ISTOÉ
Empobrecimento explícito
Os ministros do Supremo Tribunal Federal já concluíram que sete políticos cometeram crime de lavagem de dinheiro para se beneficiar de recursos que circularam no esquema do mensalão. Numa tentativa inusual de tentar reaver o dinheiro, a Corte decidiu incluir o ressarcimento dos cofres públicos entre as penas imputadas aos 21 condenados por esse delito na ação penal 470. Dessa forma, quem lucrou com o esquema terá de devolver à União as quantias milionárias desviadas. Os condenados poderão inclusive perder seus bens. No entanto, recuperar esse dinheiro não será fácil. Pesquisa realizada pela reportagem de ISTOÉ mostra que, enquanto as investigações sobre o mensalão avançavam, acusados do crime de lavagem trataram de camuflar o próprio patrimônio.
O aparente “empobrecimento” é uma tentativa de livrar os bens de bloqueios judiciais e dos confiscos. Para reconstituir as manobras usadas pelos deputados mensaleiros para proteger imóveis e empresas, ISTOÉ cruzou dados das declarações de Imposto de Renda dos acusados desse crime, pesquisou informações de cartórios e obteve escrituras e certidões que compõem a íntegra da ação em análise pela Corte. Os documentos mostram que, nos últimos sete anos, pelo menos quatro dos condenados doaram imóveis a familiares ou transferiram propriedades e cotas de empresas para terceiros.
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A estratégia de transferir a propriedade de bens para impedir que sejam usados para ressarcir o dinheiro desviado segue o modelo de conduta do empresário Marcos Valério, condenado a 40 anos de prisão e multa de R$ 2 milhões. Mesmo com o patrimônio bloqueado pela Justiça, ele continuou comprando carros e imóveis em nome da filha de 21 anos para driblar a lei. O Ministério Público Federal chamou a atenção do Supremo sobre os riscos de ele movimentar recursos, mas não deu a devida atenção aos parlamentares envolvidos na denúncia. De acordo com um dos ministros, as transferências de propriedades feitas por alguns dos condenados poderiam ter sido evitadas com bloqueios preventivos.
Valério, o jogador
Como um jogador de pôquer, o empresário Marcos Valério parece blefar quando está prestes a perder. Sua última cartada se deu em setembro, quando já antevendo a pena que lhe seria imposta pelo Supremo Tribunal Federal, visitou o procurador-geral da República para propor acordo de delação premiada. Prometeu fornecer informações por ele próprio sonegadas nos últimos oito anos. Apresentando-se sob as vestes de “réu colaborador”, Valério teria citado o nome do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e do ex-ministro Antônio Palocci, além de mencionar novamente o assassinato de Celso Daniel, petista que administrava o município de Santo André em 2002. O depoimento segue em segredo.
Marcos Valério prometeu apresentar documentos se as autoridades avalizarem o acordo. Mas, como o jogo de Valério é conhecido, suas propostas não sensibilizaram o procurador-geral, Roberto Gurgel. O relator da Ação Penal 470, ministro Joaquim Barbosa, que já havia classificado o empresário de “jogador”, também hesita levar a sério a proposta de colaboração do agora condenado. E, na verdade, o tipo de informação que o relator procura não chegou sequer a ser oferecido.
Joaquim Barbosa confidenciou a auxiliares que a investigação da Polícia Federal ficou emperrada quando os técnicos tiveram que analisar as contas das corretoras que faziam a lavagem de dinheiro do esquema. O ministro suspeita que o mensalão tenha usado contas no Exterior que nunca foram encontradas. Com base nesse raciocínio, acredita que o montante de dinheiro que aparece na investigação é muito inferior ao que foi, de fato, movimentado.
Parabéns, Walfrido!
No próximo dia 24, o ex-ministro de Relações Institucionais do governo Lula Walfrido dos Mares Guias fará aniversário. Mais do que as sete décadas vividas ele tem a comemorar o futuro. Isso porque, assim que completar os 70 anos, Mares Guia terá a certeza de que não irá para a cadeia, caso o processo do mensalão mineiro tenha o mesmo destino do Mensalão petista em pauta no STF. Trata-se de uma prerrogativa legal aos septuagenários. Atual presidente do PSB de Minas, Mares Guia é apontado pelo Ministério Público como um dos coordenadores do esquema montado com Marcos Valério para a fracassada tentativa de reeleição do governador Eduardo Azeredo, em 1998. De acordo com a Procuradoria-Geral da República, o que foi feito em Minas serviu como embrião para o esquema montado anos depois pelo PT.
