Ao encerrar ontem à noite seu XV Congresso Nacional, em Belo Horizonte, o PPS aprovou o lançamento da candidatura do deputado federal Roberto Freire (PE) a presidente da República “para colaborar na construção de um caminho de mudanças para o país”.
Segundo o texto aprovado, o PPS está aberto a alianças com "forças do centro e da esquerda" com o objetivo de “superar impasses e resgatar a dívida que o atual momento democrático e republicano nos deixa em 2006”. Condenando a gestão petista, que "muitas vezes retrocede" em relação ao programa do PSDB, o partido defende um "projeto fraterno e cooperativo de mudança do país".
Conforme o documento, retomar o crescimento, enfrentar o problema da exclusão social e reduzir as desigualdades são os desafios a serem superados. Para o PPS, os partidos hegemônicos no país, responsáveis pela eleição dos governos civis que se instalaram desde o fim da ditadura militar, demonstraram incapacidade de “desatar os impasses da estagnação econômica e da concentração de renda, de oportunidades e de conhecimento que caracterizam nossa sociedade”.
Leia também
Segue a íntegra da "Declaração Política".
"Abrir um novo ciclo para o país
A crise política que vivemos desde a eclosão das denúncias de corrupção nas relações entre os poderes Executivo e Legislativo, em meados de 2005, constitui um dos sintomas, talvez o mais evidente, do esgotamento de um ciclo da história recente do país. Ciclo que se iniciou em 1985, no momento em que o processo de resistência ao regime autoritário e de avanço das forças democráticas culminou na eleição e posse da chapa de oposição à Presidência da República.
Naquela oportunidade, foi consolidada a aliança política que iria governar o Brasil nos anos seguintes e nela se manifestavam, de maneira muito clara, os desafios políticos econômicos e sociais que essa aliança deveria enfrentar: a consolidação da democracia, a retomada do desenvolvimento e a redução da exclusão e da enorme desigualdade social que o passado nos legara.
Sucederam-se os governos, cada qual sob a hegemonia de cada um dos grupos e líderes que integravam o amplo bloco político que, no final da luta antiditatorial, derrotou o regime militar: o PMDB (Sarney), o PSDB e o PFL (Fernando Henrique) com o interrregno das fugazes presidências de Collor (1990-1992) e Itamar (1993-1994).
Todos eles, sob as mais diversas formas e com as costumeiras dificuldades de projeto e de gestão, procuraram atender às necessidades e demandas da sociedade brasileira, nos planos da democracia, do combate à inflação, e da retomada do processo de desenvolvimento, assim como no enfrentamento dos estruturais problemas ligados à dívida social, como se dizia à época.
O próprio PT, que sempre procurou distanciar-se desse bloco aliancista, e defendia o discurso da mudança, revelou-se apenas o gestor de uma base política e programática em tudo semelhante à de seus antecessores no governo.
Qual o legado desses 20 anos de governo do quadro partidário que emergiu com a redemocratização do país? Em poucas palavras, na coluna dos haveres, restaram o início da reconstrução de uma ordem democrática, corporificada na Constituição de 1988, e a estabilidade econômica. Infelizmente, a retomada do crescimento, assim como a erradicação da exclusão social, em todas suas formas, e a redução das desigualdades permanecem como dívida.
O que se constata é que os principais partidos do pós-1988, na liderança de uma base parlamentar essencialmente a mesma, sujeitos, portanto, ao mesmo tipo de vetos e resistências, vêm-se revelando cada vez mais incapazes de ampliar a participação da sociedade no rumo da democracia e da República, assim como de desatar os impasses da estagnação econômica e da concentração de renda, de oportunidades e de conhecimento que caracterizam nossa sociedade.
Em razão disso é que se pode afirmar que esse ciclo político e econômico está esgotado. As alternativas que essa configuração político-partidária oferece continuam a ser atores importantes, mas os patamares de renovação e avanço possíveis já foram alcançados. O governo do PSDB, apesar do compromisso democrático que demonstrou, não conseguiu ir além de uma pequena parte de seu insuficiente programa reformista e o do PT muitas vezes retrocede em relação a esse mesmo programa.
Por outro lado, a atual crise, exacerbada pelo governo petista que, por fragilidade de sua concepção política, radicalizou e sistematizou, de forma inusitada, práticas fisiológicas e corruptas previamente existentes, evidencia o descolamento crescente entre as condições de existência da chamada ‘política real’ no Brasil e as exigências éticas e cidadãs, sempre maiores, da opinião pública. Essa contradição precisa ser superada no rumo da reforma da política, da ampliação de espaços de participação, do ajuste, enfim, da política à expectativa que dela tem a cidadania, e não no rumo inverso do apoliticismo, da celebração dos supostos feitos do governo e de acusações de ‘moralismo’ sobre a imprensa e a opinião pública, como se fosse possível hoje ajustar essa opinião pública às práticas por ela condenadas.
É imperativo mudar. Impõem-se a elaboração e a construção de uma Agenda de Governo para a Democracia, a Eqüidade, o Desenvolvimento e a defesa e fortalecimento da República. Até porque, nas próximas eleições, o cidadão brasileiro não pode, e tudo indica que não deseja, ficar restrito às alternativas da continuidade.
A implementação dessa agenda é uma tarefa difícil e complexa, que se encontra muito além das capacidades isoladas de qualquer partido, movimento ou corrente de opinião. O avanço no rumo desses objetivos exige a construção de uma ampla frente que reúna todas as forças comprometidas com a democracia e com a República.
Para colaborar na construção de um caminho de mudanças para o país, na campanha, no debate, no diálogo, com os cidadãos e cidadãs, o PPS apresenta a candidatura de Roberto Freire à Presidência da República. Candidatura aberta à discussão e composição com todos os partidos, lideranças e personalidades interessados em chegar a acordos mínimos que permitam superar os impasses e resgatar a dívida que o atual momento democrático e republicano nos deixa em 2006.
Acreditamos que a candidatura por nós oferecida aos brasileiros pode se constituir em um marco desse debate, dando início também a um processo de conversações sobre a redefinição do campo político nacional, com a constituição de um bloco capaz de reunir as forças do centro e da esquerda democráticos, processo que ultrapassará, sem dúvida alguma, o horizonte das eleições de deste ano. Pelas razões antes expostas e em face da imposição da cláusula de barreira a ser enfrentada no pleito de outubro próximo, o reordenamento partidário se apresentará como um fato intransferível para o próprio sistema político brasileiro.
Formulamos a generosa idéia da constituição de uma nova formação política, durante o nosso IX Congresso Nacional, ainda como PCB, em 1991. Sentimos que, nunca como antes, as condições estão maduras para o desafio da construção de um pólo, plural, rico e multifacetado, alternativo ao quadro partidário existente. Pólo aberto a todos aqueles que, sem pré-condições e sem preocupações hegemonistas, estejam interessados num projeto fraterno e cooperativo de mudança do país. Esgotado o velho ciclo, precisamos iniciar o novo, na perspectiva da ampliação da democracia, da efetivação da República, com a retirada do Estado das mãos de interesse privados e com a conquista simultânea da eqüidade e do desenvolvimento."