No início da noite, o vice-presidente do Senado, o petista Jorge Viana (AC), assumiu a presidência da sessão deliberativa quando Renan se ausentou do Senado para encontrar Dilma no Planalto. Depois da aprovação da PEC que impede a criação de encargos financeiros sem definição da fonte de custeio, Viana fez a leitura de plenário de uma das medidas provisórias em tramitação, procedimento que leva ao trancamento da pauta a partir de hoje (quarta, 17). Editada em 22 de setembro, a MP 692/2015 eleva a tributação, para pessoas físicas, dos ganhos relativos à movimentação de capital. Com a pauta trancada, projetos de lei e outras proposições não podem ser votados antes da medida.
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Com a iniciativa de Jorge Viana, caiu por terra o combinado ontem entre líderes de bancada – segundo o acordo, o projeto referente à alteração no modelo do pré-sal entraria em discussão logo depois da aprovação da PEC com restrições para criação de despesas. “Eu atrasei [depois do encontro com Dilma], e foi lida a medida provisória. Não fui informado. Tinha dito, na conversa que tive com vocês [imprensa], que não estávamos pensando em fazer a leitura da MP, porque ela trancaria a pauta e evitaria que deliberássemos sobre os 30% da Petrobras. Mas vou fazer um esforço para que possamos votar até o final da semana”, lamentou o senador, referindo-se ao projeto do tucano José Serra (SP) sobre a participação da petrolífera em empreendimentos nacionais.
Além do desmonte desse cronograma, Renan viu frustrados os entendimentos para a votação do que era o primeiro item da pauta – o Projeto de Lei do Senado 555/2015, que cria a Lei de Responsabilidade das Estatais e, agora, passará a ser apreciado na próxima semana. A matéria compõe a chamada Agenda Brasil, conjunto de proposições bancado por Renan – a partir do agravamento da já superada crise de relacionamento com o Planalto, no primeiro semestre de 2015 – para combater a crise econômica.
“O importante é debater e discutir temas que sejam estratégicos para o país”, havia declarado o senador alagoano, antes do encontro com a presidente, quando pediu que o governo definisse os principais itens do seu interesse. Ao final da reunião, Renan afirmou que a petista ficou satisfeita com as propostas que seu partido, o PMDB, formulou para a pauta de votações.
Busca por entendimento
Os líderes de bancadas no Senado escolheram temas de elevada complexidade. Alguns exemplos: a mudança no critério para a exploração do pré-sal; a emenda do senador José Serra que retira da Petrobras a obrigatoriedade de ser a única operadora do petróleo no regime de partilha; e o projeto que cria regras para a repatriação de capital de brasileiros que estão ilegalmente depositados no exterior – considerado importante reforço de caixa em meio à crise econômica, essa proposição foi alterada pela Câmara e, por isso, obrigatoriamente será votada mais uma vez pelos senadores. Também está na lista de prioridades para votação no Senado a emenda que prevê a redistribuição do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) entre os estados.
O esforço para limpar a pauta e mostrar serviço levou Calheiros a ir pessoalmente à liderança do PSDB para receber as prioridades dos tucanos. Entre elas estão, além da emenda que modifica o modelo de exploração do pré-sal, a definição de limite global para o montante da dívida consolidada da União; a emenda que institui normas sobre o abastecimento de água por fontes alternativas; e o projeto de lei que cria normas mais rígidas para a gestão dos fundos de pensão.
Mas, no que depender do presidente nacional do PSDB, senador Aécio Neves (MG), o governo terá problemas para emplacar pautas consideradas cruciais para a recuperação da economia, como a recriação da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF), que enfrenta resistência inclusive de integrantes da base e do próprio PT.
“Discutiremos, sim, as propostas que venham do governo, desde que venham com o apoio do PT e da base do governo”, declarou o tucano, para quem Dilma não tem condições de impor sua pauta e, por isso, deve se submeter ao diálogo no Parlamento.
“A presidente não tem, hoje, autoridade, credibilidade, pelas mentiras infinitas que lançou ao Brasil inteiro, para dialogar com as oposições. Não é aceitável que, no momento de agravamento da crise que estamos vivendo, nós termos um governo que não controla… Eu não diria nem a sua base, mas o seu próprio partido, que não apoia algumas dessas propostas. Como pode ser cobrado da oposição um apoio a algo que ela [Dilma] não consegue construir na sua própria base?”, emendou o senador.
Reforço de cofre
O PT e o PSB também apresentaram seu pacote de emendas e projetos de lei do interesse das bancadas. Na lista de suas prioridades, está a rejeição da proposta que cria mandato de quatro anos para o presidente e diretores do Banco Central; a manutenção do modelo de partilha na exploração do pré-sal; e a taxação das grandes fortunas e dos ganhos de lucros e dividendos dos investidores, entre outras propostas.
Os governistas também querem a cobrança de IPVA dos proprietários de jatinhos e embarcações de luxo. Mas tudo ainda e está no campo das negociações e, a depender do senador Lindbergh Farias (PT-RJ), que vocalizou as propostas de PT e PSB na tribuna do plenário, muita coisa vai esbarrar na falta de acordo – e, consequentemente, impor definição pelo voto.
“Eu faço uma pergunta: e agora, com o preço do barril de petróleo a US$ 28? Querem tirar a Petrobras [de empreendimentos] para quê? Para entregá-la a preço de banana para as multinacionais do petróleo? É isso! Concretamente é isso! É vender a preço de banana. Tirar a Petrobras da condição de operadora única acaba com a política de conteúdo nacional. É um grave equívoco. Esse é o primeiro projeto”, reclamou o parlamentar fluminense, referindo-se ao projeto de José Serra.
Lindbergh centrou fogo também na sugestão de independência funcional para dirigentes do Banco Central, apontada por Renan como uma das prioridades da pauta e defendida por nomes como Ricardo Ferraço (ES), com a ressalva de que a matéria deve ser discutida com cautela. Para Renan, o BC deve ter foco na política monetária, sem se submeter a interferências externas – leia-se, Palácio do Planalto. A questão está posta no Senado por meio de proposta de emenda à Constituição (PEC) sob análise na Comissão de Constituição e Justiça, para contrariedade de Lindbergh.
“Banco Central independente. Pelo amor de Deus, independente de quem? Só se for do povo e da democracia”, fustigou o petista em plenário, negando a tese de ingerência externa. “Em todo o mundo, o Banco Central tem autonomia operacional, mas não é independente – faz parte de um governo também. Então, essa tese da ingerência política é falsa. Tem muita gente que queria que, no meio de uma crise econômica como essa, que o Banco Central aumentasse a taxa de juros. Só quem ganha com isso são os banqueiros e os rentistas”, acrescentou o senador, desta vez em entrevista à imprensa.
No papel de fiador da governabilidade, Renan Calheiros reconhece que a lista de sugestões é complexa e de difícil tramitação. Mas havia insistido em colocar alguns de seus itens em votação ainda nesta quarta-feira (17), mesmo que nem todos os temas da pauta expressa estejam definidos – e sem saber que, no transcorrer dos acontecimentos em plenário, teria seus planos adiados por uma questão regimental.