Renata Camargo
Um dos coordenadores da bancada ruralista na Câmara, o deputado Luiz Carlos Heinze (PP-RS) é um crítico da legislação ambiental brasileira e também dos ambientalistas. “Esses caras estão interessados na Amazônia. Eles querem os mais de 500 milhões de hectares de mata que temos no Brasil. E querem de graça. Tem sacana vendendo o nosso país”, acusa o deputado.
Defensor do Projeto de Lei 6424/05, Heinze nega que a proposta represente uma anistia para quem desmatou uma área equivalente a 18 vezes o estado de Sergipe. “Não é anistia! É consolidar áreas que já estamos plantando”, afirma. “O Estado quer fazer o seu programa de preservação ambiental usando as propriedades privadas”, acrescenta.
Engenheiro agrônomo e produtor rural, o deputado gaúcho classifica como “paranóia” as discussões sobre o aquecimento global e diz que os ruralistas também defendem a punição para quem desmatar, mas só para quem o fizer a partir de agora. “Estamos defendendo o desmatamento zero. Mas deixa-se hoje essa parte existente, então daqui para frente nós vamos preservar.”
Leia a íntegra da entrevista com Luiz Carlos Heinze:
Congresso em Foco – Qual a sua avaliação sobre a atual legislação ambiental brasileira?
Luiz Carlos Heinze – O pesquisador Evaristo Eduardo de Miranda e sua equipe da Embrapa de Campinas fizeram um estudo que mostra que, se colocar no mapa do Brasil tudo o que a legislação ambiental exige de área de preservação, vamos ver que já estamos utilizando praticamente 50 milhões de hectares a mais do permitido por lei. Hoje a agricultura e a pecuária utilizam 260 milhões de hectares em todo o país. Segundo a pesquisa do Evaristo, nós só poderíamos usar 210 milhões de hectares. Ou seja, nós teríamos que reduzir a produção agropecuária no país. Isso é uma incoerência. Essa é a nossa preocupação com uma legislação extremamente severa. Os aspectos sociais e econômicos também têm de ser pensados. Se queremos que o Brasil seja um santuário da humanidade, o que vamos fazer com os desempregados na área rural?
O que diz o substitutivo do PL 6424?
O primeiro ponto do projeto é: se o Brasil tem hoje 260 milhões de hectares com agricultura e pastagem, o que queremos é consolidar esses 260 milhões de hectares. Esse é um dos itens do projeto. Eu consolido toda a agricultura e pecuária existente. Quem desmatou além da conta a partir de 2006 terá de fazer um processo de compensação se tiver avançado o sinal a partir daí. E consolida tudo o que foi feito até 2006. O segundo ponto é que nós queremos estadualizar essa legislação, para que estados e municípios tenham poderes. Não posso pegar o Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná, estados de agricultura intensa, e comparar com o Amapá, Pará, Amazonas, estados que não têm agricultura forte, como temos no Sul. Cada estado tem de administrar isso. Teremos parâmetros gerais para o Brasil e depois cada estado fará a sua parte. O terceiro ponto é o desmatamento zero. Estamos defendendo o desmatamento zero. Mas deixa-se hoje essa parte existente, então daqui para frente nós vamos preservar.
Essa consolidação de áreas já desmatadas é considerada por ambientalistas como uma anistia. Qual a sua avaliação?
Não é anistia! É consolidar áreas que já estamos plantando. Na década de 1960, o proprietário de terra na Amazônia, por exemplo, foi autorizado por lei a desmatar 50% de sua área. A partir da MP 2166/2001, de quando o [deputado] Zequinha Sarney [PV-MA] era ministro, isso mudou e o proprietário passou a não poder mexer em 80% da área. Foi um confisco! Reserva legal é um confisco bárbaro. Onde era zero de reserva, passou a ser 20%, ou seja, confiscaram 20% da propriedade. Onde era 20%, passou a ser 35%. E onde era 50%, passou a ser 80%. Como é que se muda a regra assim? Aqui está a tal da anistia. Isso é um crime. São terras tituladas. Não são terras do Estado. Como é que o Estado quer mandar em uma propriedade privada? O Estado quer fazer o seu programa de preservação ambiental usando as propriedades privadas. Essa é a nossa contrariedade. Queremos acertar essa parte.
