Amilcar Francisco Faria *
“A política tem sua fonte na perversidade e não na grandeza do espírito humano.” (Voltaire)
Mas se, por um lado, o espírito humano tem em si a perversidade; por outro, possui também a benevolência, a indulgência e a inteligência que a ela se contrapõe. E, se bem cultivadas, fomentadas e aplicadas, bem fácil a podem domar ou sobrepujar.
No que diz respeito à tão desejada, por necessária, reforma política (ou reforma do sistema político, dada a sua desejável abrangência estrutural), podemos classificá-la em pelo menos três tipos: a reforma possível, a reforma necessária e a reforma ideal.
A reforma possível (que mais tem parecido impossível) é a que vem se arrastando em “lombo de mula empacada”, tentada por iniciativa do próprio parlamento e sujeita a todos os óbices e dificuldades do processo legislativo ordinário e dos embates entre os parlamentares ordinários, que superam à larga os raros extraordinários.
A reforma necessária é aquela que garantiria atender minimamente a necessidade urgente da sociedade de ser, de fato e verdadeiramente, representada pelos políticos que ela elege, com transparência, integridade e compromisso.
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A reforma ideal é aquela que, por utopia, eliminaria de uma vez a possibilidade de falta de integridade dos políticos e de corrupção (inclusive a das prioridades, como ocorre ao construir um estádio fadado à ociosidade no lugar de escolas ou hospitais fadados à utilidade).
O deputado Reguffe (PDT-DF), um dos poucos que não fazem ordinariamente uma política ordinária, defende: “A reforma política deve ter como objetivo aproximar eleitores e eleitos”.
Mas se, por um lado, a reforma política precisa, como um de seus objetivos fundamentais, aproximar os representantes dos representados; por outro lado, é impossível acreditar que os representantes (políticos), por iniciativa própria, irão realizar a reforma necessária que mais aproveitará aos representados (eleitores) do que a eles próprios.
Esforçam-se eles (os políticos da velha e ordinária política), descartando a reforma ideal (por utópica), para realizar uma reforma paliativa (travestida em possível, mas nunca alcançada devido a interesses próprios quanto escusos). Reforma essa que, se em alguma medida possa aproveitar aos representados, em medida dez vezes maior aproveitará a eles próprios, os representantes (políticos por profissão que há muito venderam a vocação).
Mas a sociedade civil, sabendo que não pode contar com a classe política, por corrompida, já se organiza paralelamente ao Congresso para fazer, por iniciativa popular, uma proposta de reforma política mais abrangente, apresentando e representando os anseios da sociedade onde eles não forem atendidos pelos que deveriam representá-la (o Congresso Nacional).
Exemplo dessa organização da sociedade civil é o Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE), que é uma entidade civil organizada composta por mais de 50 outras entidades organizadas da sociedade (OAB, CNBB, Abracci, Cáritas, IFC, Amarribo, CUT, Unacon, Sindlegis, Fisenge entre outras) que, identificando a necessidade de combater a corrupção eleitoral, já conseguiu transformar em lei dois projetos de iniciativa popular, sendo uma delas a Lei 9840/1999 (Lei da Compra de Votos) e a outra a Lei Complementar 135/2010 (Lei da Ficha Limpa).
Não obstante a enorme importância da referida lei para o aprimoramento do nosso processo eleitoral, percebeu-se que ela gravita no espaço do combate aos efeitos da corrupção e não às suas causas.
Com base nessa percepção, na crença de que a causa fundamental da corrupção eleitoral está no atual sistema que permite o financiamento privado de campanha (que permite ao poder econômico influenciar o processo político), e na urgência de firmar posição quanto às necessidades da sociedade devido ao fato de estarmos às vésperas de uma possível votação de proposta de reforma política, “discutida há mais de 15 anos e travada por interesses diversos”, o MCCE capitaneou a elaboração do Manifesto Eleições Limpas: Contra o Financiamento Privado e em Defesa do Financiamento Democrático de Campanha, que será divulgado em ato público de mesmo nome em Brasília no dia 08 de abril de 2013.
Somente a partir da iniciativa popular poderemos conseguir algo próximo (quiçá além) de uma reforma necessária, porque, caso não haja nenhuma iniciativa da sociedade, não teremos sequer uma reforma política possível (talvez menos até que uma paliativa).
Não é sensato esperar que o Rei, por iniciativa própria, em ato de benevolência (ou de loucura), decrete a redução dos seus próprios poderes enquanto monarca, assim como não é sensato sequer imaginar que os “velhos” políticos venham a fazer, de per si, uma reforma política que possa favorecer os interesses e necessidades coletivos em detrimento dos seus interesses e necessidades individuais.
* É diretor de Programas de Controle Social do Instituto de Fiscalização e Controle (IFC).
Veja ainda:
Proposta de Iniciativa Popular para a Reforma do Sistema Político Brasileiro
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