VEJA
Laranja da Delta movimentou R$ 9,2 milhões em três anos
Novos dados em poder da CPI do Cachoeira mostram que uma empresa de fachada usada pela construtora Delta recebeu, entre 2008 e 2010, 9,2 milhões de reais. A GM Comércio de Pneus, com sede em Goiânia, só existe no papel. As informações em poder da Comissão Parlamentar de Inquérito também revelam que de 2008 a 2010 saíram das contas da GM 13,9 milhões de reais. No mês passado, VEJA revelou como a companhia obteve da Delta, ligada ao contraventor Carlinhos Cachoeira, mais de 6 milhões de reais entre novembro de 2009 e maio de 2010.
Leia aqui no Congresso em Foco tudo sobre o caso Cachoeira
A GM pertence ao policial civil aposentado Alcino de Souza, que encaminhava os recursos a Fabio Passaglia. O empresário é ligado aos ex-governadores Íris Rezende e Maguito Vilela, as duas maiores lideranças do PMDB em Goiás. Alcino afirmou a VEJA receber 1 500 reais por mês para manter em seu nome a empresa laranja. Ele disse que sacava os valores em nome da empresa, colocava o dinheiro em malas e entregava para Passaglia.
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Fabio Passaglia também é dono da Terra Pneus e Lubrificantes, uma pequena loja em Goiânia. A movimentação financeira da companhia chama a atenção: entre 2007 e 2010, a companhia recebeu 25 milhões de reais e gastou 30 milhões – a maior parte desses valores apareceu de forma misteriosa nas contas da empresa, já que a receita bruta da Terra no período foi de mais de 12 milhões de reais.
As informações repassadas pela Receita Federal à CPI do Cachoeira são resultado de um pedido de quebra do sigilo fiscal da empresa, solicitado pelo deputado Rubens Bueno (PPS-PR). Os dados reforçam a suspeita de que a GM e a Terra eram algumas das dezenas de companhias usadas pela Delta para esconder o destino de parte dos recursos arrecadados pela construtora.
Em memorial, Dirceu culpa Delúbio e diz que mensalão era caixa dois
Na reta final para o julgamento do mais grave escândalo político do governo Lula, o ex-ministro José Dirceu apresentou um memorial para tentar convencer os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) que o mensalão não passou de um esquema de caixa dois de campanha. Em pouco mais de dez páginas, o ex-chefe da Casa Civil culpa o então tesoureiro do PT, Delúbio Soares, por arrecadar recursos não contabilizados.
“Nunca houve o chamado mensalão. O que de fato existiu foi a prática de caixa dois para cumprimento de acordo eleitoral, conduta irregular prontamente assumida por Delúbio Soares e o PT sobre a relação com partidos aliados em 2004”, diz a defesa de Dirceu. “Quem cuidou exclusivamente dos repasses para quitar as dívidas de campanhas foi a Secretaria de Finanças do PT, como confirmou o então secretário Delúbio Soares”, completa a defesa. “O governo nunca interveio e nem tinha conhecimento desse acordo financeiro-eleitoral”, resume.
No memorial, o principal réu do mensalão, apontado pela Procuradoria-Geral da República como o chefe da quadrilha, ataca o o deputado cassado Roberto Jefferson (PTB), delator do esquema, e atribui irregularidades a “desafetos” para evitar que fossem apuradas denúncias de corrupção nos Correios. Em maio de 2005, VEJA revelou um vídeo em que o então diretor dos Correios, Maurício Marinho, aparece cobrando propina para direcionar o resultado de uma licitação da estatal. O funcionário dizia agir em nome de Roberto Jefferson.
ISTOÉ
O julgamento do século
Nesta quinta-feira 2, após sete anos de expectativa, o Supremo Tribunal Federal dará início ao julgamento mais emblemático da história política do País. Durante esse tempo, o processo que apura a denúncia do esquema de compra de apoio parlamentar pelo PT ganhou volume e substância. Nas suas mais de 50 mil páginas, há centenas de relatórios de diligências feitas pela Polícia Federal e o Ministério Público, além dos depoimentos de 394 testemunhas. Os 38 réus, agora na iminência de serem sentenciados e acuados pela crescente pressão da opinião pública, demonstraram nos últimos dias que o instinto de sobrevivência já fala mais alto. Em vez do discurso afinado, quase corporativo, que adotavam no início da ação, os acusados passam a trocar acusações às vésperas do julgamento. As estratégias de defesa definitivamente mudaram. A regra que os advogados devem adotar no tribunal é a do cada um por si.