O mensalão mineiro e suas provas foram revelados por ISTOÉ em 2007. A reportagem mostrou a existência do esquema de arrecadação irregular para a campanha de Azeredo, que foi coordenada pelo ex-ministro. Segundo denúncia, recebida pelo STF, foi construída uma farsa para captar dinheiro público e canalizá-lo para a campanha do PSDB. O esquema teria movimentado mais de R$ 100 milhões e beneficiado 159 políticos de Minas.
Oportunismo sem reservas
Foi à noite: o Estado do Rio de Janeiro levou uma punhalada nas últimas horas da terça-feira 6, quando a Câmara aprovou, por 286 votos a 124, o Projeto de Lei 2.565/11, de autoria do senador Vital do Rêgo (PMDB/PB), que muda as regras da distribuição dos royalties de petróleo e, segundo a Secretaria Estadual de Desenvolvimento Econômico, acarreta perdas de R$ 77 bilhões entre 2012 e 2020 para o Rio. Em 2030, o prejuízo pode chegar a R$ 116 bilhões. Também os Estados do Espírito Santo e de São Paulo vão sangrar, porém bem menos já que o Rio responde, sozinho, por 80% da produção do País.
A ação dos deputados foi tão oportunista que ignora o artigo 20 da Constituição, parágrafo primeiro, que diz: quem produz petróleo e gás tem direito a royalties. Trata-se dos valores recebidos como compensação por danos ambientais provocados pelas empresas que exploram petróleo. Mas o projeto aprovado na Câmara inverte a lógica ao distribuir a verba também para os Estados que nada têm a ver com a extração de petróleo. Ou seja, no olhar dos deputados, quem tem prejuízos recebe menos, quem não colabora em nada, tem aumentos vertiginosos em suas receitas.
Se a presidenta Dilma Rousseff não vetar nenhum artigo da lei aprovada na calada da noite da terça-feira 6, os atuais 26% dos royalties do Rio passariam, no ano que vem, para 15% e minguados 4% em 2020. Já os municípios não produtores iriam de 1,75% para 27% em 2020. São números que explicam por que o projeto é chamado de “aberração jurídica” pelo presidente da Ordem dos Advogados do Brasil do Rio de Janeiro, Wadith Damous. “Além de ser um ato de hostilidade e de desrespeito à população do Rio, já que viola contratos já celebrados e ignora os direitos adquiridos”, disse ele. Na internet, outro movimento chamado Veta Dilma, a exemplo do que aconteceu com o Código Florestal, pede para que a presidenta não aprove. Alguns internautas se revoltam porque o projeto simplesmente não inclui aporte financeiro para a educação pública. Outros, pela perda gigantesca de recursos para os municípios fluminenses.
Aliança preservada
O PMDB vestiu seu melhor terno para jantar com Dilma Rousseff na esperança de que o encontro seria coroado com o anúncio da renovação dos votos da aliança com o PT. A expectativa era de que a chapa que venceu a disputa presidencial de 2010, com um peemedebista na vice-presidência, seria novamente ungida. Mas os convidados para o jantar de terça-feira 6 no Palácio da Alvorada saíram da residência oficial com uma mensagem diferente: o posto de vice na chapa de Dilma nas eleições de 2014 é coisa para se conquistar.
O sucesso do futuro noivado, inclusive, ainda precisa passar pelo desempenho que será conferido nos próximos dois anos na Câmara e no Senado. O PT disse que sim, cumprirá o acordo e dará ao PMDB o comando das duas casas. Mas, se os peemedebistas aproveitarem a concentração de poder no Congresso para pregar peças no governo, correm o risco de perder o posto de “noivo preferencial” como vice de Dilma. “Na construção de uma chapa para a reeleição, o atual vice tem apenas a preferência. Você tem o direito a ser noivo, não significa que vai casar”, resumiu o senador Wellington Dias (PT-PI).
