Uma reportagem veiculada alguns dias atrás me chamou a atenção e merece alguns comentários de minha parte por ter tornado pública uma novidade que pode vir a prejudicar milhares de concurseiros em todo o país. Já vejo surgir uma enorme polêmica sobre a nova prática que órgãos como universidades federais, Polícia Civil de alguns estados, Polícia Federal e prefeituras têm adotado na seleção de pessoal para seus quadros. A insatisfação que certamente se instaurará entre os concurseiros pode até desaguar em ações judiciais que darão trabalho para o Judiciário resolver. É sobre a exigência de prova de títulos em seleções para cargos de nível médio que vamos conversar hoje.
Como todo concurseiro sabe, títulos são as qualificações que o candidato obtém após a ter concluído o ensino superior. São considerados, para efeito de prova de títulos, os certificados de especialização, de mestrado, de doutorado ou de pós- doutorado. Também valem os documentos que atestem experiência de trabalho em uma dada área, como o registro de tempo de serviço público ou na iniciativa privada. Os títulos contam pontos para a classificação do candidato e podem ser decisivos na disputa pela vaga, em caso de empate nas demais etapas do concurso.
Leia também
Em nossa Constituição, o assunto é abordado no artigo 37, inserido na seção I (Disposições Gerais) do capítulo VII (Da Administração Pública), tudo reunido sob o Título III (Da Organização do Estado). Conhecer esse dispositivo é fundamental para quem almeja alcançar um cargo público pela democrática via do concurso de provas ou de provas e títulos. O caput elenca os princípios que regem a administração pública direta e indireta dos poderes da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios. Todo concurseiro tem de sabê-los de cor e salteado: legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência, além dos explicitados nos incisos do artigo, entre outros o de número II: “a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração;”.
O inciso III define o prazo de validade do concurso – até dois anos, prazo prorrogável, uma vez, por igual período –, e o IV garante a prioridade dos aprovados sobre novos concursados na convocação para assumir os cargos durante o prazo de validade estabelecido no edital.
Vejamos, agora, o que diz a lei 8.112/1990, que institui o regime jurídico único dos servidores públicos civis da União, das autarquias (inclusive especiais) e das fundações públicas federais. Em tempo: também é obrigatório para o concurseiro estudar e aprender tudo sobre essa lei, que cai mais em prova de concurso público do que manga madura em dia de chuva.
Está lá, no artigo 11: “O concurso será de provas ou de provas e títulos, podendo ser realizado em duas etapas, conforme dispuserem a lei e o regulamento do respectivo plano de carreira, condicionada a inscrição do candidato ao pagamento do valor fixado no edital, quando indispensável ao seu custeio, e ressalvadas as hipóteses de isenção nele expressamente previstas”.
Reparou como a Constituição é clara em relação às provas de títulos em concursos públicos? No texto constitucional, o princípio que norteia a exigência dos títulos é a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei. Nesse contexto, é bastante razoável exigir títulos para as carreiras estratégicas de Estado; ainda assim, desde que o total de pontos atribuídos a eles não seja superior a 20% do escore máximo das provas de conhecimentos e de cultura geral. A meu ver, nesse caso, o objetivo expresso na Constituição seria atendido, dada a óbvia complexidade de cargo a ser preenchido por candidato com formação universitária.
Já em relação à exigência de títulos para preenchimento de cargos de nível médio, discordo do que pensam colegas ouvidos na reportagem que motivou este artigo. Mantenho essa opinião mesmo diante da alegação de que os títulos teriam de ser compatíveis com as exigências do cargo e limitados ao nível médio de ensino. Quem se mune desse argumento defende que sejam exigidos títulos que comprovem, por exemplo, experiência ou atualização na área de atuação do cargo pleiteado e aprovação em concursos de natureza similar. Também não me convence a alegação de que se trataria de fase exclusivamente classificatória, de sorte que a exigência de titulação do candidato não seria contraditória em relação à natureza do cargo de nível médio.
Há notícia de uma seleção para cargo de nível médio em que a exigência não será de títulos acadêmicos, mas de comprovação de experiência em cargos similares ao em disputa. O tempo de experiência registrado na Carteira de Trabalho garantirá ao candidato pontos no mesmo modelo da prova de títulos. Defensores dessa novidade dizem que, embora o conceito das provas de títulos em concursos de nível superior e em concursos de nível médio seja diferente, em ambos os casos essas seriam aplicadas com o intuito de valorizar o conhecimento e a experiência na atividade do cargo, sem, contudo, que candidatos fossem desclassificados por não terem como comprovar tais habilitações. Assim, o objetivo dessa fase do concurso, qualquer que seja a escolaridade exigida, seria tão somente selecionar a “nata” entre os candidatos.
Essas ponderações também não me convencem. Considero que, em concursos para cargo de nível médio, a exigência de títulos, seja da modalidade que for, é desarrazoada e desproporcional. Serve somente para afastar talentos com formação exclusivamente de nível médio, ao mesmo tempo que cria uma categoria de profissionais de formação superior desmotivados, que executam tarefas administrativas de natureza menos complexa, como tipicamente são as atribuições de cargos de nível médio.
Na minha opinião, esses editais que preveem prova de títulos para concursos de nível médio correm seriamente o risco de ser impugnados, na medida em que se trata de requisito para a posse não previsto nas leis que criaram ou reestruturaram as carreiras. Não vejo motivo para tal exigência como forma de atender ao princípio da qualidade e eficiência na administração pública e acho que os candidatos que se sentirem prejudicados devem recorrer imediatamente ao Judiciário, tão logo sejam publicados os editais.
Alerto, por fim, os concurseiros em geral – sejam eles de formação superior ou de nível médio – que ainda temos muitos concursos para enfrentar até o fim do ano. Por isso, é fundamental que você continue a se dedicar à preparação para o que vem por aí. De acordo com levantamento publicado recentemente, milhares de vagas serão abertas ainda este ano. Se você quer ser um dos futuros servidores responsáveis por essas atividades públicas, mantenha-se alerta, siga em frente com os estudos e conquiste em breve a satisfação de ocupar o seu feliz cargo novo!
Assine a Revista Congresso em Foco em versão digital ou impressa