No início do ano em que sofreu o impeachment, a então presidente Dilma Rousseff tentava convencer o Congresso, a opinião pública e até aliados da necessidade de aprovação da reforma da Previdência. Os princípios e objetivos da sua proposta eram idênticos aos da proposta apresentada agora pelo presidente Michel Temer.
“O Brasil vai ter que encarar a questão da Previdência. Os países desenvolvidos buscam aumentar a idade mínima para acessar a aposentadoria”, disse a presidente num tranquilo café da manhã com jornalistas no Palácio do Planalto, em 7 de janeiro de 2016.
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Em seguida, ela detalhou mais a sua proposta: “Vamos ter que encarar a reforma da Previdência. Não é possível que a idade média de aposentadoria no Brasil seja 55 anos. Para a mulher, um pouco menos. Não é possível por uma questão quantitativa. Vai ter menos gente trabalhando no futuro para sustentar mais gente sem trabalhar”.
Assim como faz Temer hoje, Dilma procurava chamar a classe política à sua responsabilidade: “Se os partidos políticos de oposição não tiverem um mínimo de compromisso com o país, estariam tendo um comportamento que coloca seus interesses eleitorais na frente dos interesses do país. É responsabilidade do governo propor. Mas a responsabilidade também é da oposição”, disse. Dilma informou, na ocasião, que o seu governo enviaria ao Congresso a proposta de recriação da CPMF, dessa vez de forma provisória. Não houve tempo.
O rombo
No dia 29 de janeiro de 2016, após reunião do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social (CDES) no Palácio do Planalto, o então ministro da Fazenda, Nelson Barbosa, reforçou a necessidade da reforma. “Temos de enfrentar o desafio do mundo todo: a sustentabilidade da Previdência Social. A evolução da população para os próximos 35 anos, que mostra a necessidade de reformar as regras para preservar a sustentabilidade do sistema, no qual a geração atual financia a aposentadoria da geração posterior”.
Ele anunciou que a proposta do governo seria enviado ao Congresso ainda no primeiro semestre daquele ano. Também não houve tempo para isso. Dilma foi afastada do cargo em maio. Barbosa disse que a reforma iria respeitar os direitos adquiridos e que haveria uma regra de transição, como fez o atual governo.
Informações divulgadas no dia anterior pela Secretaria do Tesouro Nacional mostraram o agravamento da crise nas contas do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) no ano anterior, quando foi registrado um déficit de R$ 85,8 bilhões. O rombo cresceu 50% de 2014 para 2015. Hoje, parte dos setores que se opõem à reforma contesta a tese de que há um rombo na Previdência.
Dez dias antes, o ministro havia apresentado os sete pontos que seriam atacados na reforma: demografia e idade média das aposentadorias, financiamento da Previdência Social, diferença de regras entre homens e mulheres, pensões por morte, previdência rural, regimes próprios de previdência e convergência dos sistemas previdenciários. A maioria deles está na PEC da reforma apresentada por Temer ao Congresso. O governo lembrou que a idade média de aposentadoria no Brasil era de 58 anos, enquanto nos demais países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) a média era de 64,2 anos – bem próximo da proposta encaminhada por Temer.
Mas a proposta do atual presidente traz alguns pontos radicais, como a aposentadoria integral somente após 49 anos de contribuição e idade mínima de 65 anos para homens e mulheres. Esses itens têm provocado críticas da oposição, do movimento sindical, de artistas e intelectuais consagrados e até mesmo de aliados do governo no Congresso. Por outro lado, um acordo com parlamentares permitirá que atuais deputados e senadores se aposentem pelas regras atuais da previdência dos congressistas, mesmo após a promulgação da PEC 287/2016.
No Congresso
Dilma não estava blefando. No dia 2 de fevereiro, já desgastada pelo processo de impeachment, a ex-presidente enfrentou seus acusadores frente a frente, na abertura do ano legislativo no Congresso Nacional. Reafirmou que a reforma estava em gestação e disse o motivo: “Neste momento, nos cabe enfrentar o maior desafio para a política fiscal no Brasil e, para vários países do mundo, que é a sustentabilidade da Previdência Social em um contexto de envelhecimento da população”.
Relatou, então, um quadro dramático: “No ano passado (2015), a Previdência Social e os benefícios assistenciais responderam por 44% do nosso gasto primário. Mantidas as regras atuais de aposentadoria, esse percentual tende a aumentar exponencialmente, diante do envelhecimento esperado da população brasileira. Um dado ajuda a explicitar nosso desafio: por exemplo, em 2050, teremos uma população em idade ativa similar à atual. Já a população acima de 65 anos será três vezes maior”.
Afirmou que não estava defendendo o próprio governo: “Quero ressaltar que a reforma da previdência não é uma medida em benefício do atual governo. Seu impacto fiscal será muito pequeno no curto prazo. A reforma é uma questão de Estado, pois melhorará a sustentabilidade fiscal do Brasil no médio e no longo prazos, proporcionando maior justiça entre as gerações atual e futura e, sobretudo, um horizonte de estabilidade ao País”.
Reação
Assim como ocorre em relação à proposta de Temer, houve reação no Congresso aos termos da reforma, inclusive entre integrantes da base de apoio ao governo. Em 23 de fevereiro, na sessão especial de homenagem ao aposentado no Senado, representantes de federações e associações de aposentados pediram que não fosse feita reforma na Previdência Social.
O senador Paulo Paim (PT-RS), que propôs a realização da sessão, anunciou que iria “combater duramente a reforma”. Disse que percorria os 27 estados para debater o assunto. E fez um apelo à presidente Dilma: “Então, presidenta, fica aqui o apelo desta plenária do Senado da República: revise a sua posição, não mande esse projeto de reforma da Previdência. Porque todo mundo sabe que, quando se fala em reforma, é retirada de direitos”.