Tucanos de olho no futuro
Duas semanas depois de encerrado o segundo turno das eleições municipais, os partidos de oposição parecem ainda não ter digerido o recado que veio das urnas. Maior legenda fora da base de sustentação do governo, o PSDB continua se enrolando nas próprias divergências, não consegue aglutinar o restante da oposição ao seu redor e corre o risco de perder importantes lideranças regionais diante da postura de alguns velhos caciques, como José Serra, que insistem em não ouvir as manifestações dos eleitores. “Precisamos deixar de ser uma legenda de amigos que agem como inimigos”, disse à ISTOÉ um dirigente nacional do PSDB. O caminho para que os tucanos consigam uma unidade e voltem a ser efetivamente alternativa de poder no Brasil foi apontado pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. “O momento é de mudança de gerações”, disse FHC. “Precisamos renovar nossos quadros e nossas propostas.”
Sintonizado com FHC, o senador mineiro Aécio Neves, atualmente a principal liderança nacional do partido, tem corrido o País e ajudado a promover uma série de reestruturações pontuais no PSDB. “Temos que buscar, a partir do Brasil de hoje, uma nova agenda e é a isso que vamos nos dedicar”, diz o senador mineiro. Os tucanos planejam reforçar a atuação entre jovens e mulheres, criaram um braço sindical para tentar se reaproximar dos trabalhadores e, a partir de fevereiro, farão pesquisas periódicas de imagem e uma avaliação do impacto da eleição de jovens políticos, que conseguiram algum espaço onde a influência do grupo serrista foi menor.
O que São Paulo tem a aprender com o Rio
Expandir a Operação Saturação, da Polícia Militar, para três novas áreas da Grande São Paulo foi a tentativa mais recente do governo estadual para conter a onda de violência que deixou centenas de mortos na capital nos últimos meses. O trabalho, que começou com a ocupação da favela Paraisópolis, na zona sul da cidade, conta também, desde a quarta-feira 7, com ramificações nas favelas Jardim Damasceno, na zona norte; Santa Inês, na zona leste; e São Rafael, em Guarulhos. Quase 50 pessoas já foram presas e cerca de mil policiais participam da operação, mas nada disso parece funcionar. As delegacias continuam registrando a ocorrência de homicídios, entre oito e 12 por noite, na área metropolitana.
“Com a porta já arrombada, o Estado tentou fazer alguma coisa, mas a Operação Saturação não tem objetivo definido e nem sabe o que está procurando nesses lugares, é uma continuação dessa política de segurança pública equivocada que São Paulo tem levado há alguns anos”, afirma o jurista Walter Maierovitch, presidente do Instituto Brasileiro Giovanni Falcone (de ciências criminais) e ex-secretário Nacional Antidrogas. “O Rio de Janeiro passou por isso e só começou a desarticular o crime organizado quando mudou a abordagem.” Hoje, São Paulo tem muito a aprender com a experiência fluminense.
A vitória do homem bom
O mundo respirou aliviado graças ao trabalho de gente como Natasha Williams. Negra, de classe média, 50 anos, Natasha tirou folga no departamento de polícia do condado de Orange, onde é funcionária, para lutar por Barack Obama como voluntária do Partido Democrata. Sua tarefa era a mesma de um batalhão de advogados que os democratas espalharam pelos cantos empobrecidos e populosos da Flórida, o Estado multicolorido onde, talvez, os Estados Unidos mais se pareçam com o resto do planeta. Natasha estava empenhada em garantir que eleitores, principalmente negros e hispânicos, tivessem o direito de votar. E foi desse jeito que veio a vitória.
Barack Obama acabou reeleito presidente pela força da nova base política que se impõe no país, formada por latinos, negros, mulheres e jovens com menos de 30 anos. A ameaça de um revés conservador, que o mundo inteiro temia, passou. O Partido Republicano, sempre ávido por guerras, amante da ortodoxia econômica e cada vez mais insensível aos problemas sociais, sucumbiu ao voto.
Desde as sete da manhã da terça-feira 6, Natasha Williams deu plantão na igreja adventista Bethel, num bairro pobre de Orlando. Com o celular conectado ao comitê local da campanha de Obama, ela resolvia casos como o da cozinheira Jaimie Martyn, que, embora vizinha da igreja, tinha recebido um documento mandando-a atravessar a cidade para votar em outro lugar. “Esta carta não faz sentido e eles têm que permitir que você vote aqui”, explicava Natasha enquanto escoltava Jaimie até a longa fila na porta da igreja.