Apesar dos discursos públicos de confiança na absolvição, os principais réus do processo revelam um estado de ânimo bem diferente em conversas particulares. Há um desânimo generalizado entre eles, decorrente da sensação real de que o espaço para a impunidade está cada vez menor e que o julgamento terá, de fato, consequências. O ex-ministro José Dirceu é um exemplo notório desse pessimismo. Apontado pelo Ministério Público como o “chefe da quadrilha”, Dirceu entrou em profunda depressão, segundo colaboradores próximos e ex-colegas de governo. Ele se tornou a síntese da fragmentação petista. Em conversas com amigos e empresários, Dirceu não esconde sua apreensão. Tem o semblante cansado e mantém o olhar distante. Em nada faz lembrar o confiante ministro que ditava as ordens na antessala da Presidência da República. Dirceu acha que será condenado e até preso. Acredita que sua sentença será usada para atender aos anseios da opinião pública. “Serei um símbolo desse julgamento”, reclamou com amigos.
No decorrer do processo, o ex-ministro da Casa Civil esperava a solidariedade de parte dos réus, especialmente dos integrantes do chamado núcleo político do esquema. Sua defesa alegará que, depois de ter virado ministro, ele afastou-se da gestão do PT e, portanto, não tem responsabilidade por eventuais desvios do partido. Mas Dirceu não espera mais que esta tese seja endossada pelo ex-tesoureiro Delúbio Soares e pelo ex-presidente da legenda, José Genoíno. Ele sabe que no PT suas alegações acabaram entendidas como uma tentativa de jogar toda a culpa pela montagem e operação do esquema no colo dos colegas e ex-dirigentes do partido. Se até alguns meses atrás tudo levava a crer que os réus iam para o STF com um discurso afinado, o que se observa agora é um cenário de divergências internas que pode resultar numa guerra de versões, conforme apurou ISTOÉ em conversas com advogados, réus e ministros do Supremo.
Segundo um dos ministros do Supremo, “houve notáveis mudanças de argumentos” ao longo do processo. Em sua defesa inicial e nos depoimentos que prestou à Justiça, Delúbio chegou a bancar a tese de que a ideia de fazer caixa 2 para ajudar aliados partiu exclusivamente dele. A versão consta das alegações finais de outros réus, como Anderson Adauto, José Genoíno e do próprio José Dirceu. Mas os advogados de Delúbio concluíram, nos últimos dias, que assumir a culpa não seria a melhor saída, pois sempre se soube que dentro do próprio PT havia uma rígida hierarquia. “Ninguém tomaria uma decisão importante, como a de levantar recursos financeiros, sem autorização de cima”, diz um militante ligado a Delúbio. Para se livrar da condenação por formação de quadrilha e corrupção ativa, cuja pena máxima é de 15 anos de cadeia, o ex-tesoureiro vai argumentar que houve apenas caixa 2.
Estelionato no congresso
A troca de favores e outras práticas corporativistas arraigadas na rotina do Congresso Nacional transformaram deputados federais em alvos de estelionatários. Desde o início de julho, a Polícia Legislativa investiga uma quadrilha que se especializou em enganar parlamentares para obter dinheiro e bilhetes aéreos, fazendo-se passar por assessores ou parentes. O golpe funcionaria da seguinte maneira: o estelionatário telefona para o gabinete de um determinado deputado e diz que foi orientado a lhe pedir ajuda em nome de outro parlamentar. Para ganhar a confiança do interlocutor, o criminoso cita nomes de funcionários que trabalham com o parlamentar. Acostumados a atender pleitos de colegas, os parlamentares acham normal o teor do pedido e, quase sempre, autorizam a liberação de cotas da verba indenizatória e de passagens.
Investigações preliminares indicam que, no último mês, ao menos seis deputados fizeram transferências bancárias para contas dos golpistas. Mas ainda não há um número exato do total de vítimas, pois os próprios parlamentares se negam a admitir terem caído no golpe. Dentre os que quase foram iludidos estão os deputados Paulo Piau (PMDB-MG), Íris de Araújo (PMDB-GO), Devanir Ribeiro (PT-SP), José Nunes (PSD-BA), Vanderlei Macris (PSDB-SP) e Renan Filho (PMDB-AL), que foi o primeiro a alertar sobre a nova modalidade de crime na Câmara. Dois colegas o questionaram sobre pedidos de emissão de bilhetes aéreos feitos em seu nome.
“O bandido disse à deputada Íris de Araújo que eu havia lhe orientado a pedir dinheiro e passagem a ela para que ele pudesse ir de Goiânia a Maceió. Falei que não sabia do que se tratava. A partir daí, solicitei que fosse feito um comunicado alertando para essa prática”, conta. O pedido do deputado resultou em uma circular encaminhada pela primeira vice-presidente da Câmara, Rose de Freitas (PMDB-ES), aos gabinetes para evitar novos casos. Há um grande risco de que a Câmara vire vítima de seu próprio fisiologismo.