O substitutivo resolve os pontos que os ruralistas querem modificar na legislação ambiental?
Sim, ele resolve boa parte. E depois vamos fazer o resto na comissão especial. Na comissão vamos tratar da infraestrutura geral do país, não é só agricultura. Neste projeto [6434] estamos focando a agricultura.
Do ponto de vista do produtor, quais as implicações da atual legislação ambiental?
Vou dar exemplos. Só no meu estado, o Rio Grande do Sul, nós temos hoje 95 mil famílias que plantam fumo. Essas pessoas plantam basicamente em áreas proibidas para o plantio, que são Áreas de Preservação Permanente (APPs). Mas faz mais de 100 anos que essas famílias plantam fumo na região, em área média de quatro hectares, ou seja, são pequenos proprietários. Se aplicar a legislação como está, 60% desses proprietários estão fora do processo. Assim como 80% dos produtores gaúchos de alho e uva (que são 25 mil famílias); 35% dos criadores de aves e porcos na região; 50% dos produtores de arroz e 20% dos produtores de soja, milho, trigo e criadores de boi. O que vou fazer com esse povo? Vou trazer todos para a cidade, para ser jornalista, deputado, taxista? Esse é o social e o econômico que alguém tem de olhar. E é o que nós estamos olhando nesse processo aqui.
Na sua avaliação, os produtores rurais têm interesse em preservar o meio ambiente?
Têm. Dizem que a agricultura está provocando o aquecimento global. Mas ninguém fala que hoje temos não sei quantos bilhões de automóveis no Brasil e que isso está poluindo. O [presidente] Lula baixou IPI [Imposto sobre Produtos Importados] para vender mais automóveis. Para a cidade pode, mas quem é do campo não pode. Associam, por exemplo, as recentes enchentes de Santa Catarina à agricultura. Certo. Pois eu te digo: em 1856, o fundador da cidade de Blumenau, o alemão Hermann Blumenau, fala de uma grande enchente ocorrida no Rio Itajaí-Açu em 1855. A casa de Hermann foi completamente destruída nessa enchente. Na época, não havia nada de agricultura na região. Inclusive, anos antes de Hermann fundar Blumenau, os índios já diziam que não queriam aquelas terras por causa das enchentes. O que ocorreu em Santa Catarina não foi consequência da agricultura. As enchentes em Santa Catarina são algo cíclico. Há um alarmismo em cima disso.
O que estaria por trás desse alarmismo?
A paranóia do aquecimento global repete a paranóia do buraco da camada de ozônio, que cinco anos disseram que não se poderia mais usar desodorante spray, por causa do CFC [clorofluorcarbono]. Trocaram o CFC pelo hidrofluorcarbono. Foram interesses comerciais. Quem está por trás disso é o Al Gore, e outros caras como ele. Esses caras estão interessados na Amazônia. Eles querem os mais de 500 milhões de hectares de mata que temos no Brasil. E querem de graça. Tem sacana vendendo o nosso país. A minha indignação como brasileiro é receber um Greenpeace da vida aqui dentro do Congresso dizendo o que a gente tem que fazer. Por que eles não dizem para os europeus que eles precisam recuperar as áreas [desmatadas]? Lá eles não fazem nada do que preconizam para nós aqui.
É possível chegar a um entendimento entre ambientalistas e ruralistas?
Não tem como. Dizem que eu quero devastar tudo. Eu não quero isso. Quero preservar o que temos e deixar a agricultura que já existe. É difícil um entendimento. Os ambientalistas são extremistas e radicais. E pode escrever aí que tem grana por trás disso. Eu não recebo nada dos produtores, porque sou brasileiro. Eu sei, por exemplo, que o [deputado] Ivan Valente [líder do Psol-SP] é como eu. Pode defender o outro lado, mas é um cara sério. Mas tem deputado safado nesse esquema que está rolando grana. Então é eles pra lá, e eu para cá. Assim não tem acerto. É difícil fazer acerto com gente que tem segundas intenções. Eu quero que o mundo rico que está poluindo, que eles paguem para a gente preservar nossas florestas. Mas é muito mais fácil pagar a mídia para dizer que o aquecimento global é um pavor. Estou preocupado com isso. Mas não quero ser trouxa. Entregar de graça o Brasil para esses caras que já são muito ricos, eu não quero.
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