ÉPOCA
Como o jogo do bicho usa escolas de samba cariocas para desviar recursos públicos e lavar dinheiro
Edson dos Santos é sócio majoritário de uma empresa com nome imponente, Alumilax Indústria e Comércio de Alumínio Ltda., voltada para fabricação e venda de metais. Basta, no entanto, localizar a casa de Edson para constatar que a pompa em torno de sua empresa se resume ao nome e ao objeto social. Edson, na verdade, é um laranja, morador da favela do Preventório, em Niterói, Rio de Janeiro. E a Alumilax não passa de uma empresa-fantasma. Edson e Alumilax são parte de um intrincado esquema montado pelo jogo do bicho para desviar recursos públicos ou lavar o dinheiro sujo que irriga o Carnaval carioca. Ou as duas coisas juntas. A reportagem de ÉPOCA teve acesso, com exclusividade, a um extenso levantamento feito pelo Ministério Público (MP) estadual do Rio de Janeiro sobre as contas das escolas de samba. Somente no Carnaval de 2010, foram identificadas 14 notas fiscais falsas, no valor total de R$ 1,25 milhão, emitidas por empresas de fachada ou já desativadas em favor das escolas de samba Mangueira, Imperatriz Leopoldinense, Mocidade Independente de Padre Miguel, União da Ilha do Governador e Viradouro. Entre esses papéis, estão quatro notas da Alumilax.
As escolas de samba do Rio de Janeiro são a engrenagem principal de uma indústria que movimenta cerca de R$ 1,5 bilhão por ano somente em gastos de turistas. A cada noite de desfile, 120 mil pessoas circulam pelo Sambódromo. Cada escola do Grupo Especial tem aproximadamente 4 mil integrantes. Para levar à avenida o “maior espetáculo da Terra”, o Carnaval do Rio incorporou vários elementos positivos do mundo dos negócios, como os patrocínios e o merchandising de empresas desejosas de associar suas marcas à folia pagã. Mas, por maior e mais caro que se torne a cada ano, o Carnaval do Rio ainda mantém práticas nefastas distantes do capitalismo benéfico que gera receita, impostos e empregos para o Rio de Janeiro e para o Brasil.
Notas fiscais falsas são comumente usadas para justificar despesas que não existiram. A mercadoria não foi vendida, o dinheiro não foi desembolsado, mas a transação foi registrada. Cria-se, assim, uma margem financeira artificial que pode ser usada para esquentar dinheiro ilícito, como os ganhos obtidos pelos donos do jogo do bicho. No caso descrito acima, seria como se os bicheiros recebessem um cheque de R$ 1,25 milhão para lavar dinheiro sujo nesse mesmo valor. O mesmo raciocínio vale para o desvio de dinheiro público. As escolas de samba simulam despesas a partir dos recursos recebidos da prefeitura, mas não desembolsam as quantias declaradas nas notas falsas. Dessa forma, podem destinar o dinheiro a outras finalidades que não o financiamento dos desfiles.
Sob a mira do crime
Uma chácara na cidade de Várzea Paulista, interior paulista. Foi esse o palco do mais violento entre os recentes confrontos envolvendo a Polícia Militar de São Paulo. No dia 11 de setembro, segundo a PM, um grupo de criminosos “julgava” no local um homem acusado de estupro. O governo paulista diz que integrantes da Rota, força de elite da polícia, foram ao local depois de receber uma denúncia sobre o tal julgamento e que foram recebidos com tiros. Nove pessoas morreram – oito que participavam do julgamento e o próprio “réu”, que fora absolvido no “tribunal do crime”. O governador Geraldo Alckmin (PSDB) declarou dias depois: “Quem não reagiu está vivo”.
A ação expôs a gravidade do atual conflito entre as forças do Estado e criminosos em São Paulo. Desde o início do ano, ao menos 90 policiais militares foram assassinados, a maioria em horário de folga. Ao mesmo tempo, aumentou de forma espantosa o número de homicídios na capital paulista, que nos últimos anos aprendera a celebrar uma constante e regular queda nos números da violência contra a vida.
O mês de outubro repetiu uma triste tendência vista em setembro: a taxa de assassinatos quase dobrou em relação ao mesmo período de 2011. Até a tarde do dia 31, foram registrados na cidade de São Paulo 145 homicídios, um crescimento de 86% em relação ao mesmo mês do ano passado (78 mortes). Em setembro, o total registrado já representara um salto de 103%: 144 mortos, contra 71 no mesmo mês de 2011. As duas marcas foram recordes desde que a contabilidade mensal começou a ser feita pelo governo de São Paulo, em janeiro do ano passado.