Os jantares políticos de Dilma
Na política, gestos falam mais que palavras. E há poucos gestos tão simbólicos quanto abrir a própria casa para receber aliados, interlocutores ou rivais. Em seu segundo ano no poder, a presidenta Dilma Rousseff dá demonstrações de que está disposta a investir na articulação política, melhorando sua relação com o Congresso, e na costura de palanques eleitorais. Marcando posição em relação ao ex-presidente Lula, ela revela um jeito próprio de negociar, lançando mão da hospitalidade em jantares informais, porém reservados, no Palácio da Alvorada, sua residência oficial. Longe dos olhos de assessores e sem a pressão da agenda diária do Palácio do Planalto, Dilma tem estreitado laços com caciques do PT e de outros partidos da base, pacificando crises às vésperas das eleições de outubro e costurando acordos para 2014.
Foi assim, por exemplo, há três semanas, quando recebeu os governadores de Pernambuco, Eduardo Campos, e do Ceará, Cid Gomes. O convite surgiu em meio às especulações de um possível rompimento do PSB com o governo. Logo que a dupla pisou no Alvorada, Dilma declarou que o objetivo do jantar era dizer que compreendia as divergências eleitorais, mas queria a base unida e o apoio de ambos. “Meu governo precisa do PSB”, disse. A conversa foi acompanhada de sopa de legumes, bacalhau e regada a um vinho da região de Petrolina (PE) – cardápio coordenado pela mãe da presidenta, Dilma Jane, e a tia Arilda.
Três horas depois, Campos e Gomes deixaram o local bem mais tranquilos e falando até em apoio a Dilma numa eventual reeleição. Uma semana antes, a presidenta havia recebido também no Alvorada o presidente do PT, Rui Falcão. A ideia era acertar os detalhes da aliança com o PMDB para lançar o ex-ministro Patrus Ananias como candidato à Prefeitura de Belo Horizonte, depois do rompimento de Márcio Lacerda com o PT. Numa atividade social pouco vista desde o início de seu governo, a presidenta também convidou para um jantar no Alvorada o presidente da Câmara, Marco Maia. Acompanhado da ministra das Relações Institucionais, Ideli Salvatti, Dilma queria de Maia o compromisso de que não seriam aprovados antes do recesso temas considerados polêmicos, principalmente que implicassem em impacto negativo no orçamento.
Os segredos de Russomanno
A filmadora foi ligada a pedido do candidato à Prefeitura de São Paulo Celso Russomanno (PRB). Já com o microfone na lapela, o ex-deputado federal não queria correr o risco de desperdiçar uma fala sequer para o seu programa eleitoral. Olhou para a iluminação em busca de erros, conferiu novamente a sala de reuniões onde há um retrato dele pintado em óleo pendurado na parede e depois perguntou ao repórter de ISTOÉ: “Vamos lá?” Com a experiência de quem popularizou o bordão “estando bem para todas as partes”, o apresentador conhece como poucos a importância da mídia. Por isso, cuida para que nada fuja do script.
Ao avaliar o seu desempenho nas pesquisas, mostra otimismo. Ancora-se nos números e na trajetória ascendente. Desde janeiro, ele cresce a cada levantamento, chegando ao empate técnico na primeira colocação com José Serra (PSDB). Conta com a preferência de 26% do eleitorado, de acordo com o Datafolha, 17 pontos à frente de Fernando Haddad (PT) e Soninha Francine (PPS). Seu desempenho confunde analistas políticos e acende o sinal de alerta nos comitês tucano e petista, que tentam entender até onde ele pode chegar. Para o apresentador, a resposta é fácil: “Chegarei ao segundo turno”, aposta.
Uma das principais estratégias de Russomanno é a municipalização da campanha. Enquanto os adversários se esforçam para associar a eleição local à nacional, Russomanno prefere discutir os temas paroquiais. Assim, acredita estar mais próximo dos paulistanos. Entre as causas abraçadas recentemente pelo candidato está o fim da restrição à distribuição de sacolas plásticas em supermercados, bandeira defendida pela população. Desde o início do ano, aborda também como uma espécie de mantra os três temas que mais preocupam os eleitores: saúde, segurança e transporte. Apesar de ele creditar tanta sintonia às suas andanças pela periferia, Russomanno se vale de sondagens diárias feitas por uma empresa especializada. “Quando analisamos o discurso dele, vemos que está colado com os anseios da população”, comenta Mauro Paulino, diretor do Datafolha.
A Ilha da Fantasia
A festa custou R$ 87 milhões, cerca de R$ 29 milhões por hora de espetáculo, dirigido pelo extravagante Danny Doyle, que ganhou um Oscar pelo filme com o sugestivo nome de “Quem Quer Ser um Milionário”. Sobre o gramado do novíssimo Estádio Olímpico de Londres, encravado no coração de um complexo de mais de R$ 20 bilhões, ele construiu uma autêntica paisagem rural britânica, e com o auxílio de mais de dez mil figurantes e até animais vivos fez surgir o que chamou de “Ilhas das Maravilhas”. Por meio delas contou a história de uma nação que, isolada por sua condição natural, promoveu revoluções que romperam seus limites e ajudaram a moldar o mundo moderno.
