Ricardo Ramos
A despeito das críticas de esvaziamento do Congresso durante a convocação extraordinária, a Câmara pode votar uma proposta que pretende fazer justamente o contrário: colocar mais deputados na Casa. Incluído na última hora na pauta de votações, o substitutivo ao projeto do deputado Nicias Ribeiro (PSDB-PA) pretende aumentar a representação de seis estados na Casa e elevar, dos atuais 513, para 521 o número de deputados. Aprovada, a criação de mais oito gabinetes terá um impacto de R$ 10 milhões por ano nos cofres públicos.
Mesmo a nove meses das eleições, o Projeto de Lei Complementar (PLC 180/97) pode, em tese, ter efeito para as eleições deste ano, já que a pauta da convocação se refere ainda ao exercício de 2005. Como a proposta recebeu o apoio de nove líderes partidários – PT, PSDB, PFL, PMDB, PTB, PP, PL, PDT e PV – para tramitar em regime de urgência, em julho passado, ela pode ser um dos primeiros itens a serem votados após a apreciação das medidas provisórias que vão trancar a pauta (leia mais) a partir da próxima segunda-feira (16).
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Deputado queria mais deputados
Na verdade, o projeto original de Nicias Ribeiro previa ainda mais gastos para a Câmara, com a criação de 28 vagas de deputados para 14 estados. O Pará, de Nicias, seria o segundo estado entre aqueles que ganhariam mais deputados (cinco), atrás apenas do Rio do Grande do Sul, que ficaria com mais sete cadeiras. A medida, no caso, teria um impacto de, pelo menos, R$ 36,4 milhões para o contribuinte. Dessa forma, o número de representantes do povo no Congresso chegaria a 541.
Porém, em novembro de 2001, a proposta do tucano foi barrada na Comissão de Constituição e Justiça e amenizada pelo substitutivo do deputado Osmar Serraglio (PMDB-PR). O atual relator da CPI dos Correios reduziu o inchaço inicial para oito cadeiras – 20 a menos do número pretendido pelo paraense. Nesse caso, ganhariam mais um representante na Câmara o Amazonas, a Bahia, o Ceará e Santa Catarina. Os paraenses e os mineiros seriam contemplados com mais duas cadeiras.
“Totalmente desnecessário”
Procurado pelo Congresso em Foco desde quinta-feira, o autor do projeto não pôde conversar com a reportagem porque estava em recesso no interior do Pará, segundo os seus assessores. A assessoria de imprensa do tucano adiantou que o deputado nem sequer sabia que a proposta havia sido incluída na pauta da convocação.
“Não conheço o projeto, mas, em princípio, a mudança é totalmente desnecessária”, avalia a deputada Luciana Genro (RS), líder do PSOL. “Você vai indignar ainda mais a população”, critica Luciana. “É um assunto de relevância menor em meio a uma crise política”, endossa Dimas Ramalho (SP), do PPS. “Como paulista deveria defender o projeto, mas esse não é o melhor momento”, aponta Dimas, um dos poucos líderes a se negar a referendar o apoio ao pedido de regime de urgência para a proposta.
Os líderes do PPS e do PSOL confirmaram que vão orientar suas bancadas a rejeitar o projeto. Os demais líderes partidários não retornaram os contatos feitos pela reportagem.
Operação matemática
Na justificativa da proposta, Nicias Ribeiro argumenta que a mudança corrige “distorções na representação dos Estados na Câmara”. Como exemplo, ele cita o próprio estado, que estaria sub-representado diante de outras unidades da Federação, como Maranhão e Goiás, que, mesmo tendo populações menores que a do Pará, teriam bancadas maiores.
Embora a Constituição jogue a responsabilidade para equilibrar a proporcionalidade das bancadas para a legislação complementar, a Carta Magna estabelece que as unidades da Federação têm de ter entre oito e 70 deputados.
“Assim sendo, como pode ser analisado (…), existem unidades que tiveram as suas representações aumentadas, outras diminuídas (Minas e Rio) e várias se mantiveram inalteradas”, observa o tucano. “Tudo de acordo com o cálculo matemático aplicado, uma vez que a proporcionalidade exigida pela Constituição é essencialmente uma operação matemática.”
Risco de inocuidade
Os ajustes para respeitar a proporcionalidade das bancadas têm de ser feitos “no ano anterior às eleições”. Como a pauta da convocação extraordinária se refere ao ano passado, uma eventual aprovação da medida poderia ter efeito para a disputa de outubro. “Deveria valer, mas, ainda assim, pode-se alegar inconstitucionalidade”, observa o cientista político Octaciano Nogueira, da Universidade de Brasília (UnB). “Seria um casuísmo (aumentar o número de deputados)”, critica o professor aposentado.
A rigor, o número de cadeiras da Câmara poderia ter sido corrigido oito anos atrás. Foi pensando na eleição de 1998 que a proposta foi apresentada. Caso venha a ser aprovado por, pelo menos, 257 deputados, em dois turnos, o texto será encaminhado ao Senado.
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