Marina Barbosa
Na pauta do Senado desta quarta-feira (26), a proposta que criminaliza o abuso de autoridade cometido por juízes e membros do Ministério Público vai sofrer novas modificações antes de ser apresentada aos parlamentares. Para dirimir críticas de congressistas e magistrados, o relator do projeto, senador Rodrigo Pacheco (DEM-MG), deve reduzir o número de incisos que caracterizam o abuso de autoridade, excluindo, por exemplo, o que propõe a punição a juízes e desembargadores acusados de tomar decisões com motivação político-partidária.
A equipe técnica do senador Pacheco está fazendo ajustes no texto, que deve ser votado na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado na manhã desta quarta-feira e seguir para o plenário da Casa logo em seguida. A ideia, segundo fontes ligadas a Pacheco, é “aprimorar” o projeto para deixá-lo mais “equilibrado”. Porém, o que pode acontecer, na prática, é a apresentação de um texto desidratado no que diz respeito ao abuso de autoridade – assunto que foi incluído no Projeto de Lei nº 27/2017, inicialmente intitulado de “10 medidas de combate à corrupção”, pela Câmara dos Deputados em 2016.
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Membros da equipe do senador confirmaram ao Congresso em Foco que esse artigo deve ser alterado. Espera-se, inclusive, que o inciso que veda aos magistrados a “atuação, no exercício de sua jurisdição, com motivação político-partidária” seja retirado do parecer, como sugere emenda apresentada na semana passada pelo senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE).
Na emenda, Vieira reclama que esse inciso é “vago e aberto” e diz que o Senado não pode “incorrer no erro de estabelecer limites vagos, genéricos, e pouco claros, os quais podem, inclusive, inviabilizar o exercício regular da função pública em questão. “Afinal, o que seria motivação político-partidária? Como aferi-la?”, questionou o senador, dizendo que a medida “abre um perigoso espaço para se adentrar no campo da hermenêutica e, mais que isso, para iniciar uma perseguição a magistrados e a membros do Ministério Público, por seus posicionamentos considerados, de maneira arbitrária, como ‘político-partidários'”. “A gravidade é tamanha que o réu pode deixar de ter seu direito reconhecido em função do medo do juiz ou do promotor de responder criminalmente por incorrer
em um suposta manifestação político partidária”, finalizou Vieira.
Autor da emenda que anexou o abuso de autoridade ao projeto em 2016, o senador (à época deputado) Weverton Rocha (PDT-MA), por sua vez, já havia afirmado que a medida não representa um ataque a juízes e investigadores. “O abuso, já se está dizendo, é só para quem abusou. Então é para maus profissionais, não é para todos. E claro que nós sabemos que a maioria absoluta, em todos os Estados, cumpre bem o seu papel”, ressaltou o congressista em audiência na CCJ na semana passada.
Crime por interpretação
Também já se dá como certa a exclusão da possibilidade de existência do crime de hermenêutica, para que divergências na interpretação de lei ou na avaliação de fatos e provas não configurem, por si só, abuso de autoridade.
O relator ainda deve acatar pedidos realizados por magistrados. O principal é a supressão dos incisos que preveem a punição de juízes e promotores que procedem “de modo incompatível com a honra, dignidade e decoro de suas funções” ou são “patentemente desidiosos no cumprimento dos deveres do cargo”.
Para garantir o apoio de juízes e procuradores, Rodrigo Pacheco marcou uma nova reunião para a noite desta terça-feira (25) com representantes da magistratura, que, nessa segunda (24), voltaram a questionar o Projeto de Lei nº 27/2017.
Juízes e procuradores
Em nota conjunta (veja íntegra mais abaixo), o Conselho Nacional de Procuradores Gerais do Ministério Público dos Estados e da União (CNPG) e a Frente Associativa da Magistratura e do Ministério Público da União (Frentas) reclamaram que a aprovação do projeto “sem um maior debate com a sociedade” pode acarretar graves efeitos à atuação do Ministério Público e do Poder Judiciário.
“Ao prever crimes de abuso de autoridade praticados apenas por juízes, promotores de justiça e procuradores do Ministério Público, sujeitando-os a pena de prisão, e crimes de violação de prerrogativas de advogados, com redação aberta, genérica e passível de interpretações as mais imprecisas possíveis, temas estranhos ao combate à corrupção, o PLC 27/2017 aparenta ter a intenção de inibir a atuação destes agentes públicos”, argumentaram as entidades, que congregam mais de 40 mil juízes e membros do Ministério Público em todo o país.
Leia na íntegra a nota das associações da magistratura:
“O Conselho Nacional de Procuradores Gerais do Ministério Público dos Estados e da União (CNPG) e a Frente Associativa da Magistratura e do Ministério Público da União (Frentas), integrada pela Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho (ANPT), pela Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), pela Associação Nacional dos Membros do Ministério Público (Conamp), pela Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR), pela Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe), pela Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), pela Associação Nacional do Ministério Público Militar (ANMPM), pela Associação dos Magistrados do Distrito Federal e Territórios (Amagis-DF) e pela Associação do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (AMPDFT), entidades de âmbito nacional que congregam mais de 40.000 juízes e membros do Ministério Público em todo o país, vêm a público manifestar sua profunda preocupação com a possibilidade de votação pelo Senado Federal do Projeto de Lei nº 27/2017, originário da Câmara dos Deputados, sem um maior debate com a sociedade, notadamente pelos graves efeitos que acarretarão à atuação do Ministério Público e do Poder Judiciário.
O PLC 27/2017, conhecido popularmente como as “10 medidas de combate à corrupção”, teve alterado seu texto original para serem incluídos dispositivos que enfraquecem o próprio combate à corrupção e a muitos outros crimes e ilegalidades que são objeto da atuação do Ministério Público e do Poder Judiciário, pilares do Estado Democrático de Direito, em prejuízo à sociedade brasileira e à República. Ao prever crimes de abuso de autoridade praticados apenas por juízes, promotores de justiça e procuradores do Ministério Público, sujeitando-os a pena de prisão, e crimes de violação de prerrogativas de advogados, com redação aberta, genérica e passível de interpretações as mais imprecisas possíveis, temas estranhos ao combate à corrupção, o PLC 27/2017 aparenta ter a intenção de inibir a atuação destes agentes públicos.
Ademais, o PLC 27/2017 destrói o sistema penal acusatório, expressamente adotado pela Constituição Federal, ao transferir a titularidade da ação penal nos crimes de abuso de autoridade para instituições diversas do Ministério Público, e até para associações. Pode-se chegar ao absurdo, caso aprovado o referido projeto, de uma organização criminosa valer-se de associação para ingressar com ação penal contra membros do Ministério Público e do Poder Judiciário, como forma de perseguição a agentes públicos no cumprimento do seu dever constitucional.
O projeto de lei em questão prejudica, inclusive, a fiscalização das eleições de 2020, fragilizando o processo democrático, pois permite que membros do Ministério Público e juízes brasileiros empenhados no cumprimento da missão de garantir o respeito à soberania popular sejam injustamente processados por suposto abuso de autoridade, com exclusiva finalidade de cercear a atuação legítima das Instituições republicanas.
Finalmente, o PLC 27/2017 pretende ressuscitar a famigerada “Lei da Mordaça”, silenciando os agentes do Estado incumbidos da defesa do cidadão, de modo a ferir o direito de informação, a publicidade dos atos administrativos e a transparência exigidos em uma Democracia, constituindo-se em paradoxal retrocesso, sobretudo neste momento em que se exige maior e mais eficiente controle dos atos dos gestores públicos.
Esperamos que o Senado propicie o debate necessário, realizando audiências públicas e dialogando com os demais Poderes e instituições da República, além de setores da sociedade, para o aprimoramento da proposta em tramitação e a correção das impropriedades aqui apontadas, com vistas a assegurar a preservação da Constituição Brasileira e o amadurecimento de nossa democracia.
Nesse contexto, as entidades que abaixo subscrevem colocam-se à disposição do Senado Federal para debater o PLC 27/2017, devendo eventuais hipóteses de abuso de autoridade serem tratadas em legislação própria, sem o desvirtuamento do projeto originário de medidas de combate à corrupção.”
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