“Sabemos que somos uma ilha climática e de cultura”, disse Doyle dias antes de ter seu trabalho exposto a 60 mil espectadores da plateia e mais de 1,5 bilhão de pessoas através da tevê. “Por isso, independentemente da meteorologia, teremos nuvens sobre o estádio e uma delas providenciará chuva em caso de não chover de verdade”.
Assim, na sexta-feira 27, quando a rainha Elizabeth II declarou abertos, na presença de mais de 100 chefes de Estado, os 30o Jogos Olímpicos, a anfitriã Grã-Bretanha exibiu-se ao mundo como uma verdadeira Ilha da Fantasia, um arquipélago de criatividade e eficiência cercado de crise por todos os lados, como se o país da libra não sofresse com as agruras de seus vizinhos do euro, como se o vendaval dos mercados globais não tivesse feito estragos permanentes na city londrina, sede de mais de 250 grandes instituições financeiras.
ÉPOCA
Tudo sobre o mensalão – as acusações, os fatos, as provas
Sete anos, um mês e 22 dias depois, o passado está vivo. Ainda não é nem passado, como escreveu o romancista americano William Faulkner. Parece que foi ontem, parece que nunca aconteceu: o dia em que o deputado Roberto Jefferson revelou que o governo de Luiz Inácio Lula da Silva botara o Congresso no bolso. Era 6 de junho de 2005, nascia o mais grave escândalo de corrupção da história recente do Brasil. Dias depois, Jefferson afirmou diante das câmeras de televisão: “É voz corrente em cada canto desta Casa, em cada fundo de plenário, em cada banheiro, que o senhor Delúbio, tendo como pombo-correio o senhor Marcos Valério, um carequinha que é publicitário lá em Minas Gerais, repassa dinheiro a partidos que compõem a base de sustentação do governo, num negócio chamado mensalão”.
Jefferson acusou o deputado José Dirceu, então primeiro-ministro informal do governo, de comandar o esquema. Contou que advertira o presidente Lula sobre a mesada – e ele, no mínimo, nada fizera. A política brasileira, ainda se recuperando do impeachment do primeiro presidente eleito desde a ditadura militar, deparava com a possibilidade de um segundo.
O impeachment não aconteceu. Seguiram-se investigações sobre o caso em CPIs no Congresso, na Polícia Federal, na imprensa e na Procuradoria-Geral da República. Todas – todas – produziram provas e constataram que Jefferson contara, na essência, a verdade: o PT, sob a liderança de Dirceu, montara um esquema de pagamento maciço de dinheiro em troca de apoio político no Congresso. Altos representantes do Poder Legislativo se venderam a altos representantes do Poder Executivo. Não há caso que se compare em gravidade e dimensão institucional. É por isso que, a partir das 14 horas desta quinta-feira, os 11 ministros do Supremo Tribunal Federal, os mais altos representantes do Poder Judiciário, darão início ao julgamento mais importante na história da corte. Um julgamento que mostrará a maturidade da democracia brasileira – e que, sejam os réus absolvidos ou condenados, porá fim ao passado.
CARTACAPITAL
Juiz? Não, réu
Na quinta-feira 2, quando se iniciar o julgamento do chamado mensalão no Supremo Tribunal Federal, Gilmar Mendes estará com sua toga ao lado dos dez colegas da corte. Seu protagonismo nesse episódio está mais do que evidenciado. Há cerca de um mês, o ministro tornou-se o assunto principal no País ao denunciar uma suposta pressão do ex-presidente Lula para que o STF aliviasse os petistas envolvidos no escândalo, “bandidos”, segundo a definição de Mendes.
À época, imaginava-se que a maior preocupação do magistrado fosse a natureza de suas relações com o bicheiro Carlinhos Cachoeira e o ex-senador Demóstenes Torres. Mas isso é o de menos. Gilmar Mendes tem muito mais a explicar sobre as menções a seu nome no valerioduto tucano, o esquema montado pelo publicitário Marcos Valério de Souza para abastecer a campanha à reeleição de Eduardo Azeredo ao governo de Minas Gerais em 1998 e que mais tarde serviria de modelo ao PT.
O nome do ministro aparece em uma extensa lista de beneficiários do caixa 2 da campanha. Há um abismo entre a contabilidade oficial e a paralela. Azeredo, à época, declarou ter gasto 8 milhões de reais. Na documentação assinada e registrada em cartório, o valor chega a 104,3 milhões de reais. Mendes teria recebido 185 mil.