Marcio Massao Shimomoto*
O governo brasileiro promoveu uma reforma trabalhista para tentar corrigir deformações históricas, sacudir a poeira da CLT, remover remendos jurídicos e assim iniciar uma nova era nas relações capital/trabalho no país. O setor produtivo ainda comemora a aprovação da Lei 13.467/2017, por entender que ao longo dos anos a CLT engessou o desenvolvimento dessas relações, com uma série de amarras para empresas e trabalhadores.
O problema é que a reforma ainda não tem contornos definidos, é obra inacabada, tanto que o governo estuda os termos de uma Medida Provisória para corrigir suas imperfeições. E é bom que o faça mesmo, pois algumas matérias complexas não foram analisadas com a devida profundidade e podem afetar o mercado de trabalho.
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Na área sindical, por exemplo: em vez de propor uma reforma digna desse nome, a reforma trabalhista simplesmente tornou facultativa a contribuição sindical, o que equivale a eliminá-la, com o discurso de restringir a proliferação de sindicatos no Brasil – em torno de 17 mil atualmente, número realmente absurdo. Desses, cerca de sete mil não recebem a contribuição.
Mas a questão exige uma leitura mais atenta. Ao tirar uma das principais fontes de sobrevivência dos sindicatos, o governo não se deu conta de que uma enorme parcela dos trabalhadores ficará sem assistência, o que é injusto. Importante observar que boa parte dessas entidades, ainda que fracas, tem amparo constitucional.
É preciso separar o joio do trigo. Temos sindicatos eficientes e que representam sua base tanto do lado patronal quanto do lado laboral. Muitos dão sua contribuição efetiva ao país, mantendo a estabilidade nas relações de trabalho, em que todos os trabalhadores estão representados. Não existe ninguém sem reajuste de salário neste país e que não tenha direitos sociais ampliados e garantidos que não seja por meio dos sindicatos.
Do lado dos patronais, obrigatório reconhecer: os sindicatos compraram a briga pelo fim da CPMF, estão colaborando na formatação de todo o sistema do eSocial e do Empreenda Fácil em São Paulo e lutaram pelo Simples Nacional. Esse é um trabalho de representatividade.
Todo sindicato deve ter uma estrutura para negociações coletivas de trabalho, composta por negociadores e economistas para acompanhamento dos índices econômicos, previsões a curto e médio prazos, conhecimentos das peculiaridades do segmento e das diversas regiões representadas. São muitos dados importantes avaliados em cada negociação para manter o equilíbrio econômico tanto dos trabalhadores como das empresas, ajudar na empregabilidade e no giro da economia local.
Resta saber como ficaria a base representada por aqueles sindicatos sem condições de negociar, a começar pelo reajuste dos funcionários de seus representados. Cada empresa teria de negociar? Pela legislação permaneceriam as cláusulas sociais; mas, e as econômicas? Quem negociará? Isso impacta na Economia do país na segurança das empresas e dos trabalhadores. As grandes empresas até poderiam contratar uma banca de advogados e negociar diretamente com os empregados. E nas pequenas empresas, que são a maioria, como seria a negociação? Empresas da mesma categoria teriam parâmetros diferentes?
A multiplicação de sindicatos se deve à CLT, ao dispor sobre a especificidade em seus artigos 570 e seguintes. Este termo abriu espaço para tantos sindicatos. Categorias fortes e majoritárias acabaram sendo fragmentadas para dar lugar a sindicatos pouco representativos.
Para quê existe um sindicato que não recebe contribuição sindical, ou que recebe e não faz negociações coletivas? O correto seria acabar com eles.
Outro fator importante: os autores da reforma não perceberam que o índice de inadimplência no setor é alto, mesmo com contribuição obrigatória. Quando se tornar facultativa, haverá quebra na arrecadação em todas as categorias.
Nosso sistema sindical está doente – e quando se tem um doente, não se pode matá-lo, e sim curá-lo. O problema é esse processo baseado numa legislação que impõe unicidade e, em linha contrária, determina especificidade sindical. Pedimos um mínimo de respeito aos sindicatos que trabalham, aos sindicatos representativos.
A proposta é acabar com a especificidade, controlar melhor e dar transparência aos valores arrecadados e ainda submeter a contabilidade a uma auditoria externa. Isto acabaria com a má utilização de verbas tão comentada pela população.
Temos de encontrar uma forma inteligente de eliminar sindicatos não representativos sem prejudicar os eficientes.
Urge ainda adequar o novo texto legal à garantia constitucional da participação dos sindicatos em todos os ambientes de negociações coletivas, ou seja, os sindicatos patronais e laborais das categorias representadas. Diz o inc. VI do artigo 8º da Constituição: “é obrigatória a participação dos sindicatos nas negociações coletivas de trabalho”.
Pela atual legislação, no acordo coletivo realizado entre a empresa e trabalhadores, é necessária a participação do sindicato laboral; a convenção coletiva, que se estende a todo o segmento, é realizada entre sindicatos laboral e patronal. Com a prevalência do acordado sobre o legislado, a consequência será uma enorme distorção dentro de uma mesma categoria profissional.
É indispensável regulamentar a participação dos sindicatos patronais nos acordos coletivos como forma de se alcançar estabilidade e segurança no cumprimento das cláusulas acordadas.
O ideal para reduzir os conflitos e buscar a justiça social – interesse maior da reforma trabalhista – seria uma importante alteração do artigo 620, com a inclusão de um parágrafo único: “o sindicato representativo da categoria econômica deverá participar como assistente da celebração do acordo coletivo de trabalho”.
É o que esperamos das correções que o governo pretende promover, em nome do equilíbrio e da justiça.
* Marcio Massao Shimomoto é presidente do SESCON-SP, Sindicato das Empresas de Serviços Contábeis e das Empresas de Assessoramento no Estado de São Paulo.