Carlos Marighella, um guerrilheiro de muita luta e poucas ideias
No dia 1º de julho de 1968, quatro anos depois do golpe militar no Brasil, um homem trajando terno azul-marinho invadiu uma agência bancária do bairro de Higienópolis, em São Paulo, e gritou: “Isto é um assalto. Todos de mãos para cima!”. Ele empunhava um revólver calibre 38, que não precisou disparar. Raspou os caixas para arrecadar 23 mil cruzeiros novos (R$ 124 mil em valores atuais). Mais tarde, uma testemunha disse à polícia que o assaltante era a cara do cantor Cyro Monteiro, famoso por interpretar clássicos do samba. Apesar da efervescência política daquele momento, não havia dúvidas, tratava-se de um crime comum, afirmou a polícia. Se tivessem percebido as semelhanças físicas entre o sambista e o então ex-deputado do Partido Comunista Brasileiro (PCB) Carlos Marighella, os policiais teriam, de imediato, concluído que o roubo fora mais uma “ação expropriatória”, eufemismo que os guerrilheiros criaram para denominar os assaltos realizados com o intuito de arrecadar dinheiro para a luta armada contra a ditadura militar.
A cena relatada em Marighella – O guerrilheiro que incendiou o mundo(Companhia das Letras, 732 páginas, R$ 56,50), do jornalista Mário Magalhães – ex-repórter especial e ex-ombudsman da Folha de S.Paulo –, tem o poder de sintetizar o percurso político do biografado e de muitos outros brasileiros que, sob um regime de exceção, trocaram os discursos pelas armas, pela ação. Os relatos de ação são o ponto alto da obra. Como quase todas as ideias de Marighella e de outros guerrilheiros famosos estão datadas, o livro acerta ao se concentrar no personagem e em sua história turbulenta.
A saga de Marighella não chegou à redemocratização, em 1985. Foi encerrada antes, com desfecho trágico. Um ano depois do assalto ao banco, ele foi morto pelos militares na Alameda Casa Branca, no bairro dos Jardins, em São Paulo. Caiu numa emboscada montada pelo delegado Sérgio Paranhos Fleury. Apesar de desarmado – Magalhães, depois de extensa pesquisa, conclui que ele não tinha “nem um canivete” –, Marighella resistiu à prisão e tentou levar à boca cápsulas de veneno para evitar ser preso e torturado. Não conseguiu e foi alvejado várias vezes.
O que 20 anos fizeram com Zé Dirceu? – trecho de artigo (Ruth de Aquino)
1992, texto escrito pelo deputado federal José Dirceu de Oliveira e Silva, membro da CPI de PC Farias, na orelha do livro Todos os sócios do presidente, dos jornalistas Gustavo Krieger, Luiz Antonio Novaes e Tales Faria: “A Comissão Parlamentar de Inquérito do caso Paulo César Farias pertence ao país, particularmente à juventude. Não teria sido possível sem democracia. Pela primeira vez na história do Brasil, esse sentimento de revolta contra a impunidade encontrou eco no Parlamento e cresceu até tomar conta de todo o país. A CPI só saiu do papel graças à pressão da sociedade organizada e às denúncias da imprensa, que deram sustentação à luta quase quixotesca que parlamentares travavam contra a corrupção no governo federal. A CPI revelou que o chefe da corrupção era o próprio Collor, envolvido em fatos incompatíveis com o cargo de presidente da República, recebendo vantagens econômicas ao longo de seu mandato, para si e seus familiares, através do esquema criminoso de PC. Mais grave ainda é que tudo isto foi possível porque recebeu o apoio de grande parte do empresariado brasileiro, o que revela o grau de decomposição ética das elites brasileiras, acostumadas à impunidade e ao assalto aos cofres públicos. Por tudo isso, não basta a CPI, é preciso que seu espírito tome conta do país. A verdade é que nosso povo novamente está caminhando. Está tecendo o fio da história, retomando a luta por dignidade e justiça, pela cidadania”.
