O senador Roberto Requião (PMDB-PR) trocou o projeto do líder do PMDB, Renan Calheiros (AL), pela proposta enviada pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot, que tipifica o crime de abuso de autoridade. A nova versão foi apresentada pelo relator à Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) na manhã desta quarta-feira (19). As mudanças tiveram como objetivo reduzir a resistência de magistrados e integrantes do Ministério Público e de parte do Senado ao endurecimento da punição a agentes públicos. Mas, a exemplo do que havia feito em relação ao texto de Renan, o relator alterou trechos da redação sugerida por Janot. Segundo Requião, as mudanças eram necessárias para corrigir “inconsistências” relativas à chamada hermenêutica, divergências na interpretação da lei.
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Para Janot, o substitutivo anterior de Requião deixava margem para que interpretações diferentes da legislação fossem criminalizadas. O procurador-geral propôs que não configuraria abuso de autoridade “a divergência na interpretação de lei ou na avaliação de fatos e provas, desde que fundamentadas; o exercício regular das funções, pelos agentes políticos; o cumprimento regular do dever de ofício”.
O relator, porém, não aceitou a redação sugerida por Janot: “Como está redigido, o dispositivo permite que uma autoridade deliberadamente cometa o abuso de autoridade, bastando, para escapar da tipicidade, apenas fundamentar seu ato”. Para ele, esse dispositivo permite que as autoridades pratiquem crimes de abuso quando bem quiserem, sem qualquer punição, desde que fundamentem suas decisões.
Em seu relatório, o paranaense estabelece que a prática só será considerada criminosa se houver a intenção específica por parte do agente público de prejudicar o acusado ou de tirar algum tipo de vantagem. O senador disse que consultou o juiz Sérgio Moro, responsável pela Operação Lava Jato na Justiça Federal, sobre o assunto. De acordo com ele, o magistrado aprovou a nova redação.
“Penso que esta fórmula evita o chamado crime de hermenêutica, porque para a configuração do abuso de autoridade, no caso, não basta a divergência na interpretação de lei ou na avaliação de fatos e provas, sendo necessário que esteja presente o elemento subjetivo do tipo, consistente no dolo de prejudicar, beneficiar ou satisfazer-se pessoalmente”, destacou. “Espero, com isso, colocar um ponto final nesse debate, afastando de uma vez por todas as injustas ilações de que se tinha a intenção de punir magistrados e promotores”, acrescentou o senador.
As sugestões de Janot foram incorporadas em projeto apresentado pelo senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP). Outras 43 emendas foram incluídas. Requião já havia lido seu antigo parecer há duas semanas, mas a votação foi adiada para que ele analisasse as sugestões do procurador-geral da República. Em vídeo divulgado ontem, os procuradores da Lava Jato criticaram a votação da proposta, que, segundo eles, tem como objetivo atrapalhar as investigações da operação.
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