, a presidenta fala em presunção da inocência, mas nos bastidores tudo leva a crer que, em tempos atuais, basta mudar tudo para que tudo permaneça como está – com o perdão a Tomasi di Lampedusa, o primeiro a dar a receita. Em outras palavras: o ministro pode cair, mas o feudo continua. E bola pra frente.
Até aqui, nada parece anormal – inclusive a periodicidade de escândalos, fritura e quedas de ministro que têm marcado os dez primeiros meses do governo Dilma. Se cair, Orlando Silva será só (sic) o sexto ministro alvejado, o quinto por suspeita de corrupção. Mas algo parece didático no recente episódio. Quem deu a cara desta vez, jurando ter prova contra tudo e contra todos, não são adversários de dentro da estrutura, mas quem durante anos se beneficiou dela (embora poucos duvidem do quanto membros da Fifa, do governo e até o antecessor, o ex-comunista e hoje petista Agnelo Queiróz, tenham manifestado apreço à fritura em público do atual ministro).
Em meio a um escândalo maior (um partido supostamente agindo em benefício próprio dentro do próprio governo), alguém se perguntou que diabos um pastor e um policial fazem com tanto recurso público na mão? O comando ao qual responde o PM João Dias Ferreira sabia das atividades extra-farda de seu subordinado? E os fieis da Igreja Batista Gera Vida Internacional, sabiam que o pastor David Castro batia à porta do governo para colocar dinheiro onde bem entendesse?
Antes que os puristas liguem a patrulha, é sempre bom lembrar que, num País de dimensões continentais, a ação do Estado para amenizar as aberrações de séculos de desigualdade é, mais que justa, necessária. O uso de entidades, por meio de convênios, como braços para se alcançar áreas distantes também é compreensível. Mas de que forma, afinal, as ONGs comandadas por um policial e um pastor ajudariam a combater as disparidades sociais por meio de esportes? Quanto custava a boa vontade deles?