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2012, texto no blog escrito pelo ex-ministro da Casa Civil José Dirceu, réu condenado no escândalo do mensalão por corrupção ativa e formação de quadrilha, obrigado a entregar seu passaporte. Dirceu foi incluído pelo STF no Sinpi (Sistema Nacional de Procurados e Impedidos): “A decisão do relator Joaquim Barbosa de apreender os passaportes é puro populismo jurídico e uma séria violação aos direitos dos réus ainda não condenados. (…) Os argumentos (de Barbosa) cerceiam a liberdade de expressão e são uma tentativa de constranger e censurar”.
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Dirceu insiste que sua condenação foi baseada em indícios, diz que nunca fez parte nem chefiou quadrilha e que “as reuniões na Casa Civil com representantes de bancos e empresários são compatíveis com a função de ministro e, em momento algum, como atestam os testemunhos, foram o fórum para discutir empréstimos”. Diz que foi condenado como mentor de um esquema financeiro apenas “por ser ministro”. E a imprensa brasileira, digna de elogios e salamaleques de Dirceu em 1992? Se, na visão do idealista Dirceu de 20 anos atrás, “a CPI só saiu do papel graças à pressão da sociedade organizada e às denúncias da imprensa”, por que hoje os jornalistas seriam os vilões da história? Por que Dirceu acusa a mídia de instigar o “clamor popular” pela condenação dos réus do mensalão? Por que Dirceu continua empenhado em defender a regulação da mídia como “uma das principais metas a ser conquistadas pelo Partido em 2013”?
VEJA
Como Erenice fez da falência um negócio milionário
A telefonia, por exigir investimentos bilionários, não é o ramo mais indicado para aventuras. Com exceções. Há pouco mais de dois anos, a revelação das atividades paralelas de Erenice Guerra resultou na derradeira crise política do governo Lula e custou-lhe a poderosa cadeira de chefe da Casa Civil. Do rosário de ilegalidades que levaram a sua demissão, a mais ousada foi a movimentação paralela para viabilizar a Unicel, pequena empresa de telecomunicações notória apenas por receber inúmeros e inexplicáveis favores do governo.
Sem capacidade financeira, sem capacidade técnica conhecida e sem experiência alguma no ramo, a Unicel conseguiu autorização para operar a telefonia celular em São Paulo – o maior e mais disputado mercado da América Latina. Em um ambiente dominado por gigantes multinacionais, seu plano tinha tudo para dar errado. E deu. A empresa não conseguiu honrar os compromissos, deu calote em clientes e fornecedores e acumulou uma dívida superior a 150 milhões de reais. Em Brasília, porém, quem tem amigos no governo pode sempre contar com uma ajuda nos momentos de desespero. A Unicel tem amigos.
Mesmo falida, ela está a ponto de fechar um grande negócio. A empresa será comprada pela Nextel, a multinacional que domina o mercado de telefonia via rádio e se prepara para iniciar operação também na telefonia celular. A transação só não foi concretizada ainda porque isso depende de autorização da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel). Os números do negócio são mantidos em segredo, mas no mercado estima-se que as cifras sejam próximas de 500 milhões de reais.
Nas economias de mercado, fusões e aquisições são negócios corriqueiros, mas a transação que envolve a Unicel e a Nextel chama especial atenção. Primeiro porque, a rigor, a Unicel não deveria ter o que vender. Sua concessão para operar só saiu por obra e graça da então ministra Erenice Guerra, que no auge do poder procurou pessoalmente conselheiros e técnicos da Anatel para defender a empresa dirigida por seu marido, José Roberto Camargo. A concessão saiu, e a Unicel entrou no mercado com o nome de fantasia AEIOU. Em pouco tempo, a AEIOU estava atolada em dívidas e, com apenas 22 000 clientes, sumiu do mapa em 2010, deixando para trás queixas amargas de consumidores e diversos processos na Justiça. A própria Anatel, a maior credora da empresa falida, publicou um comunicado no qual informava que a Unicel funcionava em “local incerto e não sabido”. Seria o fim da linha para qualquer outra empresa. Não para a Unicel.
[…]
Erenice Guerra evitou falar sobre o assunto. “Eu nunca fui consultora da Unicel”, limitou-se a dizer. Realmente, consultora ela não foi. O papel da ex-ministra na viabilização da empresa dirigida pelo marido foi bem mais preponderante do que o de uma simples consultoria.
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