Antônio Augusto de Queiroz*
O presidencialismo de coalizão, independentemente da orientação político-ideológica do governo, exige do presidente da República equilíbrio de malabarista.
Nesse sistema, quando o governo supera uma disputa interna, imaginando ter pacificado sua base política e administrativa, logo surge outra com potencial desorganizador igual ou superior.
De fato, nada imobiliza mais um governo do que as disputas internas e as crises em sua base de sua sustentação política. Se a disputa se dá entre pessoas com poder e força política, entre membros da administração ou entre ocupantes de postos-chave no Parlamento, por exemplo, a situação se complica ainda mais.
As disputas e crises no governo do presidente Lula foram constantes ao longo desses cinco anos. No Congresso, os primeiros dois anos do primeiro mandato foram de certa tranqüilidade, mas de muita disputa no Poder Executivo, onde se instalaram e se consolidaram dois pólos de poder preocupantes que tutelavam o governo. De um lado estava o ministro-chefe da Casa Civil, José Dirceu, e, de outro, o ministro da Fazenda, Antonio Palocci, em duelo permanente para hegemonizar a orientação de governo.
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O presidente, nesse período, ficou na incômoda situação de arbitrar os conflitos entre esses dois pólos de poder, ora em favor de um, ora em favor de outro, o que lhe trouxe desgaste emocional, pressão e, principalmente, a perda de tempo, que é o bem mais precioso de um presidente da República, especialmente num sistema em que o titular do poder Executivo acumula as relevantes funções de chefe de Governo, chefe de Estado e líder da Nação.
Os três últimos anos, incluindo os dois finais do primeiro mandato e o primeiro do segundo, foram afetados por crises políticas, que se iniciaram com a denúncia envolvendo Waldomiro Diniz, passaram pela derrota na presidência da Câmara e pelo calvário do mensalão, até a crise no Senado que culminou com a renúncia de Renan Calheiros e a derrota da CPMF.
De todos esses problemas, o que mais imobilizou a administração foi a disputa entre os dois superministros no interior do governo. Tanto que, após o fim dela, o presidente da República assumiu as rédeas do poder e passou da condição de coordenado para a de coordenador de seu governo, num salto de qualidade que assegurou a reeleição e a manutenção de elevados índices de popularidade.
No posto de comandante e única fonte de poder do governo, o presidente Lula precisou trocar seus apoiadores e articuladores políticos, numa operação que desagradou a muitos aliados, especialmente aqueles históricos, com compromisso programático com um governo de esquerda. Mas esse foi o preço para estancar a luta por posições políticas no interior do governo.
Passada aquela fase dos superministros, o governo, em geral, e o presidente da República, em particular, puderam dedicar tempo e energia aos projetos prioritários, como o Bolsa Família e o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), as duas principais prioridades das gestões Lula.
Desde o terceiro ano do primeiro mandato que não há outra fonte de poder no governo que não seja o próprio chefe do Poder Executivo. Foi uma nova fase que pode ser classificada, para efeito de análise, como a substituição do petismo pelo lulismo. O presidente, na condição de coordenador do governo, revelou-se extremamente hábil, podendo reivindicar para si o mérito das principais realizações do Poder Executivo.
Esse padrão de mando e comando melhorou a qualidade da administração e deu estabilidade ao governo, apesar das crises, como a do mensalão e a que dominou o Senado em 2007, e das derrotas, como a eleição de Severino Cavalcanti (PP-PE) para a presidência da Câmara e a recente rejeição da CPMF. Lula, além de líder de massa, revelou-se um administrador prudente e realizador.
*Antônio Augusto de Queiroz é jornalista, analista político e diretor de Documentação do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap).