No documento, o Psol critica as medidas de ajuste fiscal patrocinadas pelo governo Dilma, mas classifica o acolhimento do pedido de impeachment por Cunha na última quarta-feira (2) como “descarada retaliação”. O presidente da Casa anunciou que daria andamento ao processo de impeachment no mesmo dia em que o PT decidiu se posicionar contra o peemedebista no Conselho de Ética, onde Cunha responde por quebra de decoro parlamentar sob a acusação de ter mentido em seu depoimento à CPI da Petrobras, em março deste ano. Na ocasião, o presidente da Câmara afirmou não possuir conta no exterior. Documentos enviados ao Brasil pelo Ministério Público da Suíça provam o contrário. O Psol e a Rede Sustentabilidade foram os autores da representação contra Cunha no colegiado.
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Além disso, o peemedebista é um dos principais personagens da Operação Lava Jato no âmbito do Supremo Tribunal Federal (STF), suspeito de ter recebido propinas milionárias do esquema de corrupção descoberto pela Polícia Federal na Petrobras. “Ele [Eduardo Cunha] carece, portanto, de legitimidade, em especial para tomar decisão de tamanho impacto”, diz a nota do Psol.
O diretório do partido também argumenta que as manobras fiscais conhecidas como “pedaladas”, promovidas pelo governo Dilma, não apresentam “substância para promover destituição de quem detém mandato eletivo”. A prática das pedaladas fiscais é um dos pontos que fundamentam o pedido de impeachment apresentado pelos juristas Miguel Reale Júnior, Hélio Bicudo, Janaína Paschoal e Flávio Henrique Costa.
Por fim, o partido afirma que a destituição de Dilma levaria seu vice, Michel Temer, a assumir a Presidência da República, o que, segundo o Psol “significaria aprofundar uma ‘ponte para o futuro’ que é mera continuidade do presente, pavimentada pelos materiais do privatismo puro e duro”. A legenda faz uma referência ao documento “Uma ponte para o futuro”, apresentado no final do mês de outubro pelo PMDB, em que são propostas uma série de medidas visando a retomada do crescimento da economia brasileira.
Veja a íntegra da nota do Psol:
A crise e o impeachment
O Diretório Nacional do Partido Socialismo e Liberdade, diante dos últimos acontecimentos que agravam a crise política, considera que:
1- Os efeitos da crise econômica e política, aprofundada pelas medidas do governo federal, pesam especialmente sobre os trabalhadores e o povo, que sofrem a violência do desemprego e da perda do poder de compra dos salários, enquanto os grandes rentistas e os bancos ampliam seus lucros. Nosso modelo neoliberal periférico se aprofunda com a política de ‘ajuste’ do governo Dilma. Os governos estaduais do PSDB, PMDB, PT e outros agem na mesma direção;
2- Vivemos a mais aguda degradação do nosso sistema político, com o crescente desencanto da população em relação aos parlamentos e aos partidos, quase todos capturados pelas grandes corporações econômicas e corrompidos pelo assalto aos cofres públicos, o eleitoralismo, o clientelismo, a demagogia e a rebaixada disputa por nacos do Orçamento Público;
3- Processo de impeachment, que pode culminar no ato mais extremo da dinâmica política legal – a destituição do governante -, tem previsão constitucional (arts. 85 e 86 da CF). Mas este, decidido por Eduardo Cunha, o ilegítimo presidente da Câmara dos Deputados, construído num ambiente de chantagens mútuas e posições oportunistas de todos os grandes partidos, foi descarada retaliação. Tudo no marco de barganha que o deputado pratica permanentemente, dentro do Legislativo e fora dele. Cunha abusa de suas prerrogativas para salvar seu mandato, atingido por denúncias robustas de corrupção, lavagem de dinheiro, evasão de divisas, ocultação de bens e outros crimes. As ruas, em especial as mobilizações das mulheres e da juventude, clamam por sua cassação. Ele carece, portanto, de legitimidade, em especial para tomar decisão de tamanho impacto. O PSOL já advoga há tempos o afastamento de Cunha e não reconhece a validade de suas iniciativas;
4- O mérito da denúncia que embasaria o afastamento da presidente da República – as chamadas ‘pedaladas fiscais’ – não tem, a nosso juízo, substância para promover destituição de quem detém mandato eletivo. Governos estaduais de diversos partidos também as praticaram. As “pedaladas” são questionadas pelos que se vinculam à concepção neoliberal do ajuste fiscal contra o povo, com supressão de direitos. Para nós, no plano fiscal e orçamentário, é imperativa a auditoria da dívida e o fim do superávit primário;
5- Destituir Dilma, a cujo governo antipopular nos opomos, para colocar em seu lugar Michel Temer (PMDB), significaria aprofundar uma “ponte para o futuro” que é mera continuidade do presente, pavimentada pelos materiais do privatismo puro e duro;
6- Para nós do PSOL, as saídas da crise só virão com ampla mobilização popular em torno de reformas profundas, que instituam um novo modelo econômico, soberano, igualitário e ambientalmente sustentável. Além de um modelo político, livre do financiamento empresarial, que radicalize a democratização do país (através da qual as maiorias sociais possam se tornar as maiorias políticas), e a transparência republicana, melhor antídoto à corrupção sistêmica. Reforçamos nossa luta frontal contra Cunha e todos os corruptos, e de oposição programática e de esquerda ao governo Dilma. O PSOL não participará de manifestações que tenham como finalidade defesa do governo ou do impeachment.
Diretório Nacional do PSOL
Brasília, 4 de dezembro de 2015.