O presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva (PT) disse ontem em Montevidéu (Uruguai), durante reunião de cúpula do Mercosul, que a oposição brasileira é raivosa, e que seus adversários são “golpistas”. O presidente diz que recusa as comparações com o presidente venezuelano, Hugo Chávez, mas acrescentou que a oposição brasileira age igual à venezuelana. “Eles estão agindo no Brasil como a Fedecámaras agiu na Venezuela, sem respeitar o jogo da democracia”, disse. Em abril de 2002, o presidente da Fedecámaras, Pedro Carmona Escanga, foi o principal articulador do golpe de Estado que derrubou Chávez e o levou à prisão.
As declarações de Lula contra a oposição, a qual situou majoritariamente à direita do espectro ideológico, foram complementadas por uma entrevista publicada ontem na revista Carta Capital. Na entrevista, o presidente declarou que a crise política que envolveu o PT neste ano foi “um massacre”, e que, em alguns momentos, “pouco importava a verdade para alguns setores” – outra referência a seus opositores.“Qualquer coisa que fosse contra o governo, vamos dar destaque, porque o objetivo é desgastar o governo”.
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O presidente também defendeu a política econômica adotada até agora, com novas criticas à oposição. “Essa elite (…) vendeu a idéia de que, se a economia está bem, não é por conta do governo. Então, não precisam mais do Palocci. E aí começaram a cutucar-lhe a vida”, afirmou, em referência às denúncias de corrupção envolvendo o ministro da Fazenda, Antonio Palocci, quando o mesmo era prefeito de Ribeirão Preto (SP).
Como esperado, a oposição reagiu pronta e duramente às criticas da Presidência. O líder do PSDB no Senado, Arthur Virgilio (AM), por exemplo, foi incisivo. “O presidente beira ao patético e ao ridículo. Ele está atormentado com as denúncias de corrupção. Deixou de ser o Lulinha paz e amor para ser o Lulinha de guerra, que perdeu as eleições em 89, 94 e 98”.
O senador José Agripino (PFL-RN), líder do PFL no Senado, acrescentou: “Ele se refere à oposição como sendo de direita. Onde ele se situa? E os ministros Roberto Rodrigues (Agricultura) e Luiz Fernando Furlan (Desenvolvimento)? Como eles se encaixam no governo? Lula perdeu o parafuso do centro de equilíbrio do caminhão”.
Nem mesmo partidos da base aliada do presidente pouparam suas declarações. “É uma declaração contraditória, pois o presidente vive repetindo que respeita a oposição. É uma contradição à sua própria história e à do PT, que como o PSB, fizeram oposição inconseqüente no passado. Hoje PSDB e PFL também entram um pouco nessa área da oposição irresponsável, mas não vejo nada anormal. Isso faz parte de uma democracia jovem, que está se aperfeiçoando”, comentou o líder do PSB na Câmara, Renato Casagrande (ES).
Os comentários do presidente chegaram quase ao mesmo tempo em que o ministro de Relações Institucionais, Jaques Wagner, reunia-se com o presidente do PSDB, Tasso Jereissati, e com Arthur Virgilio, em uma tentativa de reabrir o diálogo. O ataque do presidente foi o bastante para a oposição não só reagir duramente, chamando Lula até de ridículo, como também ameaçar não votar o Orçamento este ano, como pedia Wagner.
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Na entrevista à revista Carta Capital, Lula não se deteve somente sobre a crise política. Opinou também sobre a reeleição, a qual se diz contrário, e sobre o partido considerado por muitos como seu principal adversário à campanha presidencial do próximo ano. “Parece-me que tudo caminha para ser o (governador do Estado de São Paulo, Geraldo) Alckmin”, disse, quando perguntado quem seria o candidato do PSDB nas próximas eleições. Segundo o presidente, o prefeito de São Paulo (SP) e candidato derrotado às eleições de 2002, José Serra, não reúne as condições necessárias para ser o candidato do PSDB em 2006, pois “pagaria um preço enorme por abandonar São Paulo, depois de um ano e quatro meses na Prefeitura."
Nem este comentário foi deixado de lado pelos opositores. "Então, quer dizer que o presidente já escolheu o nosso candidato?", ironizou ontem o senador Álvaro Dias (PSDB-PR), em visita a Londrina (PR) com o próprio Alckmin. Já o governador de São Paulo foi mais cauteloso, e se absteve de comentar.
O presidente também disse que a América do Sul está indo para a esquerda, como constatado pelo entrevistador Mino Carta. No entanto, absteve-se de rotular como tal. “Você sabe que eu nunca gostei de me rotular de esquerda. Eu sou torneiro mecânico e cheguei à Presidência da República por obra e graça da paciência”.